BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) - Candidato favorito para vencer as próximas eleições presidenciais no Paraguai, em 30 de abril, Santiago Peña, 44, é a nova cara do partido de direita que mais governou o país, o Colorado. Tem ainda a bênção do ex-presidente Horacio Cartes, que, apesar de ser alvo de sanções dos EUA devido a acusações de corrupção, segue como o homem mais poderoso do país, dono de bancos e empresas de cigarros.

Para opositores, Peña, se eleito, será só uma marionete do caudilho. À reportagem o candidato afirma ter diferenças com a sigla --ele vive às turras com o atual presidente, Mario Abdo Benítez, da ala não cartista.

Nas pesquisas, está bem à frente de seu principal concorrente, Efraín Alegre, que concorre pela terceira vez, agora em uma coalizão com o centro e a centro-esquerda. Segundo levantamento recente, Peña tem 46,2% das intenções de voto, e Alegre, 24,9% --os demais postulantes não passam de 10%. Um deles é o ex-goleiro José Luis Chilavert, hoje um assíduo comentarista da política paraguaia, de viés à direita.

Na entrevista, o candidato elogiou o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com quem disse estar ansioso para trabalhar, defendeu o Mercosul como instrumento de integração regional frente ao desejo do Uruguai de firmar acordos separadamente e justificou um elogio que fez a Alfredo Stroessner, cuja ditadura, de 1954 a 1989, foi marcada por corrupção e violações de direitos humanos.

PERGUNTA - Fora no início do século 20 e, depois, com Fernando Lugo, entre 2008 e 2012, o partido Colorado governou o Paraguai praticamente desde a fundação da legenda. Como explica esse predomínio? Há paralelos com a força do peronismo na Argentina ou com a do PRI no México?

SANTIAGO PEÑA - Não sou um cego defensor do Colorado, minhas críticas são públicas, mas reconheço que se trata de uma força que se sedimentou na cultura paraguaia de modo fortíssimo. Pelo lado dos valores, da família. Há uma enorme diferença em relação ao peronismo, que sempre dependeu de homens e mulheres fortes, de uma espécie de populismo. O Colorado representa os valores mais tradicionais do Paraguai: a família, a estabilidade econômica, o trabalho, aspectos que transcendem líderes políticos específicos. Não saberia fazer relações com o México.

Na última reunião da Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos), o presidente Mario Abdo Benítez foi uma das poucas vozes contra o convite à Venezuela e contra a amenização das relações com Nicarágua e Cuba. O que achou?

S. P. - Tenho diferenças com Abdo Benítez, mas creio que, nesta ocasião, ele e o presidente [do Uruguai] Lacalle Pou foram muito bem. É preciso destacar os abusos de direitos humanos como transversais, para que não virem lugar-comum em nossa região. Essas não são só uma bandeira de uma sociedade de esquerda, mas de uma sociedade democrática. Há outros temas transnacionais aos quais precisamos dar atenção, como a facilidade com que crimes atravessam as nossas fronteiras.

O Mercosul passa por um período de fricção devido à vontade de Lacalle Pou em avançar em um tratado de livre comércio com a China, algo a que Brasil e Argentina colocam obstáculos. O que o senhor pensa disso?

S. P. - Não estou de acordo com Lacalle Pou nisso. A integração regional deve liderar tudo, e a nossa, dentro do Mercosul, deve seguir os passos de Brasil e Argentina. Imagino que, com Lula, voltaremos a ter essa vocação de unidade. Os governos anteriores de Lula foram muito bons para o Paraguai, e imagino que este também será. Estou ansioso para trabalhar com ele.

O Paraguai é um dos principais países que ainda mantêm laços formais com Taiwan, contrariando os interesses da China, que considera a ilha uma província rebelde. Em caso de vitória na eleição, essa posição será revista?

S. P. - Uma relação de mais de 60 anos, construída sobre princípios e valores democráticos, é muito mais importante do que a possibilidade de aumentar as exportações ou ter um maior fluxo econômico como consequência de uma relação diplomática com a China. Outra coisa é que o Paraguai precisa se integrar no mundo, e não é atrativo ter um modelo de exportação com a China onde basicamente eles vão tornar nossas deportações ainda mais primárias. Ou seja, só estaríamos exportando matéria-prima quando o que o Paraguai precisa é avançar em um processo de industrialização. Então há motivos diplomáticos, há motivos econômicos, mas acho que o mais importante é que compartilhamos uma relação amistosa com Taiwan de mais de 60 anos.

Em uma entrevista, o senhor chegou a fazer elogios ao general Stroessner, ex-ditador do Paraguai. Ainda o defende?

S. P. - Veja, o Colorado é um partido tão estruturado e forte que conseguiu a força para tirar Stroessner do comando enquanto era tempo. Meu elogio se restringe ao fato de que, quando estava no poder, tinha um acordo político tão forte e duradouro, sem a preocupação com sucessões presidenciais, que fez com que fosse possível desenhar políticas de longo prazo e mantê-las, sem a insegurança causada por políticas eleitorais. Stroessner foi responsável por mais de 50 anos de estabilidade no Paraguai. Mas exagerou, e de nenhuma maneira sou a favor dos abusos de direitos humanos cometidos no período.

Até hoje parece misterioso o caso que envolveu a prisão do ex-jogador Ronaldinho Gaúcho em Assunção. Como o senhor vê esse caso?

S. P. - Ele foi levado por pessoas de má-fé, entrou em algo que não sabia do que se tratava e cuja explicação ainda não está completa. Claramente tratava-se de um grupo criminoso tentando tirar vantagem, mas creio na inocência dele. Ele não veio ao Paraguai para cometer crimes e foi ludibriado.

Raio-X | Santiago Peña, 44

Economista, foi membro da diretoria do Banco Central do Paraguai e ministro da Fazenda do país. Fez mestrado pela Universidade Columbia, em Nova York, e trabalhou no Fundo Monetário Internacional.


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