BRASÍLIA, DF, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Os líderes nas pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República acenaram ao eleitorado evangélico e trocaram ataques de teor religioso nesta terça-feira (16), primeiro dia oficial da campanha eleitoral.

De um lado, o presidente Jair Bolsonaro (PL) sugeriu que, se perder as eleições, as pessoas podem ficar proibidas de falar em Deus. Do outro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acusou seu adversário de estar "possuído pelo demônio".

Segundo pesquisa do Ipec divulgada na segunda-feira (15), o petista tem 44% de intenções de voto contra 32% do atual mandatário. O primeiro turno ocorre em 2 de outubro.

O segmento religioso tornou-se alvo de disputa entre as campanhas. Os aliados de Lula constataram um avanço de Bolsonaro entre evangélicos, grupo em que o presidente já tinha dianteira e que apoiou majoritariamente o atual presidente em 2018.

Essa faixa da população preocupa os petistas por englobar uma parcela de baixa renda e beneficiária de programas sociais como o Auxílio Brasil. Lula tem como foco de seu discurso a população mais pobre.

Enquanto o ex-presidente tenta conter o avanço de Bolsonaro, o atual presidente se esforça para manter e ampliar o domínio entre os evangélicos.

O chefe do Executivo escolheu Juiz de Fora (MG) para dar início à campanha pela reeleição, por ter sido a cidade onde sofreu um atentado com faca em 2018. Na linguagem bolsonarista, Juiz de Fora marcou o "renascimento" do mandatário.

Ele começou o dia de campanha no horário do expediente em uma reunião com um grupo de fiéis; depois, seguiu em motociata para o centro do município. Tanto os discursos de Bolsonaro como o da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, foram marcados por termos religiosos.

Nos dois momentos em que discursou nesta terça, Bolsonaro falou sobre Deus e se mostrou como o candidato que defende os cristãos e as pautas conservadoras.

"Vamos falar de política hoje, sim, para que amanhã ninguém nos proíba de acreditar em Deus", declarou o presidente a apoiadores, no centro de Juiz de Fora.

Mais cedo, ao discursar para os religiosos, voltou a lembrar as igrejas fechadas durante a crise sanitária da Covid-19, quando estados e municípios implementaram políticas de isolamento social para tentar frear a disseminação do vírus.

Bolsonaro mencionou ainda o que chamou de milagres: sua sobrevivência à facada, a eleição e a formação de uma equipe de ministros "sem aceitar pressões partidárias".

Na realidade, após tomar posse o presidente foi na contramão de seu discurso eleitoral contra a velha política e se aliou aos partidos do centrão.

Pressionado pelas críticas em torno de sua gestão na pandemia, inclusive com a instauração de uma CPI no Senado, Bolsonaro entregou ministérios a integrantes de siglas que ele antes criticava e deu a principal pasta do governo, a Casa Civil, ao senador Ciro Nogueira (PP-PI).

Além disso, filiou-se ao PL de Valdemar Costa Neto, condenado no mensalão do PT; e tornou-se aliado do hoje presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

O componente religioso do evento de Bolsonaro foi reforçado pela primeira-dama Michelle Bolsonaro. Ao aparecer ao lado do marido no carro de som, ela foi ovacionada por apoiadores.

Michelle se referiu ao fato de Bolsonaro ter sobrevivido à facada como um milagre. "Aqueles que pregam o amor e a pacificação atentaram contra a vida dele [do Bolsonaro]", disse.

Evangélica e com forte ligação com o segmento, ela não chegou a mencionar diretamente a campanha adversária ou governos anteriores, como fez o presidente, mas falou de um "inimigo" que quer "matar e destruir". E, dando sequência à retórica do bem contra o mal, pediu a Deus que dê sabedoria às pessoas para não entregar o país nas mãos do "inimigo".

A última pesquisa Datafolha, divulgada em julho, mostra que o presidente conseguiu uma dianteira de dez pontos em relação a Lula entre evangélicos: 43% a 33%.

A performance do presidente no eleitorado evangélico só não é melhor por conta de fiéis mulheres. O Datafolha mostra que 34% delas não conseguem apontar um nome antes de conhecer o rol de candidatos. Outras 29% declaram apoio a Bolsonaro e 25%, a Lula --o que os mantêm em empate técnico.

Por isso, o entorno do presidente tem insistido na participação de Michelle em atos de campanha.

Diante do desempenho positivo de Bolsonaro no segmento evangélico, a campanha do ex-presidente Lula desencadeou uma ofensiva em busca desse voto.

Em seu discurso no primeiro ato de campanha, o petista disse que Bolsonaro está tentando manipular evangélicos e chamou o atual mandatário de "fariseu", "presidente fajuto e genocida".

"Ele é um fariseu e está tentando manipular a boa-fé de homens e mulheres evangélicos que vão à igreja tratar da sua fé, da sua espiritualidade. Eles ficam tentando contar mentira o tempo inteiro. Mentiras sobre o Lula, sobre a mulher do Lula, sobre vocês, sobre índios e quilombolas", disse.

"Não haverá mentira nem fake news que manterão você governando esse país, Bolsonaro", discursou.

O petista também criticou a condução de Bolsonaro na pandemia da Covid, afirmando que ele não "derramou uma lágrima pelas vítimas". "Você foi negacionista, não acreditou na ciência, não acreditou na medicina. Você acreditou na sua mentira. Se tem alguém possuído pelo demônio é esse Bolsonaro."

Lula deu o pontapé inicial de sua campanha à Presidência em visita à fábrica da Volkswagen em São Bernardo do Campo.

O local escolhido tem forte simbolismo, pelo fato de as trajetórias do PT e de Lula estarem ligadas à cidade do ABC paulista. "Foi aqui que tudo aconteceu na minha vida. Foi aqui que aprendi a ser gente, que adquiri consciência política e foi por causa de vocês que fui um bom presidente da República", disse o petista.

Como a Folha mostrou, o PT está lançando uma ofensiva para desmentir rumores de que Lula fechará igrejas evangélicas. No discurso, o ex-presidente também disse que ele sancionou a lei que criou o Dia da Marcha para Jesus, em 2009, proposta pelo bispo e então senador Marcelo Crivella, da Igreja Universal.

Em seu discurso, Lula ainda voltou a afirmar que o auxílio concedido pelo governo Bolsonaro tem caráter eleitoreiro. "Ele está achando que o povo é muito besta e que pode enganar o povo. Eu fui favorável a votar o auxílio, pedi para a bancada do PT votar. E se vocês conhecerem alguém que está precisando e cair dinheirinho na conta deles, mande pegar e comer, porque se não pegar o Bolsonaro vai tomar", afirmou.

O ex-presidente disse também que a primeira medida que tomará em um eventual novo governo será reajustar a tabela do Imposto de Renda e que já era candidato havia um tempo, mas que antes não podia falar de campanha nem pedir voto.

"Só hoje à meia-noite que eu pude acordar e falar para a Janjinha: 'Janjinha, vota em mim'. Até ontem eu não podia. Tive que acordar e pedir o meu primeiro voto só hoje."

A presidente do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), defendeu que haja um "mutirão da verdade" para "desmentir o que essa gente está dizendo, jogando medo na população, usando a religião e a fé das pessoas para fazer política".

No primeiro vídeo divulgado nas redes após o início da campanha eleitoral, Lula afirma que quer voltar à Presidência para "mudar de novo a vida do povo" e diz: "Peço a Deus que ilumine essa caminhada".


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