SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse estar preocupado com os esforços do governo federal para aumentar receita. Segundo ele, a experiência de alguns países vizinhos mostra que o efeito disso pode trazer problemas duradouros.

"Existe uma preocupação porque, em alguns lugares, a corrida por arrecadação acabou gerando inflação de base. A gente tem um exemplo aqui do lado que é o da Argentina", disse a uma plateia de investidores institucionais presentes na Warren Internacional Day, realizado em São Paulo.

Segundo Campos Neto, a incredulidade do mercado em relação às metas fiscais fixadas pelo governo para os próximos anos, entre elas a de zerar o déficit já em 2024, ocorre devido à grande necessidade de receitas adicionais para que as metas sejam cumpridas.

O presidente do BC ponderou que é inevitável que haja aumento de impostos para que as metas fiscais prometidas pela equipe econômica do governo sejam alcançadas, mas questionou a sustentabilidade disso para a economia, uma vez que o Brasil já tem uma carga tributária muito elevada.

Sem fazer críticas diretas à estratégia do Ministério da Fazenda de controlar as contas públicas pelo lado da receita, sem realizar cortes de despesas, Campos Neto chamou atenção para o fato de o Brasil ter crescimento de gastos em termos reais acima da média global.

"Em parte, esse é um problema estrutural, que não é deste governo, não é do governo anterior", afirmou.

Presente no evento, o economista-chefe da Warren Rena, Felipe Salto, considerou que a preocupação de Campos Neto com relação ao cenário fiscal no Brasil ficou patente durante seu discurso.

"Claro que ele é sempre muito cuidadoso com o uso da fala, mas, mais do que o desenho do arcabouço fiscal, que é essa nova regra aprovada pelo Congresso, e proposta pelo governo, agora a preocupação vai ser quanto à execução, se o governo vai conseguir cumprir a meta de resultado primário", disse.

É DIFÍCIL AUMENTAR O NÍVEL DE REDUÇÃO DA SELIC

Campos Neto também comentou a última decisão de juros do Copom (Comitê de Política Monetária). No início deste mês, o Banco Central decidiu iniciar o ciclo de redução da taxa básica Selic. Mas a diretoria ficou dividida quanto ao patamar de corte, cabendo ao presidente do BC o voto de minerva.

Segundo Campos Neto, esse impasse estava dentro do esperado, dada a configuração de reuniões passadas do Copom. Ele negou que as recentes indicações do governo para a diretoria do BC possam colocar em dúvida a política monetária no Brasil.

Com relação aos próximos passos do comitê, Campos Neto afirmou que é muito difícil um aumento no nível de redução da taxa Selic. O primeiro corte na reunião deste mês foi de 0,5 ponto percentual, o que levou os juros básicos a 13,25% ao ano.

"A barra para fazer algo diferente [em relação ao ritmo de corte] é muito alta", declarou.

Sobre os últimos movimentos da Bolsa de Valores no Brasil, Campos Neto disse que o repique na curva de juros futuros, com as taxas subindo, é em parte um cenário sincronizado com o restante do mundo.

INFLAÇÃO DE TRANSPORTES E ALIMENTOS SURPREENDEU

O presidente do BC analisou, ainda, os últimos dados do IPCA-15 (Índice de Preços ao Consumidor Amplo-15).

Segundo Campos Neto, os núcleos da inflação de serviços -que excluem itens mais voláteis da conta e indicam a tendência dos preços- não vieram ruins. Essa é uma medida que tem sido acompanhada de perto pelo Banco Central.

A inflação de transportes e alimentos, por outro lado, surpreendeu negativamente, de acordo com o presidente do BC, o que explica o índice ter vindo acima do esperado pelo mercado.

O IPCA-15 registrou alta de 0,28% em agosto, ante uma expectativa de avanço de 0,17%, de acordo com a média das projeções levantadas pela Reuters.

Segundo Campos Neto, o movimento inflacionário no Brasil, com uma volta de alta leve nos preços, está dentro do esperado. Ele ressaltou que o mercado está esperando um desvio em relação à meta da inflação neste ano, com uma convergência em 2024 e 2025,


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