Após se reunir, na semana passada, com parceiros dos Brics na cidade do Cabo, na África do Sul, o ministro das relações exteriores do Brasil, Mauro Vieira, viajou para Adis Adeba, capital da Etiópia, em um esforço do governo brasileiro para estreitar os laços comerciais, e políticos, com os países africanos. O Brics é uma organização de países de mercado emergente formada por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul

Para pesquisadores de relações internacionais entrevistados pela Agência Brasil, o governo brasileiro busca reeditar a política externa conhecida como Sul-Sul, com o objetivo de ampliar as relações dos países do Sul Global, conceito usado para se referir aos países mais emergentes, (concentrados em geral no Hemisfério Sul), em oposição aos países ricos (em geral no Norte).  

Mauro Vieira e o primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed Ali - Abiy Ahmed Ali/Twitter

O chanceler brasileiro Mauro Vieira se reuniu, nesta segunda-feira (5), com o primeiro-ministro etíope, Abiyn Ahmed. Na ocasião, Vieira comunicou à liderança africana que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou que as relações entre Brasil e África sejam prioritárias.  

O chanceler também se encontrou com o vice-primeiro-ministro e ministro dos negócios estrangeiros etíope, Demeke Mekonnen Hassen, quando discutiram o estreitamento de relações em áreas como comércio, agricultura, meio ambiente e esportes. Segundo o Itamaraty, Mauro Vieira informou à autoridade africana sobre o interesse da fabricante brasileira de aeronaves Embraer de estabelecer negócios com a empresa Ethiopian Airlines.  

A Etiópia é o segundo país mais populoso da África, com cerca de 110 milhões de habitantes. A nação tem se destacado pelas altas taxas de crescimento (aumento de 6% do PIB em 2022). A capital Adis Adeba é hoje o principal ponto de conexão aeroportuária entre Brasil e África.  

Em outra agenda no país, o chanceler reuniu-se com o presidente da Comissão da União Africana, Moussa Faki Mahamat. A entidade representa os 55 países do continente. Segundo o Itamaraty, Mahamat aceitou um convite do governo brasileiro para ir ao Brasil e saudou a iniciativa do Brasil de propor a candidatura da União Africana como membro permanente do G20 - grupo formado pelas 19 maiores economias do mundo mais a União Europeia.

Mahamat também manifestou interesse em retomar as Cúpulas América do Sul-África como instrumento de integração entre os continentes. Nas redes sociais, ele destacou a importância de “reviver e reforçar a já forte e histórica parceria entre África e Brasil em participar, e América do Sul e África em geral”.   

Ministro Mauro Viera em encontro com o presidente da Comissão da União Africana, Moussa Faki Mahamat - Moussa Faki Mahamat/ Twitter

Em entrevista à Agência Brasil, o embaixador Joel Sampaio, chefe da assessoria de imprensa do Itamaraty e que acompanha a comitiva brasileira na África, destacou que o objetivo da viagem é abrir possibilidades de negócios para empresas brasileiras e preparar o caminho para a futura viagem do presidente Lula ao continente.  

“É um continente com muita vitalidade, há muito espaço para se avançar em termos de colaboração econômica e trocas comerciais. Já temos tradição de cooperação com eles em agricultura, área florestal, área de saúde. É nisso que o ministro aqui está trabalhando para que, quando houver uma oportunidade de visita presidencial, algumas coisas já estejam maduras para serem sacramentadas”, informou o embaixador brasileiro.  

Cooperação Sul-Sul

Para a co-fundadora do Centro de Estudos e Articulação da Cooperação Sul-Sul, a pesquisadora Luara Lopes, as agendas das autoridades do Itamaraty e do próprio presidente Lula indicam a retomada da política externa conhecida como Sul-Sul, que marcou os primeiros dois governos do presidente Lula.  

Para a pesquisadora, um dos objetivos é diversificar as parcerias comerciais e políticas, servir de intermediário entre o Norte e o Sul e liderar a agenda internacional em nome do Sul Global nas mais diversas esferas. Luara Lopes opina que essa é uma postura pragmática do governo brasileiro.

“O Brasil consegue circular entre vários países e não está preso em certas parcerias. Essa circulação traz benefícios pragmáticos, seja em termos de comércios, de aumentar investimentos, seja em termos de alcançar os objetivos de mudança no sistema internacional – a questão da reforma da ONU é um desses objetivos.”

A reforma no organograma do Itamaraty, que elevou o status institucional de áreas dedicadas às relações com a África e a América Latina – de departamento viraram secretarias –, reforça essa tendência de priorizar as relações Sul-Sul, conforme destacou Marina Bolfarine Caixeta, pesquisadora pós-doc da Universidade Federal de Goiás (UFG) e da Universidade de Brasília na área das relações internacionais.  

Para a especialista, além das questões comerciais, ao priorizar as relações Sul-Sul se reforça a busca pela identidade do Sul Global na política internacional.

“Essa é uma estratégia para projetar cada vez mais o poder desses países em torno de várias agendas da governança internacional, trazendo a ideia de uma reforma do sistema ONU, fortalecendo o multilateralismo contra a hegemonia norte-americana, que é discurso bastante típico do sul global”. 

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