SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Ainda sem um avanço decisivo na controfensiva contra forças russas em seu território, a Ucrânia escalou a guerra de drones contra Vladimir Putin. Pela segunda vez em três dias, Kiev atacou pontos simbólicos de Moscou com drones de longa distância, e houve um novo ataque contra navios da Rússia patrulhando o mar Negro.

A ação ocorreu na madrugada desta terça (1º), e foi admitida como sempre de forma apenas indireta pelos ucranianos. Segundo o Ministério da Defesa russo, dois drones foram derrubados na periferia moscovita, enquanto um terceiro foi desabilitado por contramedidas eletrônicas e espatifou-se contra um prédio no distrito financeiro e de negócios Moscow-City.

Aqui a narrativa engasga: o prédio atingido já havia sido alvo de outro drone no ataque do domingo (30). É o IQ-Center, que concentra escritórios de três ministérios russos (Desenvolvimento Econômico, Digital e Indústria e Comércio) e de empresas de tecnologia.

Por um lado, ele faz parte do único núcleo de arranha-céus da capital, cidade de prédios imponentes, mas de perfil usualmente mais baixo. Por outro, é um prédio especialmente simbólico. Ele fica no Centro Internacional de Negócios de Moscou, conhecido como Moskva-Citi, ou Moscow-City, remetendo à análoga City londrina. Foi idealizado em 1992 como símbolo da Rússia pós-soviética e tem a maior concentração de torres envidraçadas da Europa, algumas ainda em obras.

Ninguém ficou ferido. "Moscou está rapidamente se acostumando a uma guerra total", exagerou o assessor presidencial ucraniano Mikhailo Podoliak no X, o ex-Twitter. Já o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, afirmou que "de fato, há uma ameaça, isso é óbvio, e medidas estão sendo tomadas".

Por precaução, o aeroporto de Vnukovo, 1 dos 3 internacionais que servem a capital, ficou fechado por algumas horas. Isso já havia acontecido duas outras vezes, e a baixa frequências de voos de e para o exterior no país sob sanção tornam o incômodo menos perceptível, mas ele existe.

"Nós recebemos um aviso para trabalhar remotamente nesta semana", afirmou Aleksander, que trabalha em uma empresa de monitoramento de mercado de trabalho em Moscow-City e pediu para não ter o sobrenome revelado. A Iandex, gigante equivalente à Google na Rússia, fez o mesmo e pediu "cuidado" a seus funcionários.

"No momento, estamos avaliando os danos", afirmou Daria Levtchenko, porta-voz da pasta do Desenvolvimento Econômico, no Telegram. Ela disse que os funcionários estão trabalhando de casa. Moscou foi alvo de pelo menos cinco ataques com drones, um deles contra o próprio Kremlin, que fica a 5 km da área atingida nesta terça, desde maio.

Por ora, é psicológico, e a Ucrânia aposta nisso. Mas há o que Aleksander, um apoiador moderado da Guerra da Ucrânia iniciada por Putin em 2022, chama de "estoicismo histórico dos russos". Sob essa visão, vidros quebrados não são nada para pessoas que vêm de famílias que sofreram os pavores da invasão nazista na Segunda Guerra Mundial.

Além disso, é incomparável com o que ocorre em solo ucraniano, como o ataque que matou ao menos seis pessoas em Kriivi Rih, cidade natal do presidente Volodimir Zelenski, na véspera.

A contraofensiva ucraniana ganhou um novo empuxo no fim da semana, com um ataque mais concentrado com blindados e tropas equipadas pela Otan (aliança militar ocidental) em Zaporíjia (sul), mas por ora não logrou um grande sucesso.

NAVIOS SÃO ATACADOS NO MAR NEGRO

Assim, como escreveu Podoliak, a Rússia deve esperar "mais drones não identificados, mais colapso, mais conflitos civis, mais guerra". Com efeito, Kiev também tentou atacar, pela segunda vez em duas semanas, navios russos no mar Negro, uma área nova de crise na guerra desde que a Rússia deixou o acordo que permitia o escoamento de grãos ucranianos por lá, na semana retrasada.

Dois navios-patrulha, o Serguei Kotov e o Vassili Bikov, foram alvo de ataques com drones marítimos nesta madrugada (noite de segunda no Brasil). Segundo Moscou, não houve danos. Na semana retrasada, o Serguei Kotov já havia sido atacado. As embarcações estão operando numa área distante do mar Negro, 340 km a sudoeste de sua base em Sebastopol (Crimeia), visando as rotas que chegam à Ucrânia.

O Ministério da Defesa também disse que houve ataques com três drones contra navios civis de bandeira não revelada que rumavam para o estreito de Bósforo, na Turquia. As embarcações de guerra russas teriam interceptado os drones, algo de verificação impossível a essa altura, mas que pode insinuar uma elevação na tensão no mar Negro.

Tanto Moscou quanto Kiev anunciaram, após Putin deixar o acordo de julho de 2022 que permitia a passagem de navios com grãos ucranianos, que qualquer embarcação seria vista como hostil e passível de inspeção, para não falar em algo pior. Desde então, operou uma campanha de bombardeio contra a infraestrutura portuária da Ucrânia, incluindo portos no rio Danúbio a meros 200 metros da Romênia, país da Otan.

Em resposta, a aliança anunciou que reforçaria a vigilância no mar Negro, visando proteger a navegação em áreas internacionais. Na segunda, uma consulta a sites de monitoramento de tráfego aéreo mostrava a presença de um avião-tanque, um aparelho de patrulha e guerra antissubmarina e um drone de ataque americanos na região. Isso implica riscos de esbarrões, acidentais ou não.

Com efeito, navios estão concentrados perto do estuário do Danúbio, mas em águas romenas, embora três embarcações vindas de Israel, Turquia e Grécia, tenham trafegado na região sob a cobertura da Otan ?restando saber se irão se abastecer de grãos em Izmail, no lado ucraniano do Danúbio. Enquanto isso, Kiev acertou um arranjo para tentar escoar sua produção por meio da Croácia, mas é incerto como isso ocorrerá, dada a distância física entre os países.


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