SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Na esteira de uma onda global de sociedades divididas, o Brasil está a poucos passos de uma severa polarização ?ou seja, um estado em que cidadãos veem profundas divisões e não acham que é possível superá-las?, mostra a pesquisa Edelman Trust Barometer.

Divulgado nesta terça-feira (18), o material contempla 28 países e ouviu mais de 32 mil pessoas em novembro passado. O levantamento chama a atenção para outro fator que dialoga com a polarização: houve um colapso no otimismo econômico, mostram os dados.

Apenas 58% dos brasileiros entrevistados disseram estar otimistas quando questionados sobre a situação na qual estarão daqui a cinco anos, uma queda de 15 pontos percentuais em relação aos números da pesquisa de um ano atrás. A tendência é global: dos 28 países pesquisados, 24 observaram queda recorde nas cifras dessa pergunta.

Ao lado do Brasil, há outros oito países considerados em risco de polarização severa. São eles: Coreia do Sul, México, França, Reino Unido, Japão, Holanda, Alemanha, e Itália. E seis que já atingiram esse estágio: Argentina, Colômbia, EUA, África do Sul, Espanha e Suécia.

Um dos pontos que mais despertou a atenção dos pesquisadores reside na opinião dos brasileiros sobre a coesão social. Para 80%, nunca antes foi vista tamanha falta de civilidade e respeito mútuo como no cenário observado atualmente. A média global é de 65%.

Em sua 23ª edição, a pesquisa mede o nível de confiança em diferentes setores. Brasileiros seguem confiando mais em empresas (64%) e ONGs (60%) do que na mídia (46%) e nos governos (40%). Ainda assim, a confiança nas instituições subiu seis pontos percentuais.

Ana Julião, gerente geral da Edelman Brasil, diz que o ligeiro aumento não chega a surpreender. "Em época eleitoral, sempre observamos um aumento da confiança na instituição do governo. Independentemente de qual seja o novo governo, existe confiança na expectativa da mudança."

A pesquisa conversou com brasileiros no mês seguinte à derrota de Jair Bolsonaro (PL) nas urnas e à vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que dali a dois meses retornaria ao Palácio do Planalto mais de dez anos após o fim de seu segundo mandato.

Julião destaca os diferentes cenários desenhados pela renda dos brasileiros. Entre aqueles de alta renda ouvidos para o levantamento, a média dos que estão confiantes nesses setores, das empresas à mídia, é de 56%. Já entre os de baixa renda, a média de confiança cai para 58%.

Segundo a pesquisa, o cenário global de menor confiança nos governos e na imprensa tem relação direta com o nível de polarização global ?e a fragmentação social também distorce a confiança nesses setores, levando a uma espécie de ciclo vicioso.

A confiança nos governos ?em média 51%? caiu em 14 países. Lideram a lista governos de verniz autoritário: China (89%) e Emirados Árabes Unidos (86%). Na outra ponta, estão países que vivem graves crises políticas: África do Sul (22%) e Argentina (20%).

A confiança na mídia, por sua vez, caiu em 16 dos países pesquisados. A China, onde a maior parte da imprensa é controlada por Pequim, lidera a lista, com 79% de confiança. Na outra ponta está a Coreia do Sul, com apenas 27%. A média global é de 50%.

"A mídia é um dos principais reflexos dessa polarização", afirma Ana Julião. "É uma instituição que defende a verdade factual, algo que está em descrédito; assim, a imprensa vira alvo dessa polarização."

Enquanto isso, empresas e ONGs lideram a lista de confiança, com 62% e 59%, respectivamente. No caso brasileiro, os setores de tecnologia, entretenimento, alimentos e bebidas despertam mais confiança nos cidadãos. Por outro lado, as mídias sociais despertam descrédito.

Líderes de ONGs e professores também são vistos como os únicos agentes unificadores da sociedade pelos brasileiros, enquanto pessoas ricas, autoridades governamentais e jornalistas são considerados personagens que dividem a sociedade e distanciam as pessoas.

Usualmente, o levantamento incluía a Rússia entre os países contemplados. Desta vez, porém, a nação de Vladimir Putin ficou de fora. A exclusão tem relação direta com a Guerra da Ucrânia ?a Edelman, responsável pela pesquisa, não quis contemplar um país responsável por capitanear um conflito armado contra outro, diz Julião.

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