SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União agora quer a corte acompanhe a disputa entre J&F e Paper Excellence pelo controle da Eldorado Celulose.
Em representação de segunda-feira (5), o subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado pediu que o TCU adote "medidas de sua competência" necessárias para se certificar que o embate entre as duas empresas não cause dano aos cofres públicos.
Furtado argumenta que a transação (ou sua anulação) pode causar a suspensão "supostamente indevida" da multa de leniência de R$ 10,3 bilhões aplicada à holding dos irmãos Joesley e Wesley Batista.
Eles fizeram acordo de delação premiada em 2017 em que falaram sobre esquema de pagamento de propinas e repasses de recursos a políticos de diferentes partidos.
Desde 2018, J&F e Paper brigam na Justiça pela Eldorado. A empresa de origem canadense e de propriedade do indonésio Jackson Wijaya fechou acordo com os Batista para comprar, em 2017, a Eldorado, por R$ 15 bilhões.
J&F alega que a Paper não cumpriu o que determinava o contrato e se nega a transferir 50,59% das ações para a rival, o que a daria 100%. A multinacional afirma que a companhia brasileira fez de tudo para impedir a concretização da venda e, por isso, entrou na Justiça. O caso se arrasta há seis anos.
A legalidade da negociação também é alvo de contestação por causa da lei de terras e da restrições de propriedade por empresas estrangeiras.
Processos administrativos da AGU (Advocacia-Geral da União), Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), ação popular no TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), ação civil pública e manifestação do MPF (Ministério Público Federal) dizem que o contrato infringe a lei.
Para a J&F, são dez decisões diferentes que recomendariam a nulidade do negócio.
A Paper afirma que "não há qualquer manifestação da AGU, do MPF ou mesmo do Incra declarando a nulidade do contrato de compra e venda de ações da Eldorado Celulose, até mesmo porque trata-se de um negócio privado" (leia a nota completa no final do texto).
Na última semana, o ministro Dias Toffoli, do STF (Supremo Tribunal Federal), suspendeu a multa de leniência. O subprocurador do MP usa, em seu pedido, a palavra "aparentemente" para falar sobre a possibilidade de o magistrado ter sido induzido ao erro em sua decisão.
A questão, segundo a representação, é se a versão da holding de que vendeu a Eldorado apenas para conseguir financiar o pagamento da multa da leniência é verdadeira. O argumento foi usado pelo diretor jurídico da J&F, Francisco de Assis e Silva.
Segundo reportagem da revista Piauí, em seu depoimento à arbitragem instalada para resolver a questão sobre a venda da Eldorado, Joesley teria negado ter aceitado a venda apenas por causa dos R$ 10,3 bilhões a serem pagos.
"A se confirmar os fatos, a decisão do Judiciário estaria pautada em fatos incongruentes a qual indiretamente ocasionará dano ao erário, haja vista o não recebimento de recursos que deveriam ser pagos pela J&F ao BNDES, à CEF [Caixa Econômica Federal] e à União pela conta do FGTS [Fundo de Garantia por Tempo de Serviço]", escreve o subprocurador para justificar que o TCU acompanhe o caso.
Ele afirma que BNDES, Caixa, Funcef (fundo de pensão dos funcionários do banco) e Previ (fundo de pensão dos aposentados da Petrobras) com a suspensão da multa, não vão receber R$ 1,75 bilhão cada; a União ficaria a ver navios em R$ 1 bilhão e o FGTS, em R$ 500 milhões.
A Folha tentou falar com o subprocurador Lucas Rocha Furtado, mas não conseguiu contato. A J&F não se manifestou.
A polêmica das terras
Entre as diferentes frentes na disputa pela Eldorado, a questão das terras ganhou relevância a partir do momento em que o Incra divulgou nota técnica dizendo que o controle da companhia de celulose por uma empresa estrangeira desrespeita a lei.
Antes disso, ação popular no TRF-4 sobre o mesmo tema já havia impedido a transferência das ações. A liminar foi pedida pelo procurador regional Fábio Nesi Venzon. O Ministério Público Federal se manifestou recomendando que o processo retornasse à primeira instância.
Há também ação civil pública que tramita em Três Lagos, cidade de Mato Grosso do Sul onde está sediada a Eldorado.
Depois de duas manifestações da Procuradoria da República do estado de que a transferência acionária não estaria de acordo com a legislação, na terça-feira (6), o Ministério Público Federal apresentou réplica afirmando que a venda, sem autorização do Congresso Nacional, "coloca em risco a soberania e segurança nacionais."
No âmbito da AGU e do Incra, há duas notas e dois despachos que afirmam que a negociação não é legal.
Leia a nota enviada pela Paper Excellence:
"Não há qualquer manifestação da AGU, do MPF ou mesmo do Incra declarando a nulidade do contrato de compra e venda de ações da Eldorado Celulose, até mesmo porque trata-se de um negócio privado, sendo que nenhum destes órgãos tem poder para determinar o desfazimento do contrato. A absurda versão apresentada pela J&F, se tivesse qualquer fundamento fático ou jurídico, colocaria em risco dezenas de bilhões de investimentos já realizados por estrangeiros no Brasil em diversos setores estratégicos da economia.
O que há são manifestações e orientações tecnicas, no âmbito de processos administrativos e judiciais em fase inicial de análise e que referem-se exclusivamente à eventual aquisição de direitos sobre terras rurais, com análise abstrata de normas. Também é pífia a tentativa da J&F de se valer, por exemplo, de uma réplica apresentada pelo MPF, que está se manifestando no processo na qualidade de parte, como se tratasse de uma decisão definitiva. Tal manifestação não se trata nem mesmo de parecer e, assim como as alegações da Paper, da J&F e da Eldorado, será posteriormente analisada pelo órgão judicial competente.
A J&F omite os múltiplos pareceres favoráveis à Paper nos processos, como as manifestações da AGU e do Incra quanto à inviabilidade processual da ação popular movida em Chapecó (SC) pelo Sr. Luciano Buligon (e instruída por documentos a que apenas J&F e Eldorado tinham acesso), em que se pleiteia a nulidade do contrato. Tais documentos têm a mesma "força vinculante" que aqueles listados pela J&F, ou seja, posteriormente serão analisados pelas autoridades judiciais competentes. Por ora, não há decisão de mérito quanto ao tema, que segue sob debate em múltiplas esferas.
A Paper tem total convicção de que o contrato de compra da Eldorado atende plenamente a legislação brasileira, uma vez que a operação não compreende aquisição de terras rurais, mas sim de complexo industrial, localizado em area urbana, mais especificamente no município de Três Lagoas em Mato Grosso do Sul. A Paper confia que a Justiça brasileira terá o melhor entendimento sobre o caso e cuidará para que interpretações equivocadas sobre a legislação de venda de terras para estrangeiro não sejam estendidas a negócios que não tem como finalidade principal a exploração de areas rurais, evitando assim um efeito sistêmico na economia, afastando investidores e gerando prejuízo para o país."
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