SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) - Na década de 1980, quando nem se cogitava a possibilidade de psicólogos trabalhando junto a clubes e seleções de futebol, Zico prestou auxílio psicológico fundamental a um companheiro de seleção que estava passando por dificuldades uma semana antes da Copa do Mundo de 1986, no México.

Segundo o ídolo do Flamengo, o lateral-direito Josimar estava enfrentando problemas de saúde mental na preparação da equipe para o Mundial e havia decidido abandonar a seleção e voltar ao Brasil. O lateral havia sido convocado para o lugar de Leandro, cortado da relação inicial do técnico Telê Santana.

"Um dia eu estava fazendo musculação, aí o Alemão veio e falou 'caramba, o Josimar está com as malas prontas, diz que não aguenta mais e quer ir embora para o Brasil. Me ajuda, por favor'", relatou o Galinho ao UOL. Com 32 anos, Zico era um dos mais experientes do elenco brasileiro, ao lado de Sócrates e Falcão e do goleiro Emerson Leão.

Sem contato com profissionais da psicologia no futebol, Zico relatou que em sua época eram os veteranos do time ou o técnico que ajudavam quando algum caso de natureza psicológica aparecia no elenco.

Josimar estava chateado com as cobranças do técnico. "O Telê era aquele treinador que perturbava muito, cobrava bastante. Mas era porque ele queria o melhor do jogador, era muito perfeccionista. E ele ficava perturbando o Josimar, que cruzava errado e ele 'cruza direito, levanta a cabeça'", contou Zico.

"Fui até o quarto dele para conversar e tentar ajudar. Josimar disse que o Telê só pegava no pé dele, e o deixei desabafar, falar tudo o que queria. Aí tratei de desfazer o monstro na cabeça dele: 'trabalho com o Telê há dez anos, ele é assim, se está cobrando é porque ele quer o melhor para você. Já pensou se ele virasse as costas e não desse nenhuma orientação? Você cruzando errado e ele nem aí? Ele está ali porque ele sabe que você tem valor, tem potencial. É o jeito dele, tenho certeza que não está te perseguindo, só quer o melhor para você' Zico

Após colocar panos quentes na situação, com Josimar mais calmo, Zico aconselhou: "Eu acho que você estaria fazendo uma grande merda consigo mesmo se fosse embora, você não pode jogar esta oportunidade pela janela, às véspera da Copa do Mundo ainda. Vamos esquecer isso, ninguém vai saber de nada, pode ter certeza que isso não vai sair daqui'", afirma.

Apesar de não ser psicólogo, a ajuda do Galinho parece ter surtido o melhor efeito possível no defensor de 24 anos. Reserva, Josimar ganhou oportunidade na titularidade da equipe a partir do terceiro jogo da fase de grupos, contra a Irlanda do Norte, por causa da lesão de Édson Boaro na partida anterior. Não só jogou bem, como marcou um golaço de fora da área. Repetiu o nível de atuação contra a Polônia nas oitavas, com outro gol, e se tornou um dos destaques da seleção naquela Copa, que acabaria para o Brasil nas quartas contra os franceses.

"Depois do jogo contra a Polônia, eu virei para ele e falei 'tá vendo? Você está aqui nesta segunda-feira (04) fazendo o Brasil todo gritar por você, mas era para você estar lá no Brasil pulando e torcendo pra gente se tivesse ido embora'", lembrou.


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