SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Uma semana após a Rússia ter deixado o acordo que permitia o trânsito de navios ucranianos com grãos para exportação, a guerra se espalha pelo mar Negro, chegando o mais perto de fronteiras da Otan (aliança militar do Ocidente) desde que Vladimir Putin invadiu o vizinho há 18 meses.

Nesta terça (25), o Ministério da Defesa russo disse que um de seus navios-patrulha, o Serguei Kotov, foi atacado por dois drones marítimos operados por Kiev. Segundo o relato, eles foram destruídos a cerca de 1 km do barco russo, que disparou contra eles quando patrulhava uma área no sudoeste do mar, a 370 km da base da Frota do Mar Negro, em Sebastopol (Crimeia).

É a primeira ação do tipo em meses, em um campo menos explorado da guerra. A Marinha ucraniana foi basicamente dizimada pelos russos, que por sua vez tiveram a mais simbólica perda do conflito quando Kiev afundou a nau-capitânia da frota de Moscou na região, o cruzador pesado Moskva, com um ataque com mísseis antinavio disparados da costa.

O acordo para a exportação de grãos, vigente desde julho do ano passado, reduziu bastante a atividade naval do conflito ?a destruição do último navio de maior porte ucraniano pelos russos, em maio, foi o último incidente de relevo. Agora, isso tende a mudar, até pela proliferação de drones marítimos de Kiev, como os utilizados contra a ponte que liga a Crimeia anexada à Rússia, trazendo novos riscos de expansão da guerra.

Exemplo disso ocorreu na segunda (24), quando os russos bombardearam terminais de grãos em dois portos no estuário do Danúbio, Izmail e Reni, pela primeira vez. Foi o ataque mais próximo de território da Otan em toda a guerra: essas cidades só têm o rio a lhes separar da Romênia, integrante da aliança militar. Em alguns trechos, menos de 200 m entre as margens.

Até aqui, dois incidentes haviam deixado o Ocidente de cabelo em pé. No primeiro mês da guerra, os russos atingiram uma base de treinamento a meros 25 km da fronteira da belicosa Polônia. Em novembro, passado, um míssil antiaéreo ucraniano acabou caindo no território polonês, matando duas pessoas. Houve também caso inusual de um drone ucraniano que caiu na Croácia, após voar sobre Moldova e Romênia.

Com a eventual proliferação de ataques e incidentes no mar Negro, que tanto Moscou quanto Kiev declararam bloqueado ao dizer que considerariam qualquer navio suspeito de transporte militar após o fim do acordo dos grãos, os riscos de algum erro de cálculo se multiplicam. A região já viu um drone americano ser derrubado por um caça russo neste ano, e diversos incidentes entre forças de Moscou e da Otan nos últimos anos.

Até a segunda, a Rússia havia focado seus ataques à infraestrutura portuária ucraniana mais ao norte, na região de Odessa. O eventual escoamento da produção pelo estuário do Danúbio no mar Negro, junto às águas da Romênia, é mais caro, mas teoricamente seria mais imune a ataques ?não mais. Putin diz que só voltará ao arranjo se o Ocidente respeitar a contrapartida ao acordo, que é a facilitação da exportação de grãos e fertilizantes russos.

A Turquia, mediadora com a ONU do acerto e também membro da Otan, afirmou que os países ocidentais deveriam ouvir o russo. Nesta terça, após um encontro entre Putin e o ditador belarrusso, Aleksandr Lukachenko, o Kremlin reafirmou que não pretende voltar voluntariamente ao acordo.

Enquanto isso, os combates prosseguem. Kiev afirma que sua contraofensiva fez alguns ganhos incrementais no sul ucraniano e na região de Bakhmut, no leste. Já os russos disseram ter repelido novamente ataques, e que prosseguem com sua própria ofensiva no norte de Donetsk (leste) e em Kharkiv (nordeste), mas com intensidade bem menor do que a propagandeada na semana passada.

Ao que tudo indica, tanto Moscou quanto Kiev podem ter exagerado, com motivações diversas, as ações russas. Os ucranianos falaram na maior concentração de tropas desde a invasão de 2022, com 100 mil militares de Putin, mas o que se viu até aqui não corrobora isso.

Mais ao sul, em Zaporíjia, a AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) afirmou que detectou minas terrestres antipessoais no perímetro externo da usina nuclear homônima, a maior da Europa. O diretor-geral do órgão, o argentino Rafael Grossi, não disse o que parece óbvio, que elas são russas, mas condenou a ação ?ainda que afirmando não haver risco para os reatores.

Os operadores russos da usina, ocupada em março de 2022, disseram ter desligado de vez 2 dos 6 reatores do local, que não está produzindo energia.


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