BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A aprovação da Reforma Tributária no Senado se deu em meio a um clima tenso, que levou até o ministro Fernando Haddad (Fazenda) a fazer uma ligação de 17 minutos para a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) enquanto corria a votação.
Em determinado momento da sessão desta quarta-feira (8), segundo relatos, o governo contava com exatos 49 votos a favor, o número mínimo para aprovação de uma PEC (proposta de emenda à Constituição).
O clima ruim que se desenhava por volta das 17h levou o ministro da Fazenda a cancelar um compromisso que estava marcado para as 19h, e a pedir para que o próprio presidente Lula (PT) se envolvesse na negociação.
Como revelou a Folha de S.Paulo, outra ajuda veio de Geraldo Alckmin (PSB). O vice-presidente se mobilizou não só para evitar a derrubada de incentivos fiscais a montadoras, mas também para garantir o voto de Flávio Arns (PSB-PR), seu colega de partido.
O placar apertado de 53 a 24 que garantiu a aprovação da Reforma só foi possível porque a base trabalhou para virar votos até os últimos minutos, e conseguiu angariar o apoio de senadores da oposição que não estavam inicialmente na conta.
A apreensão de governistas era visível no plenário. Assim que o líder do Podemos, Oriovisto Guimarães (PR), anunciou que Thronicke votaria contra, o relator, Eduardo Braga (MDB-AM), e o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), correram para tentar consertar a situação -sem sucesso.
Pessoas próximas a Thronicke afirmam que ela não conseguiu conversar a sós com Braga em nenhum momento. A senadora também viu descaso do relator e do governo com uma proposta apresentada por ela em julho para beneficiar o setor de serviços.
Já o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), segurou a votação até que Márcio Bittar (União-AC) fosse localizado. Pacheco comentou com pessoas próximas que a aprovação da reforma foi um dos momentos mais tensos desde que chegou à presidência.
Nos bastidores, o medo de derrota também tomou conta do Ministério da Fazenda, e Haddad passou a cuidar pessoalmente da articulação, de acordo com assessores e parlamentares que acompanharam as negociações de perto.
A tensão foi escalando durante a tarde, quando o governo constatou que não poderia contar com votos dados inicialmente como certos, como o dos senadores Cid Gomes (PDT-CE) e Irajá (PSD-TO), que faltaram à sessão.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, Cid trocou a votação da Reforma Tributária pela reunião do diretório local do PDT, segundo sua assessoria. Já Irajá se declarou contra o texto nesta quinta (9), e usou as redes sociais para fazer duras críticas ao parecer de Braga.
Outro alerta veio do senador Esperidião Amin (PP-SC), que havia votado a favor da proposta na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) na véspera -o que ajudou a garantir o placar folgado de 20 a 6 na ocasião.
Amin disse à Folha de S.Paulo que votou sim na CCJ pela admissimilidade do texto, e não pelo mérito. O senador defendia que a PEC limitasse a alíquota do IVA (Imposto sobre Valor Agregado), modelo que vai substituir atuais impostos sobre o consumo.
Além de divergências sobre o texto, senadores afirmam sob reserva que o governo se omitiu na articulação política durante a tramitação da proposta, e deixou o trabalho com o Ministério da Fazenda, mesmo com sinais de insatisfação do Senado há meses.
A avaliação é que o envolvimento de Jair Bolsonaro (PL), que visitou o Congresso justamente no dia da votação, também pesou para assegurar os votos da oposição. Com medo de que a Reforma possa beneficiar Lula, o ex-presidente procurou senadores e se reuniu na véspera da votação com a bancada do PL.
O governo também contava que o senador Ciro Nogueira (PI), presidente nacional do PP, conseguisse trazer ao menos quatro votos do partido. No final, foram apenas dois -o dele e o do pernambucano Laércio Oliveira.
Ciro chegou a falar que a bancada deveria ser coerente porque o relator da PEC na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PB), é membro da sigla, e um dos principais fiadores da aprovação é o presidente da Casa vizinha, Arthur Lira (PP-AL).
Outro senador que mudou de voto entre a CCJ e o plenário foi o líder do Republicanos, Mecias de Jesus (RR). Aliado do Palácio do Planalto, o senador Omar Aziz (PSD-AM) não escondeu sua indignação com a postura do colega.
"O meu amigo Mecias declarou que vai votar contra, mas houve, senador Eduardo Braga, 20 emendas aceitas pelo senhor, 20. Se você [Mecias] não acredita na Reforma Tributária, você não pode nem perder tempo fazendo emenda; agora, você diz que acatam 20 emendas e ainda vai votar contra?", questionou.
O clima conflagrado também se traduziu em mudanças feitas de última hora no parecer de Braga. Até um fundo novo foi criado para ressarcir eventuais perdas de competitividade de zonas de livre comércio em outros estados da região Norte além do Amazonas.
Parlamentares afirmam que dois fatores entraram na conta: o interesse pessoal de Davi Alcolumbre (União-AP), dada a vantagem ao Amapá, e o receio de que senadores que votaram a favor do texto no primeiro turno voltassem atrás no segundo.
Enquanto o acordo era costurado, Alcolumbre chegou a perguntar para Mecias e Dr. Hiran (PP-RR) se a criação do fundo os faria votar a favor do parecer de Braga no segundo turno, o que não aconteceu.
O temor de que o parecer de Braga não fosse aprovado também acabou em um acordo velado para que o relator do Marco Temporal, Marcos Rogério (PL-RO), não participasse da votação.
Amigo de Alcolumbre, o senador informou que não votaria a favor da Reforma Tributária em nenhuma hipótese, nem mesmo com o compromisso do Palácio do Planalto de derrubar os vetos ao Marco Temporal na quinta.
Senadores próximos aos dois afirmam que houve a preocupação de que a posição intransigente de Marcos Rogério contaminasse os demais. Como muito ajuda quem não atrapalha, o senador faltou à sessão da CCJ e à sessão plenária.
Veja como votou cada senador, no primeiro e no segundo turnos:
SIM: 53
Alan Rick (União-AC)
Márcio Bittar (União-AC)
Sérgio Petecão (União-AC)
Fernando Farias (MDB-AL)
Renan Calheiros (MDB-AL)
Rodrigo Cunha (MDB-AL)
Davi Alcolumbre (União-AP)
Lucas Barreto (PSD-AP)
Randolfe Rodrigues (Rede-AP)
Eduardo Braga (MDB-AM)
Omar Aziz (PSD-AM)
Plínio Valério (PSDB-AM)
Angelo Coronel (PSD-BA)
Jaques Wagner (PT-BA)
Otto Alencar (PSD-BA)
Augusta Brito (PT-CE)
Leila Barros (PDT-DF)
Fabiano Contarato (PT-ES)
Jorge Kajuru (PSB-GO)
Vanderlan Cardoso (PSD-GO)
Ana Paula Lobato (PSB-MA)
Eliziane Gama (PSD-MA)
Weverton (PDT-MA)
Jayme Campos (União-MT)
Margareth Buzetti (PSD-MT)
Nelsinho Trad (PSD-MS)
Carlos Viana (Podemos-MG)
Flávio Arns (PSB-PR)
Daniella Ribeiro (PSD-PB)
Efraim Filho (União-PB)
Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB)
Beto Faro (PT-PA)
Jader Barbalho (MDB-PA)
Zequinha Marinho (PL-PA)
Fernando Dueire (MDB-PE)
Humberto Costa (PT-PE)
Teresa Leitão (PT-PE)
Ciro Nogueira (PP-PI)
Jussara Lima (PSD-PI)
Marcelo Castro (MDB-PI)
Styvenson Valentim (Podemos-RN)
Zenaide Maia (PSD-RN)
Paulo Paim (PT-RS)
Confúcio Moura (MDB-RO)
Chico Rodrigues (PSB-RR)
Ivete da Silveira (MDB-SC)
Alessandro Vieira (MDB-SE)
Laércio Oliveira (PP-SE)
Rogério Carvalho (PT-SE)
Giordano (MDB-SP)
Mara Gabrilli (PSD-SP)
Eduardo Gomes (PL-TO)
Professora Dorinha Seabra (União-TO)
NÃO: 24
Eduardo Girão (Novo-CE)
Damares Alves (Republicanos-DF)
Izalci Lucas (PSDB-DF)
Magno Malta (PL-ES)
Marcos do Val (Podemos-ES)
Wilder Morais (PL-GO)
Wellington Fagundes (PL-MT)
Soraya Thronicke (Podemos-MS)
Tereza Cristina (PP-MS)
Cleitinho (Republicanos-MG)
Oriovisto Guimarães (Podemos-PR)
Sergio Moro (União-PR)
Carlos Portinho (PL-RJ)
Flávio Bolsonaro (PL-RJ)
Romário (PL-RJ)
Rogério Marinho (PL-RN)
Hamilton Mourão (Republicanos-RS)
Luis Carlos Heinze (PP-RS)
Jaime Bagattoli (PL-RO)
Dr. Hiran (PP-RR)
Mecias de Jesus (Republicanos-RR)
Esperidião Amin (PP-SC)
Jorge Seif (PL-SC)
Astronauta Marcos Pontes (PL-SP)
NÃO VOTARAM: 3
Cid Gomes (PDT-CE)
Marcos Rogério (PL-RO)
Irajá (PSD-TO)
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