SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A agência de classificação de risco Fitch elevou a nota de crédito soberano do Brasil a BB, contra BB- antes, com perspectiva estável.

Segundo a Fitch, a decisão reflete um desempenho macroeconômico e fiscal melhor que o esperado e a agenda de reformas, com o avanço da Reforma Tributária e do arcabouço fiscal no Congresso no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, e a reforma da Previdência e a independência do BC (Banco Central) nos anos anteriores.

"O Brasil alcançou progresso em importantes reformas para enfrentar os desafios econômicos e fiscais", diz a agência em relatório.

Ela destaca ainda que, embora o governo Lula defenda uma mudança na agenda econômica liberal dos governos anteriores, avalia que o presidente adotará uma abordagem pragmática em vez de intervencionista, com uma agenda que inclui iniciativas para impulsionar o investimento privado.

A agência assinala que vê como improvável grandes reversões de reformas liberais dos últimos anos, como a trabalhista e a privatização da Eletrobras, até por causa dos freios impostos pelo Congresso.

A Fitch afirma que a Petrobras e o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) estão adotando mudanças moderadas em suas estratégias corporativas, que provavelmente não reacenderão as distorções que prejudicaram o desempenho econômico no passado.

A Fitch diz também que o presidente Lula "tem conseguido garantir a governabilidade e avançar em sua agenda política".

"As tensões políticas persistem, mas não culminaram em resultados econômicos ou políticos adversos e refletem o funcionamento eficaz dos freios e contrapesos".

Ex-presidente do Goldman Sachs no Brasil e atualmente sócio sênior da Seneca Evercore, Daniel Wainstein analisa que a mudança de nota mostra que o governo Lula está conseguindo "aproveitar a 'lua de mel' que governos possuem em início de mandato com o Congresso para conseguir aprovar medidas importantes".

A Fitch tinha rebaixado a nota de crédito do Brasil para BB- em 2018, no governo Temer, quando o país passava por déficit fiscal, crise nas contas públicas e fracasso em aprovar a reforma da Previdência.

Na decisão desta quarta, a agência citou medidas como o avanço do novo arcabouço fiscal e da Reforma Tributária no Congresso como um desdobramento positivo para a nota de crédito do Brasil.

A Reforma Tributária, avalia a agência, aborda um dos maiores gargalos do Brasil relativo à competitividade da economia. "[A Reforma Tributária] visa simplificar o sistema altamente complexo e eliminar as distorções que alimentam a má alocação de capital."

O Ministério da Fazenda disse que a decisão da agência corrobora os esforços empreendidos pelo governo para fortalecer o ambiente econômico e promover a consolidação fiscal.

A pasta reiterou o compromisso com a agenda de reformas em curso para levar ainda à redução das taxas de juros e à melhoria das condições de crédito e assegurar a estabilidade dos preços.

A decisão da Fitch vem na esteira de um "esforço grande do governo, capitaneado pelo Ministério da Fazenda, de ampliar as receitas e reduzir o déficit fiscal", diz Luiz Fernando Figueiredo, presidente do conselho de administração da gestora Jive Investments e ex-diretor do BC.

"É todo um ambiente que está melhorando por conta de várias coisas", diz Figueiredo, que cita, além da Reforma Tributária e do arcabouço fiscal, as projeções mais otimistas dos investidores para o desempenho da atividade econômica e da inflação.

O receio que havia entre os agentes financeiros de uma reversão da política de reformas dos governos anteriores diminuiu ao longo do primeiro semestre, acrescenta o executivo.

A elevação do rating do Brasil pela Fitch vem pouco mais de um mês depois que outra agência de classificação de risco, a S&P, mudou a perspectiva para a nota de crédito do Brasil, atualmente BB-, de estável para positiva, também citando sinais de maior certeza sobre a estabilidade da política fiscal.

Já a Moody´s tem nota Ba2 com perspectiva estável para o Brasil. Todas as notas, no entanto, seguem abaixo do chamado grau de investimento, que indica baixo risco de calote.

Para o economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala, essas melhoras nas notas de crédito do Brasil já eram de certa forma esperadas. "Isso já estava no radar. Os preços de mercado já mostravam isso, com a Bolsa na máxima do ano, a 122 mil pontos, o dólar na mínima do ano, a R$ 4,74, e as taxas de juros futuros longos também na mínima", diz.

Segundo Gala, as agências de classificação de risco costumam ficar "atrás da curva", apenas sancionando o que já está explícito nos preços de mercado, ou seja, a forma como os investidores estão enxergando a política econômica e a organização das contas públicas dos países.

Além do ambiente doméstico, Gala chama atenção para a influência do mercado externo no Brasil. "O cenário internacional deu uma bela aliviada, com as bolsas americanas na máxima, o dólar perdendo valor lá fora também. Então, é um contexto bem mais propício para os países emergentes", explica.

Com a elevação desta quarta pela Fitch, o Brasil está a dois degraus para alcançar novamente o selo de grau de investimento, que perdeu em 2015.

Portanto, para o investidor internacional, a nova nota ainda significa que o Brasil tem um grau especulativo de investimento. "Mas sintetiza um pouco da melhora que a gente tem em relação ao compromisso do Brasil com relação às suas contas", comenta Pedro Wilson Domingues, sócio da Nexgen Capital.

Na visão de analistas do Goldman Sachs, para retomar o grau de investimento, o Brasil precisaria passar por mais reformas estruturantes, além de adotar políticas macro e microeconômicas, além de mudanças regulatórias que apoiem os investimentos, "fomentem o crescimento da produtividade" e estabilizem a dinâmica da dívida pública.

A Fitch afirmou que a posição fiscal do país está se deteriorando, mas espera que as novas regras fiscais e as medidas tributárias ancorem uma consolidação gradual. A agência ainda projeta uma alta da relação entre dívida e PIB, porém, a um ritmo mais lento e partindo de um ponto inicial muito melhor do que estimado anteriormente.

A agência também elevou a perspectiva para o crescimento econômico do Brasil neste ano para 2,3%, forte melhora ante a expansão de 0,7% prevista antes.

A avaliação é a de que o consumo esfriou com a política monetária apertada, mas continua sustentado por um mercado de trabalho forte, gastos fiscais e crescimento contínuo do crédito.

Para 2024, espera uma desaceleração para 1,3%, com uma normalização da produção agrícola.

Segundo o economista André Perfeito, a melhora da nota pela Fitch, a desaceleração da inflação e os avanços da Reforma Tributária e do arcabouço fiscal abrem espaço para que o BC (Banco Central) inicie o ciclo de redução dos juros com uma queda de 0,50 ponto percentual no próximo dia 2 de agosto.

A expectativa do mercado até alguns dias atrás era de uma redução de 0,25 ponto percentual na semana que vem, mas os dados de inflação do IPCA-15 divulgados nesta terça contribuíram para que aumentassem as apostas por um corte mais agressivo dos juros.

No mercado de juros futuros, que embute a expectativa dos agentes financeiros para os rumos da política monetária, o dia abriu em queda das taxas. Perto das 13h10, contudo, o movimento era misto, com a maior parte dos contratos em alta, e apenas os de vencimento mais curto em baixa.

O título com vencimento em janeiro de 2024 recuava 12,61%, enquanto o papel para 2025 cedia de 10,63%.

O dólar também opera em baixa, com recuo de 0,25% por volta das 13h10, a R$ 4,743.

Já a Bolsa de Valores operava em leve queda de 0,37%, aos 121.554 pontos, em uma sessão de maior aversão a risco global, com os investidores atentos à provável nova elevação dos juros pelo Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA) esperada para esta quarta. As sinalização da autoridade monetária sobre os próximos passos dos juros americanos também estarão no radar do mercado.

ENTENDA O QUE SÃO AS CLASSIFICAÇÕES DE RISCO E O QUE É GRAU DE INVESTIMENTO

Grau de investimento é uma condição atribuída por agências internacionais de classificação de risco a papéis, empresas ou países para definir que se trata de um investimento seguro ?ou seja, com baixo risco de calote.

As três agências risco de maior visibilidade no mundo são a Standard & Poor's, a Moody's e a Fitch Ratings.

As notas de crédito têm impacto sobre o custo da dívida de empresas e países. Quanto melhor a classificação, menor tende a ser o desembolso com os juros dos financiamentos, e vice-versa.

Para investidores estrangeiros, a avaliação das agências serve como termômetro para saber se a remuneração de um papel está adequada ao risco do investimento.

As notas de crédito também são importantes para os fundos: muitos deles são impedidos de aplicar em papéis sem grau de investimento. Se um emissor de dívida (país ou empresa) é rebaixado, esses fundos são obrigados a tirar os títulos com grau especulativo da carteira.

As empresas de avaliação de risco são contratadas para fazer essa análise, que é uma opinião.

Apesar disso, argumentam que, mesmo sendo atribuída mediante encomenda de agentes financeiros, a nota de risco é uma avaliação independente e confiável porque há preocupação com a credibilidade da própria agência.

Vale destacar, porém, que, na quebra do mercado imobiliário americano que esteve no epicentro da crise global desencadeada em 2008, papéis do setor que se mostraram "ativos podres" tinham nota máxima das agências de classificação de risco com grau de investimento.


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