SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), que vem acompanhando o debate público sobre as fraudes cometidas contra planos de saúde no Brasil, diz que o assunto tem sido tratado pelo setor com desrespeito aos clientes.

O tema das fraudes começou a ganhar notoriedade há pouco mais de um ano, quando as entidades representativas do setor iniciaram um movimento para investigar o crescimento dos casos e denunciar a situação.

Entre os esforços adotados para combater o problema, a FenaSaúde (federação que representa companhias) montou uma gerência para aumentar a fiscalização sobre os dribles mais comuns na utilização dos planos e apresentou notícia-crime ao Ministério Público de São Paulo sobre empresas de fachada criadas para solicitar cifras milionárias em reembolsos fraudulentos.

Operadoras também iniciaram investigações internas, e grandes companhias de diferentes setores fizeram demissões em massa de funcionários acusados de aplicar golpes nos planos corporativos oferecidos como benefício.

Entre os exemplos de golpes revelados, os planos de saúde listam o fracionamento de recibo (quando um médico emite dois ou mais recibos, para extrair dinheiro via reembolso, embora tenha prestado um único atendimento) e a falsificação do estado clínico do paciente no recibo emitido por médicos com o objetivo de forçar o reembolso de serviços não cobertos (prática que costuma envolver clínicas de procedimentos estéticos).

O fornecimento de senhas de aplicativos pelos clientes às clínicas médicas também preocupa porque facilita o acesso de terceiros aos dados dos pacientes, que podem ser usados para praticar golpes.

De acordo com relatório divulgado em novembro pelo IESS (Instituto de Estudos da Saúde Suplementar), as fraudes e os desperdícios causaram perdas de até 12,7% das receitas dos planos de saúde em 2022, com prejuízos estimados entre R$ 30 bilhões e R$ 34 bilhões.

Ana Carolina Navarrete, coordenadora do programa de saúde do Idec, critica a maneira como o assunto tem sido conduzido pelas operadoras. Ela afirma que as companhias devem ter a responsabilidade de fiscalizar sua rede credenciada e referenciada.

"O debate envolvendo fraude em plano de saúde está sendo desrespeitoso com quem sustenta esse mercado, que é o consumidor. Existem empresas que, de má-fé, praticam fraudes e que podem enganar e envolver o consumidor nesse processo, mas nunca o consumidor é culpado ou deve ser responsabilizado", diz.

Para Navarrete, o debate sobre fraude está sendo usado contra o consumidor, especialmente na política de reembolso.

"O Idec orienta o consumidor a tomar alguns cuidados, como não compartilhar login e senha, e desconfiar de algum procedimento que não seja padrão na operadora, denunciando na ANS [Agência Nacional de Saúde Suplementar] ou no Procon. Agora, o consumidor não pode ser penalizado por práticas das empresas, como, por exemplo, aquelas em que a operadora exige que o consumidor pague o procedimento do próprio bolso para então ser reembolsado. É difícil, na prática, o consumidor conseguir pagar na integralidade um procedimento de R$ 10 mil ou R$ 15 mil. É justamente por isso que ele contrata um plano, para se proteger desse tipo de risco. Ao exigir o pagamento, a operadora inviabiliza a própria razão de a pessoa ter um plano", diz.

O alerta com o tema das fraudes entrou no contexto da crise enfrentada pelos planos de saúde em meio às consequências da pandemia, quando o setor mergulhou em um prejuízo operacional de R$ 11,5 bilhões em 2022, o pior resultado em duas décadas.

Passada a fase mais aguda, o cenário atual aponta recuo na sinistralidade, embora em patamar ainda acima do período pré-pandemia.

Pelos dados mais recentes da ANS, o setor registrou lucro líquido de R$ 3,1 bilhões no acumulado dos três primeiros trimestres de 2023.

Nas operadoras médico-hospitalares, principal segmento do setor, o prejuízo operacional ainda ficou em R$ 6,3 bilhões no acumulado do ano passado até o terceiro trimestre, compensado pelo resultado financeiro recorde de R$ 8,37 bilhões da remuneração de aplicações.

PRINCIPAIS TIPOS DE FRAUDE NA SAÚDE SUPLEMENTAR

Fracionamento de recibo

Ocorre quando o médico faz apenas uma consulta, mas oferece diversos recibos falsos ao paciente, simulando atendimentos para extrair mais dinheiro do plano de saúde por meio do reembolso. Geralmente, o pretexto para iniciar a fraude é a cobrança de um preço de consulta acima do limite do reembolso

Solicitação de login e senha do plano de saúde

Acontece quando o beneficiário revela login e senha de seu aplicativo do plano de saúde para as clínicas ou os consultórios médicos. Depois de acessados por terceiros, os dados, que deveriam ser confidenciais, podem ser usados para trocar a conta bancária vinculada ao reembolso e receber ressarcimento por procedimentos falsos

Empréstimo de carteirinha

É a fraude em que o usuário de um plano de saúde cede sua carteirinha para que outro paciente, não beneficiário, tenha acesso a consulta ou procedimento se passando por outra pessoa

Estado clínico falso

Há muitos casos desse tipo de fraude em tratamentos estéticos, que não são cobertos pelo plano de saúde. O profissional faz uma aplicação de botox ou implante capilar, por exemplo, mas falsifica o estado clínico do paciente no recibo para forçar o plano a reembolsar seu serviço ao paciente

POSSÍVEIS CONSEQUÊNCIAS PARA O BENEFICIÁRIO

Rescisão do contrato de plano de saúde

Perda do emprego nos casos em que o plano é fornecido pela empresa

Ações indenizatórias

Instauração de inquéritos

Fontes: Abramge (associação brasileira de planos de saúde) e FenaSaúde (federação nacional de saúde suplementar)

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IDEC


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