TAIPÉ, TAIWAN (FOLHAPRESS) - Não fosse a China, as exportações brasileiras neste ano estariam caindo 3%, segundo cálculo do Ministério da Indústria e Comércio (Mdic).

De janeiro a novembro, em relação ao mesmo período do ano passado, as vendas para o país cresceram 14,7%. Para o resto do mundo, diminuíram 4,1%, resultado em linha com a projeção da Unctad (Agência da ONU para o Comércio e o Desenvolvimento) para este ano, de uma queda de 5% no comércio mundial.

A expectativa é que o Brasil feche 2023 com exportações para a China acima de US$ 100 bilhões, número jamais alcançado com qualquer parceiro comercial.

De janeiro a novembro, foram US$ 95,3 bilhões. "A média mensal nos últimos meses está na casa dos US$ 9 bilhões, e os dados preliminares apontam dezembro nessa direção", diz Tatiana Prazeres, secretária de Comércio Exterior do Mdic. "Ou seja, é seguro afirmar que alcançará US$ 100 bilhões."

É possível creditar o resultado, em parte, à visita de Lula, nove ministros e 240 empresários à China, em março e abril? Prazeres não responde diretamente, mas comenta ter atravessado o ano ouvindo perguntas sobre desaceleração chinesa, sobre como afetaria o Brasil.

"O mundo todo acompanhou com muita atenção, mas as nossas exportações se mostraram muito resilientes e contribuíram para um desempenho histórico, inclusive para o nosso superávit recorde", diz, lembrando o caso do minério de ferro, que chegou ao final do ano com crescimento das vendas, apesar da crise imobiliária chinesa.

Larissa Wachholz, que foi assessora especial do Ministério da Agricultura de 2019 a 2021, onde estabeleceu o Núcleo China, avalia que "a visita foi muito importante como marco de reaproximação sobretudo política, uma declaração que para os chineses importa".

Acrescenta que o fato de a visita ter "combinado com a reabertura da China para o mundo foi elemento importante, que fez com que estivesse ali uma delegação enorme, apoiando essa reaproximação e buscando estar lá depois de um período em que todos foram obrigados a se ausentar" devido à pandemia.

Para Karin Costa Vazquez, que acaba de trocar Xangai por Brasília, para chefiar a agenda de reforma dos bancos multilaterais no Ministério da Fazenda, Brasil e China estão num "momento de rearticulação" neste ano, marcado não só pela presença de Lula e empresários, mas por "um recorde de governadores, membros do Legislativo".

Ao longo de 2023, estiveram na China os governadores de Bahia, Minas Gerais, Pará, Goiás e Mato Grosso do Sul, entre outros, e os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, entre outros parlamentares.

Foi um ano também, diz Vazquez, de implementação do que Lula e Xi acertaram, como o pagamento em moedas locais, "que já teve as primeiras transações". Vazquez sublinha que os cinco líderes do Brics, neste ano, "designaram aos ministros de economia estudar como operacionalizar esse sistema", para definição na cúpula de 2024, na Rússia.

Para o presidente do Conselho Empresarial Brasil-China, Luiz Augusto de Castro Neves, "a retomada do diálogo entre os presidentes certamente contribuiu para dar um ímpeto adicional às relações, mas é preciso levar em conta que o comércio sino-brasileiro vem batendo recordes sucessivos há anos".

"Além disso, o desempenho de 2023 reflete em parte decisões tomadas no fim de 2022, em particular a liberação das vendas de milho", acrescenta.

Tanto Prazeres como Wachholz observam o movimento crescente na direção contrária, das inversões chinesas em energias renováveis e eletromobilidade.

"Já houve investimentos anunciados neste ano, como a BYD", diz a secretária, adiantando que a produção da nova fábrica na Bahia começa em 2025. Junto com a montadora de carros elétricos, vêm fábricas de sua cadeia de suprimentos.

"A questão ambiental está presente em todas as reuniões, em todas as conversas" com a China, diz Wachholz, hoje sócia da Vallya Participações. "Isso se manifesta de forma concreta nos investimentos chineses no Brasil na área de energia, sobretudo, que receberam novos compromissos ao longo do ano."

Lembra que o marco do primeiro empréstimo comercial em moeda chinesa para o Brasil, dois meses atrás, foi para o grupo chinês SPIC, com operações de energia hidrelética, eólica e outras no país, que recebeu R$ 886 milhões.

Segundo Castro Neves, "há uma clara tendência de ampliação de investimentos chineses em áreas ligadas à transição energética, descarbonização e tecnologia". Isso mostra, acredita ele, como a China "pode, sim, contribuir para o processo de neoindustrialização do país".

Escrevendo neste fim de ano no Renmin Ribao (Diário do Povo), o principal jornal do Partido Comunista e do país, a pesquisadora chinesa He Luyang também ressaltou os passos dados em 2023 para a cooperação de Brasil e China em economia de baixo carbono, proteção ambiental e mudança climática.

Integrante do Centro de Estudos Brasileiros do Instituto Latino-Americano, na Academia Chinesa de Ciências Sociais, em Pequim, ela avalia que "foi um ano importante na história das relações" bilaterais, que ganharam "um novo plano de desenvolvimento" com o diálogo estratégico de Lula e Xi, em abril.

Para 2024, com o marco em agosto dos 50 anos do estabelecimento das relações diplomáticas, He antecipa a integração da Iniciativa Cinturão e Rota, da China, "com os planos de reindustrialização e a nova versão do Plano de Aceleração do Crescimento do Brasil".

Um dos movimentos identificados nessa direção, que se seguiu à presença da comitiva de Lula e outras posteriores, foi a ampliação na demanda de vistos para o Brasil, por executivos e funcionários de empresas chinesas, tanto para trabalho como para visitas prospectivas.

Está prevista para meados do ano a abertura de mais um consulado brasileiro, o primeiro no interior da China, para acompanhar a distribuição crescente do crescimento econômico chinês. Será em Chengdu, na província de Sichuan, somando-se à embaixada em Pequim e aos consulados em Xangai e Guangzhou (Cantão).


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