RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) - Em 2021, a cada homem branco assassinado por meio de uma arma de fogo nos Estados Unidos, mais de 22 homens negros foram mortos sob as mesmas circunstâncias.

Os dados coletados pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças e compilados em um estudo por pesquisadores de universidades como Harvard, Brown e Emory mostram um número recorde de óbitos provocados pela violência armada. Foram 48.953, entre homicídios e suicídios, no ano passado ?o maior índice desde 1981, quando o CDC começou a analisar os dados.

O recorde equivale a 134 mortes por dia ?ou a praticamente um americano morto por armas a cada 20 minutos. Ao mesmo tempo, expõe a disparidade dos efeitos da violência sobre diferentes grupos sociais.

"Um número enorme de pessoas morre por armas de fogo nos EUA a cada ano, mas nem todos estão expostos ao mesmo risco", diz Eric Fleegler, um dos autores do estudo e membro do Departamento de Medicina de Emergência de Harvard. "Ao estudar as diferenças nas taxas de mortalidade por sexo, cor da pele, etnia e localização, podemos entender quem tem o maior risco, como as taxas de mortalidade estão mudando ao longo do tempo e direcionar as intervenções para grupos específicos."

As causas por trás dos números não são abordadas no estudo, que busca tratar a violência ligada a armas de fogo nos EUA como uma epidemia, à semelhança do que outros especialistas e o próprio presidente Joe Biden têm feito. Mas Fleegler lista como alguns dos fatores para o maior índice de assassinatos entre negros a taxa de pobreza desse grupo (mais que o dobro da dos brancos) e o fato de que áreas com maior concentração de pobreza têm taxas de mortalidade por arma de fogo até três vezes maior.

A pandemia de coronavírus também teve um efeito sobre o índice geral de mortes por armas ?aumento de 40% em homicídios e de 17% em suicídios de 2019 a 2021.

"Sabemos que houve um aumento da instabilidade econômica e da insegurança, uma grande crise de saúde mental que se agravou e um aumento de armas de fogo compradas nos EUA. Mas como tudo isso se relaciona com as mortes é algo que ainda precisa ser estudado", analisa Fleegler.

Os suicídios envolvendo armas também têm impacto diverso sobre grupos raciais, mas no sentido contrário à tendência dos homicídios. Em média, a cada homem negro que usou uma arma para tirar a própria vida em 2021 nos EUA, dois brancos fizeram o mesmo.

O que leva homens brancos a cometerem mais suicídios que negros é outra pergunta sem resposta definitiva. Há estudos que apresentam algumas hipóteses, como a de que mortes de pessoas negras tendem a ser menos investigadas e, portanto, o número de suicídios dentro desse grupo estaria subnotificado.

"Nossa esperança é que essas descobertas ajudem os formuladores de políticas a desenvolverem programas que tenham como alvo as comunidades e populações com maior risco de mortes relacionadas a armas de fogo", explica o coautor do levantamento Chris Rees, da Divisão de Medicina de Emergência da Universidade Emory.

Embora descartem relações diretas entre o cenário dos EUA e do Brasil em termos de acesso a armas, ambos os pesquisadores reforçam o que o conhecimento científico já comprovou: onde há mais armas há mais mortes por armas de fogo.

"Nosso estudo não pode ser projetado para explicar o que outros países como o Brasil devem aprender com os EUA, mas esperamos que vejam como essas taxas são alarmantes e criem programas e intervenções para evitar que o mesmo ocorra em seu território", afirma Rees.

Em junho, levantamento do Anuário Brasileiro de Segurança Pública apontou que o número de pessoas com licenças para armas de fogo no Brasil cresceu 473% no governo de Jair Bolsonaro (PL). No mês passado, estudo com base no Índice de Equilíbrio Racial (IER), que mapeou mortes violentas intencionais no Brasil, apontou que o risco de pessoas negras serem mortas no Brasil é três vezes maior do que entre não negros; para assassinatos com armas, o risco é 3,6 vezes maior para negros.


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