WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) - Em julho, o líder do Egito, Abdel Fattah al-Sisi completa dez anos no poder. Mas o general terá pouco tempo para pensar no aniversário do golpe que deu em 2013. Dada a crise, esse mês parece cada vez mais distante e, em meados do ano, Sisi encontrará uma população ainda mais pobre e insatisfeita.

A libra egípcia perdeu cerca de 50% do seu valor desde março do ano passado. Já a taxa anual da inflação passou dos 20%. Os preços mudam durante o dia e são rabiscados e corrigidos a mão nas etiquetas.

Produtos básicos como ovo, carne e leite viraram itens de luxo. A classe média tem acumulado dois ou três empregos para poder pagar o aluguel e as parcelas do carro.

Dados de 2020 indicam que 30% da população vivia abaixo da linha da pobreza, uma cifra que, afirmam especialistas, aumentou bastante com os últimos anos de colapso.

Não é a pior crise econômica do Oriente Médio. Nas redondezas, o Líbano passa por uma hecatombe, com a desvalorização de sua moeda em 95% em relação ao dólar e a maior parte da população varrida para baixo da linha da pobreza. Mas o Líbano tem menos de 6 milhões de habitantes. Já o Egito, com 110 milhões, é o país árabe mais populoso; sua instabilidade repercute nesta região e no mundo.

Sisi tem culpado a conjuntura externa. A Guerra da Ucrânia é um dos principais fatores. Russos e ucranianos estavam entre os principais grupos que visitavam o Egito, país que depende do turismo. Deixaram de ir. O conflito também impediu a importação de trigo -o Egito é o maior comprador do grão no mundo. Na esteira, investidores externos deixaram o país, levando US$ 20 bilhões (R$ 100 bilhões).

Esses fatores externos provocam tanto impacto devido à fragilidade do sistema. "A economia egípcia depende da importação para os setores da indústria e da agricultura", diz Amr Adly, professor de economia política na Universidade Americana do Cairo e autor de "Cleft Capitalism" (capitalismo de fissura). O livro, de 2020, trata do fracasso egípcio em desenvolver sua economia.

Nesse contexto, a súbita piora da crise nesses meses não é bem uma surpresa. "Houve muitos sinais que foram ignorados pelo governo e pelo Fundo Monetário Internacional", afirma Adly.

Nos últimos anos, o país tem dependido cada vez mais de empréstimos em dólar e foi se expondo ao movimento de capital, razão pela qual a fuga dos investidores gerou tanto dano.

Para Adly, a crise egípcia, no entanto, não deve chegar ao extremo da libanesa. Ele menciona a dívida dos dois países, por exemplo. A do Líbano supera 150% de seu PIB. Já a do Egito está em torno de 90%. Além disso, o Líbano vive um vácuo de poder, com desavenças políticas impedindo a eleição de um novo presidente desde a saída de Michel Aoun em outubro. O professor menciona, também, o fato de que o sistema bancário do Egito é mais sólido do que o libanês, em colapso.

Para resolver a crise, o governo precisa agir. Com ajuda externa, pode reforçar os setores produtivos para que dependam menos de importação. "Isso precisa aparecer no radar de doadores e aliados", diz Adly.

Especialistas -incluindo os credores do Egito- têm sugerido que o governo reduza a participação do Exército na economia, permitindo o desenvolvimento da iniciativa privada em setores como a construção e a comunicação. Hoje, militares controlam parte da cadeia produtiva nesse regime autoritário.

A ausência de protestos, por ora, não pode ser tomada como um indicador de apoio popular ao regime de Sisi. O Egito proíbe manifestações públicas, prendendo e torturando opositores. Mas esse é o mesmo país que, no passado, revoltou-se pelo preço do pão. É também o país que, em 2011, foi às ruas exigir o fim da ditadura de Hosni Mubarak, durante o que ficou conhecido como Primavera Árabe.

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