SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Coreia do Sul anunciou nesta segunda-feira (6) um plano para indenizar vítimas de trabalhos forçados impostos pelo Japão quando ele ocupou o país, de 1910 a 1945, um tabu nas relações entre as duas nações por décadas. Estima-se que 780 mil sul-coreanos tenham sido explorados durante o período, 1.300 dos quais estão vivos -a conta exclui as cerca de 200 mil mulheres no território que o Exército japonês obrigou a se prostituírem.

A medida é uma tentativa de melhorar as relações bilaterais entre Seul e Tóquio em um momento em que os países buscam apresentar ao lado dos Estados Unidos um fronte unido contra a Coreia do Norte -e a China, portanto. Washington, aliás, saudou efusivamente o anúncio sul-coreano, que chamou de "um capítulo inédito de cooperação e parceria" entre dois de seus maiores aliados.

Internamente, porém, a proposta do governo de Yoon Suk-yeol causou indignação. Por parte das vítimas, que exigiam indenizações e pedidos de desculpas das empresas japonesas envolvidas. E pela oposição, que acusa o governo de Seul de se render aos interesses de Tóquio.

A iniciativa prevê que as indenizações sejam pagas com doações de empresas locais que se beneficiaram de um pacote de doações e empréstimos feito por Tóquio em 1965. Na época, a ilha enviou US$ 800 milhões (cerca de R$ 4,2 bilhões, segundo conversão da AFP) para Seul, ação que marcou a retomada das relações diplomáticas entre os dois países.

"A deterioração das relações entre a Coreia do Sul e o Japão não deve ser mais negligenciada. Precisamos encerrar esse ciclo vicioso em nome do interesse nacional", afirmou Park ao divulgar a medida.

A repulsa interna se explica pelo fato de que o plano contradiz uma decisão da Suprema Corte sul-coreana de 2018 ao fazer com que o próprio país assuma a responsabilidade de compensar os querelantes em vez do Japão. Na ocasião, a mais alta instância da Justiça do país ordenou que uma série de empresas japonesas que se beneficiaram de trabalhos forçados durante a ocupação indenizasse 15 vítimas.

Nenhum dos querelantes recebeu as compensações --hoje, só três deles estão vivos, mas cerca de outros 200 casos judiciais semelhantes estão em andamento. Vários deles afirmaram que pretendem rejeitar o plano do governo e se preparam para novas batalhas judiciais. "Não aceitarei dinheiro que seja produto de mendicância", afirmou Yang Geum-deok, uma das vítimas, à agência de notícias sul-coreana Yonhap, exigindo desculpas de fato.

Enquanto isso, o Japão teve uma reação morna. O chanceler nipônico, Yoshimasa Hayashi, afirmou que não há expectativa de que as empresas japonesas contribuam para o fundo, embora elas possam fazê-lo se assim desejarem. Também deu a entender que o governo não pedirá desculpas novamente pela questão, para o arquipélago finalizada nos anos 1960 com o tratado.

Já o primeiro-ministro, Fumio Kishida, enalteceu a proposta e afirmou que pretendia trabalhar estreitamente com seu análogo sul-coreano. Há expectativas de que os dois líderes se reúnam pessoalmente ainda este mês, e de que ambos se encontrem com o presidente americano, Joe Biden, em maio.

A busca da Coreia do Sul por reparar diferenças históricas com o Japão se dá em meio a ameaças nucleares crescentes de sua vizinha ao norte. Só no ano passado, a ditadura comandada por Kim Jong-un lançou uma quantidade recorde de mísseis em exercícios militares, vários dos quais caíram perto da costa japonesa.

O plano também se insere em um contexto de escalada de tensões entre EUA e China e da consequente ampliação da presença militar americana na Ásia. Além das alianças militares com Seul e Tóquio, Washington também tem pretende estabelecer bases militares em países como Filipinas, Indonésia, Malásia, Vietnã e Brunei, acossadas pela reivindicação de parte de suas águas pelo gigante asiático.


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