SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Daria Dugina seguia os passos do pai, Aleksandr Dugin, um dos principais arquitetos da expansão da Rússia. No último sábado (20), ela foi morta em um atentado que, segundo indícios, tinha ele como alvo.

Como o ideólogo, Dugina era fortemente a favor da invasão da Ucrânia pela Rússia, usando suas aparições como comentarista política numa TV estatal ?onde seu pai foi editor-chefe? para endossar as ações do Kremlin no conflito. Também como ele, defendia o "eurasianismo", teoria que prega a expansão da presença de Moscou para as regiões de influência histórica do povo russo.

Em entrevista recente citada pelo jornal The Washington Post, ela afirmou que a verdadeira identidade ucraniana estava localizada no oeste do país invadido, mas que a parte leste, incluindo o Donbass, era passível de aceitar um "império eurasiano" ?nas palavras dela, baseado na nacionalidade e na fé religiosa.

Dugina também disse que a descoberta de centenas de corpos de civis em valas comuns e nas ruas de Butcha ?que muitos analistas tratam como um crime de guerra cometido pela Rússia? foi, na verdade, uma encenação para manchar a imagem do país de Vladimir Putin.

Enquanto Dugin ganhou fama até no Brasil com suas ideias de extrema direita, sua filha se dedicou sobretudo a ecoar as ideias do pai. Era pouco conhecida mesmo na Rússia, fora dos círculos ultranacionalistas, segundo o New York Times. Mesmo a influência de Dugin, que já foi chamado de "ideólogo de Putin", tem sido objeto de especulação, com alguns analistas afirmando que é significativa e outros considerando-a mínima.

Ao enviar suas condolências a Dugin, o presidente russo disse que a filha do ideólogo ilustrou "com seus atos o que significa ser uma patriota russa".

Dugina tinha 30 anos, de acordo com a mídia estatal russa. Era editora-chefe do United World International (UWI), site criado em 2020 e voltado para análises geopolíticas. Sua atuação na plataforma, em que encomendava artigos de colaboradores, tornou-a alvo de sanções dos Estados Unidos e do Reino Unido, sob a justificativa de que o portal promove desinformação sobre a Guerra da Ucrânia.

Washington cita um artigo publicado no UWI que afirmava que a Ucrânia pereceria caso fosse admitida na Otan, aliança militar ocidental, e Londres descreve Dugina como responsável por promover uma política que "desestabiliza a Ucrânia e mina ou ameaça sua integridade territorial, sua soberania e sua independência".

O conglomerado a que o UWI pertence, o Projeto Lakhta, também foi acusado pelos EUA de ter usado táticas de desinformação para interferir nas eleições americanas de 2018, criando usuários de redes sociais fictícias para publicar textos a favor do então candidato Donald Trump e contra Hillary Clinton.

Dugina morreu quando o carro em que estava explodiu no sábado nos arredores de Moscou. Os socorristas que a atenderam dizem que a morte foi instantânea e que seu corpo foi desfigurado pelas chamas.

O Comitê de Investigação da Rússia abriu uma apuração do ataque, tratado como um "crime premeditado". O órgão afirma que um explosivo foi plantado no veículo, do lado do motorista.

Embora as investigações ainda estejam em curso, o Ministério de Relações Exteriores da Rússia especulou que a Ucrânia estaria por trás da explosão, e Maria Zakharova, porta-voz da chancelaria, afirmou que um possível envolvimento ucraniano apontaria para uma política de "terrorismo de Estado" instituída por Kiev.

Mikhailo Podoliak, conselheiro da Presidência ucraniana, negou a participação da Ucrânia na morte de Dugina e atribuiu a culpa a conflitos internos entre "diversas facções políticas" da Rússia. Ele ainda sugeriu que o incidente teria sido uma resposta "cármica" aos apoiadores das ações russas.

De acordo com o New York Times, Dugina trabalhava em um livro sobre a Guerra da Ucrânia chamado de "The Book of Z", ou o livro de Z, em referência à letra pintada em vários dos tanques russos que invadiram a Ucrânia. A letra, em alfabeto latino, significava "Za pobedu", ou pela vitória.


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