MOSCOU, RÚSSIA (FOLHAPRESS) - O presidente da França, Emmanuel Macron, dobrou a aposta contra o russo Vladimir Putin nesta quinta (14) e disse, ao ser questionado se enviaria soldados seus para ajudar a Ucrânia, que "não haverá linhas vermelhas".
Macron também afirmou que Putin não irá parar se derrotar a Ucrânia, e que a a União Europeia "será desmoralizada" se isso acontecer.
O francês havia causado furor no mês passado ao dizer que não descartava enviar tropas para ajudar Volodimir Zelenski contra a invasão iniciada pela Rússia há pouco mais de dois anos.
Em resposta, Putin admoestou Macron e lembrou que uma guerra nuclear entre as forças russas e as da Otan (aliança militar ocidental, da qual a França faz parte), seria inevitável neste caso. A lógica é reverter o artigo 5 da carta do clube liderado pelos Estados Unidos, segundo qual o ataque a um membro equivale a uma ação contra todos.
O presidente francês ficou sozinho em sua retórica belicista na Otan, que visa pressionar a vizinha e copatrocinadora do projeto europeu Alemanha a ser mais incisiva em seu apoio a Kiev.
Berlim é o segundo maior doador militar dos ucranianos, atrás dos EUA, mas nesta mesma quinta o Parlamento recusou um pedido da oposição para o envio de mísseis de cruzeiro a Zelenski. O premiê Olaf Scholz diz que as armas indicam uma escalada indesejada, que coloca o país em risco de conflito com Moscou.
É isso que Macron aparentemente quer colocar em dúvida agora. "Se a Rússia vencer essa guerra, a credibilidade da Europa será reduzida a zero", disse. Questionado sobre as tropas, afirmou: "Nós negociamos o quanto pudemos, mas não há nada para falar com ele [Putin]. A Ucrânia precisa vencer, não pode haver linhas vermelhas. Eu sou o presidente da França e eu decido", disse.
Ele não detalhou o que fará. "Não tenho motivos para ser preciso", afirmou. "Mas se nós decidirmos ser fracos, seria escolher a derrota. Eu não quero isso, nossa segurança está em jogo na Ucrânia."
Ele falava a uma entrevista às TVs França 1 e França 2. O tom duro contrasta com a fama de molenga que Macron sempre teve em sua política externa, e é certo que sua nova declaração irá ser respondida nesta sexta de início de eleição presidencial (15) em Moscou, onde já eram 22h (16h em Brasília) quando ele começou a falar.
A França é uma potência nuclear, mas não se compara com a Rússia. Paris tem 290 ogivas nucleares, que podem ser empregadas por aviões ou por mísseis lançados por submarinos. Já Moscou conta com 5.889 bombas, cerca de 1.600 delas prontas para uso.
Os franceses não estão entre os principais doadores de ajuda militar a Kiev, mas ao lado dos britânicos forneceram dezenas de mísseis de cruzeiro Scalp-EG, de enorme valia para as forças ucranianas.
Alguém pode apontar interesses comerciais no anabolizado discurso de Macron: segundo o Instituto para Estudos da Paz de Estocolmo (Suécia), a França passou a Rússia e ocupa a vice-liderança do ranking mundial de transferências de armamentos no período de 2019 a 2023.
A retórica churchilliana, por assim dizer, também destaca o presidente não só entre os líderes europeus, mas também ante Joe Biden. O presidente americano não conseguiu aprovar até hoje a ajuda de R$ 300 bilhões à Ucrânia devido ao clima da disputa eleitoral com o seu antecessor, Donald Trump.
Contrário a apoiar Kiev, o republicano conta com o controle de seu partido na Câmara dos Representantes dos EUA para barrar a liberação do apoio.
Nesta quinta, o chanceler da União Europeia, o espanhol Josep Borrell, advertiu numa palestra a americanos que a Ucrânia está sob risco existencial devido à falta de munição. Alerta semelhante foi feito em Bruxelas pelo norueguês Jens Stoltenberg, secretário-geral da Otan.
Relatos da frente de batalha ucraniana pintam um quadro desolador, com tripulações de tanque ficando sem balas com apenas cinco minutos de combate. No leste, a proporção de disparos de artilharia russos é de 5 para 1, em comparação com os rivais.
Outra explicação para a agressividade de Macron passa por sua baixa popularidade: apenas 30% dos franceses o apoiam, segundo o agregador de pesquisas do site Politico. Ele tem mandato até 2027, quando não poderá concorrer a mais uma reeleição.
Até o começo da guerra, o francês era um dos líderes que mais buscava interlocução com Putin. Ficou famosa a imagem dele na ponta de uma mesa gigantesca no Kremlin pouco antes do conflito, e vazamentos de sua equipe mostraram que ele e seu time se sentiram enganados e humilhados.
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