SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Detido por um período de mais de 900 dias por críticas ao governo de Ruanda, Paul Rusesabagina, que inspirou o herói do filme "Hotel Ruanda", foi solto na noite desta sexta-feira (24), após meses de negociação entre o governo dos Estados Unidos e Ruanda.

Rusesabagina, um cidadão belga, foi transferido para a residência do embaixador do Catar em Kigali, capital de Ruanda. Segundo um oficial americano, ele deve permanecer por alguns dias no local antes de viajar ao Catar, país que ajudou a negociar a sua libertação, para então seguir rumo até os Estados Unidos, onde mora.

O presidente americano, Joe Biden, saudou a libertação de Rusesabagina e a classificou como um "final feliz". "A família de Paul está ansiosa para recebê-lo de volta aos Estados Unidos e compartilho sua alegria com as boas notícias de hoje", disse ele, em comunicado emitido pela Casa Branca.

Ex-gerente de um hotel de luxo em Kigali, o hutu Rusesabagina ajudou 1.200 pessoas a escaparem do genocídio de Ruanda, em 1994. Em abril daquele ano, defensores da ideologia extremista Hutu Power tomaram o poder e botaram em prática um plano genocida contra a etnia minoritária tutsi.

Em três meses, um décimo da população do pequeno país, do tamanho de Alagoas, foi assassinada, boa parte a golpes de machete. Hutus que se negassem a "fazer sua parte" também eram alvos. Cerca de 800 mil pessoas morreram, a maioria da etnia tutsi.

A história de Rusesabagina inspirou o longa metragem "Hotel Ruanda", indicado ao Oscar em 2005, o que lhe deu notoriedade.

Rusesabagina, hoje com 68 anos, foi preso por apoiar a Frente de Libertação Nacional (FLN), um grupo insurgente responsável por ataques em Ruanda em 2018 e 2019. Seus aliados afirmaram que o processo era uma farsa e disseram que o julgamento, que o condenou por oito acusações de terrorismo, estava repleto de irregularidades.

Ele nega qualquer envolvimento nos ataques, mas é um dos fundadores do Movimento Ruandês pela Mudança Democrática (MRCD), um grupo de oposição ao presidente Paul Kagame do qual a FLN é considerada seu braço armado. Sua sentença inicial era de 25 anos de prisão.

Em uma carta ao presidente Kagame, datada de 14 de outubro e divulgada na sexta-feira pelo Ministério da Justiça, Rusesabagina escreveu: "Lamento não ter tomado mais cuidado para garantir que os membros da coalizão MRCD aderissem totalmente aos princípios da não-violência".

Ele disse ainda que se fosse perdoado e libertado passaria o resto de seus dias nos Estados Unidos, "em silenciosa reflexão".

A família de Rusesabagina alertou há tempos que sua saúde estava se deteriorando, e temia que ele morresse na prisão. "Ficamos felizes com a notícia de sua libertação. A família espera poder se reunir com ele em breve", declararam em comunicado pessoas próximas a ele, pouco antes da notícia de sua soltura.

Em um comunicado cauteloso, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, refutou a violência política, sem apoiar as acusações do governo de Ruanda contra Rusesabagina. "Os Estados Unidos acreditam em uma Ruanda pacífica e próspera", afirmou.

"Nós reafirmamos o princípio de buscar uma mudança política em Ruanda por meios pacíficos. Simplesmente não há espaço para a violência política", acrescentou.

A libertação de Rusesabagina foi o resultado de meses de negociações entre Washington e Kigali, com ambos os lados ansiosos para colocar um fim no que descreveram como um fator irritante em sua relação de décadas. Sua prisão havia estremecido as relações entre os dois países.

Os EUA disseram que Rusesabagina foi detido ilegalmente, mas o governo de Ruanda se irritou com as críticas e afirmou que não seria intimidado. Os EUA alocaram mais de US$ 147 milhões em assistência externa a Ruanda em 2021, tornando-se o maior doador bilateral do país.


Entre na comunidade de notícias clicando aqui no Portal Acessa.com e saiba de tudo que acontece na Cidade, Região, Brasil e Mundo!