MADRI, ESPANHA (FOLHAPRESS) - A Irlanda do Norte é o novo gato de Schrödinger. Da mesma forma que aquele felino, imaginado pelo físico austríaco Erwin Schrödinger para ilustrar as incertezas da mecânica quântica em 1935, estava vivo e morto ao mesmo tempo, a partir desta sexta (24) a Irlanda do Norte está no Mercado Comum Europeu e também não está.

O novo acordo Quadro de Windsor, proposto há um mês pelo primeiro-ministro britânico Rishi Sunak, foi formalmente assinado em uma reunião em Londres. As regras foram seladas por James Cleverly, secretário de Relações Exteriores do Reino Unido, e pelo vice-presidente da Comissão Europeia, Maros Sefcovic.

Os dois presidem o Comitê Conjunto do Brexit, organismo que supervisiona a correta aplicação da saída do Reino Unido da União Europeia (UE).

A situação única da Irlanda do Norte tem sua origem no Brexit, que aconteceu há três anos. Na ocasião, a nação também saiu da comunidade europeia, mas, diferentemente dos demais países do Reino Unido, a Irlanda do Norte optou por permanecer no Mercado Comum Europeu.

As diferentes legislações comerciais, tributárias e aduaneiras do Reino Unido e da União Europeia causaram, então, uma série de complicações, que podem ser mais bem entendidas usando o exemplo da "guerra das linguiças".

Após o Brexit, os britânicos da Irlanda do Norte não podiam mais comprar as linguiças feitas na Inglaterra. Isso porque mercadorias na categoria "produto resfriado à base de carne" só podem ser importadas pelo bloco europeu se estiverem congeladas. Como essas linguiças não eram congeladas, elas sumiram dos supermercados da Irlanda do Norte.

A partir de agora, no entanto, os portos irlandeses terão duas faixas diferentes para o que entra ali. A faixa verde se destina a produtos para serem consumidos apenas pelo mercado irlandês, portanto, não precisa seguir a legislação europeia.

Já a faixa vermelha é para produtos que entrarão na Irlanda do Norte e depois seguirão para a UE. As linguiças inglesas, portanto, poderão ser importadas pela faixa verde, para consumo local, mas não pela vermelha, para posterior reexportação.

"Com as medidas acordadas, respondemos, de forma definitiva, aos desafios colocados durante a implementação do Protocolo Irlandês nos últimos dois anos, bem como aos problemas cotidianos que os cidadãos e empresas da Irlanda têm enfrentado, ao mesmo tempo em que apoiamos e protegemos o acordo da Sexta-Feira Santa em todos os seus pontos", disseram Cleverly e Sefcovic em comunicado conjunto.

O acordo da Sexta-Feira Santa é um pacto assinado em 1998, em Belfast, que encerrou décadas de uma guerra civil entre o IRA (Exército Republicano Irlandês) e o Reino Unido, que foi responsável por 3.700 mortes.

O documento estabeleceu a Irlanda do Norte como nação oficial do Reino Unido, mas também criou o princípio de que o norte e o sul irlandeses poderão unificar a ilha, caso ambos os governos concordem nessa decisão.

Para resolver a questão das linguiças e afins, antes do acordo assinado nesta sexta, cogitou-se fazer uma fronteira aduaneira entre as duas Irlandas, o que poderia promover abalos políticos no tratado da Sexta-Feira Santa e levar oxigênio à questão separatista. O Quadro de Windsor resolve a questão sem necessidade uma cerca entre as Irlandas -a República da Irlanda, mais ao sul, não faz parte do Reino Unido e segue normalmente na União Europeia.

Sunak tem motivos para comemorar, uma vez que debelou nesta semana uma rebelião contra o novo acordo por seu partido Conservador. Boris Johnson e Liz Truss, os dois predecessores de Sunak no cargo de primeiro-ministro, foram dois dos 22 parlamentares conservadores que se recusaram a apoiar o documento, junto com seis do partido Unionista Democrático.

Mas o primeiro-ministro conseguiu manter a unidade e a maioria do grupo conservador, tendo o respaldo de 515 parlamentares na votação que aconteceu nesta quarta (22).

"A Comissão Europeia e o governo do Reino Unido reafirmaram o seu desejo de explorar plenamente o potencial do novo acordo de comércio e cooperação e de maximizar o potencial da relação UE-Reino Unido de formas que beneficiem ambas as partes", concluiu o comunicado conjunto.


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