SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Líderes da África Ocidental vão se reunir em uma cúpula extraordinária na próxima quinta-feira (10) para discutir o golpe de Estado no Níger após a junta militar que tomou o poder no país há quase duas semanas estourar o prazo para restituir o presidente Mohamed Bazoum.
O anúncio do encontro na capital da Nigéria, Abuja, foi feito nesta segunda-feira (7), depois de um fim de semana de tensão. No domingo (6), a cúpula militar que assumiu o poder do Níger fechou o espaço aéreo do país após chegar a data-limite para devolver o poder ao presidente estabelecida pela Cedeao (Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental).
O bloco, que defendeu anteriormente uma intervenção no país caso o prazo fosse ignorado, ainda não respondeu diretamente ao movimento da junta. Nesta segunda-feira, porém, o grupo afirmou que vai discutir o impasse na quinta --decisão que, de acordo com União Europeia e Estados Unidos, abre espaço para mediação. "A janela de oportunidade definitivamente ainda está aberta. Acreditamos que a junta deveria se afastar", disse o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Matthew Miller.
Bazoum está preso desde o dia 26 de julho, quando a junta militar do Níger, intitulada Conselho Nacional de Salvaguarda, assumiu o país sob a liderança do general Abdourahamane Tiani. Ao tomar o poder, o grupo afirmou que colocaria um "ponto final no regime que deteriorou a segurança nacional devido à má gestão".
Havia temores de que a afronta da junta militar pudesse escalar o embate. Dois dias antes, os chefes de Defesa do bloco haviam concordado com um possível plano militar se o presidente não fosse libertado e restituído, embora tenham dito que as decisões seriam determinadas pelos chefes de Estado.
O bloqueio do espaço aéreo teve impactos internacionais. Sem litoral, o Níger tem mais do que o dobro do tamanho da França e muitas rotas de voo pela África normalmente passam por cima do país. A Air France, por exemplo, suspendeu até a próxima sexta-feira (11) os voos com para as capitais de Burkina Fasso e Mali, países que fazem fronteira com o Níger, e alertou que a duração de algumas viagens aumentaria.
No final do domingo, um representante da junta foi à televisão e afirmou que as forças armadas estavam a postos. "As forças armadas do Níger e todas as nossas forças de defesa e segurança, apoiadas pelo apoio inabalável do nosso povo, estão prontas para defender a integridade do nosso território", afirmou o líder.
Os militares também pediram aos jovens nigerianos que estejam preparados para servir seu país em um momento de necessidade --uma convocação que vários estudantes que estavam na Universidade Abdou Moumouni nesta segunda disseram que atenderiam.
"Nenhum sacrifício é demais. Pelo nosso país, estamos prontos para dar nossas vidas", disse Soumaila Hamadou, estudante de mestrado em economia, no campus da capital, Niamey.
No domingo, quase 30 mil simpatizantes do grupo se reuniram em um estádio na capital para expressar apoio e ouvir os discursos da junta. Eles também comemoraram a decisão de não ceder à pressão externa.
Nas TVs do país, grupos de apoiadores do novo regime fizeram rodas de discussão pedindo a solidariedade da população. Eles afirmam que as sanções da Cedeao levaram a cortes de energia e altas nos preços dos alimentos.
A atitude dura da Cedeao é uma resposta a uma onda de golpes na região. A credibilidade do grupo, formado por 15 países, está em jogo --o bloco disse que não toleraria mais tais derrubadas após golpes nos membros suspensos Mali e em Burkina Fasso, que prometeram atuar em defesa da junta militar do Níger se necessário.
Ambos os países enviaram delegações a Niamy para manifestar solidariedade, disse o exército do Mali nas redes sociais nesta segunda-feira. O site de rastreamento de voos FlightRadar24 mostrou um avião militar de Burkina Fasso chegando à cidade por volta das 12h20, no horário local.
Uma fratura na Cedeao e a escalada do impasse com o Níger desestabilizariam ainda mais uma das regiões mais pobres do mundo, que já enfrenta múltiplas crises responsáveis por deslocar milhões de pessoas.
As reservas de urânio e petróleo do Níger e seu papel central na guerra com militantes islâmicos na região do Sahel conferem ao país importância econômica e estratégica para os Estados Unidos, Europa, China e Rússia. Nesta segunda, Miller, porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, afirmou que a ajuda interrompida na última sexta-feira (4) soma cerca de US$ 100 milhões ao país e impacta a assistência ao desenvolvimento, à segurança e à aplicação da lei.
Assim como os EUA, a União Europeia e a França também cortaram apoio financeiro ao Níger, e a Cedao, que impôs um bloqueio econômico ao país. A Nigéria, por sua vez, cortou o fornecimento de eletricidade ao país, que responde por cerca de 70% do consumo. Já a Alemanha disse nesta segunda que sanções não estavam descartadas e descreveu a proibição de voos da junta como um revés.
O ministro das Relações Exteriores da Itália, Antonio Tajani, disse em entrevista publicada nesta segunda que a Cedeao deveria estender seu prazo para a restituição de Bazoum. "A única via é a diplomática. Espero que o ultimato da Cedeao, que expirou ontem à meia-noite, seja prorrogado hoje", disse Tajani ao jornal La Stampa.
A junta parece ter o apoio de pelo menos uma parte da população. Em comícios pró-golpe em Niamey, nos quais é comum ver bandeiras da Rússia, alguns participantes descrevem a situação como uma batalha patriótica da ex-colônia francesa para manter sua independência diante da interferência imperialista.
Entre na comunidade de notícias clicando aqui no Portal Acessa.com e saiba de tudo que acontece na Cidade, Região, Brasil e Mundo!