SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A decisão do governo federal de promover uma nova rodada de renegociação das dívidas dos estados beneficia as regiões mais ricas do país, que terão mais dinheiro para gastar às custas do caixa da União.
Mesmo que esse dinheiro seja direcionado para investimentos, ajudará justamente aqueles que já estão em uma situação vantajosa em relação aos demais.
As afirmações são do professor da FGV EPGE (Escola Brasileira de Economia e Finanças da Fundação Getulio Vargas) Aloisio Araujo, que foi assessor especial do Ministério da Economia de 2019 a 2021.
"Do ponto de vista social, não faz sentido", afirma o economista. "É bom que tenha investimento, mas nem todos vão investir. Mesmo que forem investir, são os estados mais ricos, que têm a melhor infraestrutura. Quem paga é o governo federal."
Na última terça-feira (26), o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou proposta para reduzir os juros da dívida dos estados, em troca da federalização de estatais estaduais e da promessa de investimentos em ensino médio técnico.
A proposta foi apresentada a governadores do Sul e Sudeste, que têm pedido a revisão dos indexadores da dívida com a União, pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda).
Hoje, os governos estaduais arcam com um encargo equivalente ao IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) mais uma taxa real de 4% ao ano. Pelo programa, a taxa real pode cair a 3%, 2,5% ou 2% ao ano. A adesão dos estados pode gerar um alívio de até R$ 8 bilhões ao ano.
"No fundo, é uma piora fiscal do governo central, porque ele vai absorver mais dívidas, e você vai promover talvez mais investimentos no nível de governos estaduais, mas às custas do governo federal, uma situação que não é justa socialmente", diz o professor da FGV.
A dívida dos estados com a União soma R$ 749 bilhões. São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais representam 90% desse total.
Araujo afirma que essa é apenas uma das frentes de pressão sobre o caixa da União, citando também o episódio recente envolvendo a retenção de dividendos da Petrobras, medidas de política industrial e a manutenção de benefícios fiscais.
Para ele, "a economia não está tão mal", crescendo por volta de 3%, 2,5%, e a situação fiscal não está descontrolada, mas essas pressões sobre o caixa do governo central trazem preocupação.
"Tem gente querendo forçar mais os gastos para estimular a economia. O melhor estímulo é ajudar a trajetória de queda dos juros. Se você quiser aumento de investimento e juros caindo, vai dar conflito. Pode ser que a inflação volte ou deixe de cair tão rápido. A taxa de juros não vai cair tão rápido", afirma o professor.
Araujo afirma que cabe ao governo federal ser duro nas negociações com os estados. Uma contrapartida, segundo ele, pode ser a antecipação da transição de 50 anos da arrecadação da origem para o destino no reforma tributária.
Alguns dos estados que querem essa migração mais longa são aqueles que estão pedindo a renegociação das dívidas, segundo o professor. Para ele, uma transição de 10 a 20 anos pode antecipar os benefícios de uma reforma que aumenta a produtividade do país.
"Ficou um momento de incerteza ali. Demora 50 anos. Será que acontece alguma coisa no meio? Se fosse para ceder alguma coisa para os estados, deveria exigir uma transição mais curta. A reforma tributária é o grande trunfo brasileiro", afirma.
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