BRASÍLIA, DF (UOL/FOLHAPRESS) - O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), afirmou na decisão que autorizou buscas contra oito empresários bolsonaristas que as condutas do grupo indicavam a possibilidade de organização de atentados contra a democracia. O documento foi tornado público nesta segunda-feira (29), quase uma semana depois das diligências.
Como mostrou o UOL, as representações da Polícia Federal levadas ao ministro relatam que as mensagens divulgadas pelos empresários bolsonaristas tinham o potencial de "instigar" a população e proporcionar condições para a ruptura do Estado Democrático de Direito.
As manifestações basearam a decisão do ministro em autorizar buscas contra oito empresários ligados ao Palácio do Planalto, incluindo Luciano Hang, dono das lojas Havan, que defenderam a ideia de um golpe de Estado caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vença Jair Bolsonaro (PL) nas eleições de outubro de 2022. As mensagens foram reveladas pelo site Metrópoles.
"Não há dúvidas de que as condutas dos investigados indicam possibilidade de atentados contra a democracia e o Estado de Direito, utilizando-se do modus operandi de esquemas de divulgação em massa nas redes sociais, com o intuito de lesar ou expor a perigo de lesão a independência do Poder Judiciário, o Estado de Direito e a democracia; revelando-se imprescindível a adoção de medidas que elucidem os fatos investigados", disse Moraes.
Em sua decisão, Moraes afirmou que o caso está enquadrado dentro do que é investigado no inquérito das milícias antidemocráticas, especialmente no que se refere ao "financiamento de atividades digitais ilícitas e incitação à prática de atos antidemocráticos".
O ministro cita uma mensagem do empresário José Koury, do Barra World Shopping. Na conversa, ele diz: "Alguém aqui no grupo deu uma ótima ideia, mas temos que ver se não é proibido. Dar um bônus em dinheiro ou um prêmio legal pra todos os funcionários das nossas empresas".
Segundo Moraes, a conversa demonstra a necessidade de o Estado ter uma reação "absolutamente proporcional".
"O poder de alcance das manifestações ilícitas fica absolutamente potencializado considerada a condição financeira dos empresários apontados como envolvidos nos fatos, eis que possuem vultosas quantias de dinheiro, enquanto pessoas naturais, e comandam empresas de grande porte, que contam com milhares de empregados, sujeitos às políticas de trabalho por elas implementadas", disse o ministro.
Para Moraes, a situação também demonstrava a necessidade do bloqueio de contas bancárias dos empresários, uma vez que o grupo não teria negado a autoria das conversas. "O que demonstra a necessidade das ações ora propostas para que o Estado não se fie somente em informações de fontes abertas e consiga aprofundar para completo esclarecimento dos fatos", disse.
Moraes também apontou que era "necessária, adequada e urgente" a ordem de bloqueio dos perfis dos empresários nas redes sociais como forma de interromper eventual "propagação dos discursos com conteúdo de ódio".
As medidas contra os empresários, no dia 23 de agosto, foram autorizadas por Moraes e envolveram cerca de 35 policiais federais. As buscas foram feitas em endereços de oito empresários em São Paulo, no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina e no Ceará. Entre os alvos estão:
Luciano Hang, da Havan - dois endereços em Brusque (SC) e um em Balneário Camboriú (SC)
José Isaac Peres, da rede de shopping Multiplan - no Rio de Janeiro
Ivan Wrobel, da Construtora W3 - no Rio de Janeiro
José Koury, do Barra World Shopping - no Rio de Janeiro
Luiz André Tissot, do Grupo Sierra - em Gramado (RS)
Meyer Nigri, da Tecnisa - em São
Paulo Marco Aurélio Raimundo, da Mormaii - em Garopaba (SC)
Afrânio Barreira, do Grupo Coco Bambu - em Fortaleza.
Na semana passada, após a operação da PF, a PGR (Procuradoria-Geral da República) afirmou que não foi informada com antecedência da operação contra os empresários. O gabinete de Moraes rebateu a informação e disse que uma cópia foi enviada para o gabinete da vice-procuradora-geral, Lindôra Araújo, na segunda passada (22).
Em manifestação enviada ao Supremo, Lindôra reafirma que a Procuradoria não foi pessoalmente informada da decisão. Segundo a vice-procuradora, a ordem de Moraes chegou em seu gabinete na tarde de segunda-feira (22), mas ela estava na sede do Ministério Público do Distrito Federal para dar posse a promotores de Justiça.
Segundo Lindôra, a PGR não pode ficar sem acesso aos autos da apuração uma vez que isso impede o "completo e devido" exercício do Ministério Público na supervisão da investigação.
OUTRO LADO
Após a operação da PF na semana passada, o UOL procurou a assessoria de imprensa dos oito empresários citados. Veja as respostas recebidas:
Luciano Hang, da Havan: "Sigo tranquilo, pois estou ao lado da verdade e com a consciência limpa. Desde que me tornei ativista político prego a democracia e a liberdade de pensamento e expressão, para que tenhamos um país mais justo e livre para todos os brasileiros.
Eu faço parte de um grupo de 250 empresários, de diversas correntes políticas, e cada um tem o seu ponto de vista. Que eu saiba, no Brasil, ainda não existe crime de pensamento e opinião. Em minhas mensagens em um grupo fechado de WhatsApp está claro que eu NUNCA, em momento algum falei sobre Golpe ou sobre STF. Eu fui vítima da irresponsabilidade de um jornalismo raso, leviano e militante, que infelizmente está em parte das redações pelo Brasil."
Luiz André Tissot, do Grupo Sierra: A defesa do empresário informou que "a empresa e o presidente da companhia não irão se manifestar sobre o tema".
Afrânio Barreira, do Grupo Coco Bambu: "Estou absolutamente tranquilo, pois minha única manifestação sobre o assunto foi um "emoji" sinalizando a leitura da mensagem, sem estar endossando ou concordando com seu teor. Confio na justiça e vamos provar que sempre fui totalmente favorável à democracia. Nunca defendi, verbalizei, pensei ou escrevi a favor de qualquer movimento anti-democrático ou de "golpe". Assim, sou a favor da liberdade, democracia e de um processo eleitoral justo."
Marco Aurélio Raymundo, da Mormaii: "O Morongo foi contatado hoje pela Polícia Federal, ainda desconhece o inteiro teor do inquérito, mas se colocou e segue à disposição de todas autoridades para esclarecimentos."
Ivan Wrobel, da Construtora W3: O empresário endossou nota enviada à época da divulgação da matéria. "O cenário não mudou, o Sr Ivan tem um histórico de vida completamente ligado à liberdade. Em 1968 foi convidado a se retirar do IME por ser contrário ao AI5. Nada na vida dele pode fazer crer que o posicionamento daquele momento tenha mudado. Colaboraremos com o que for preciso para demonstrar que as acusações contra ele não condizem com a realidade dos fatos."
Meyer Joseph Nigri, da Tecnisa: "Em investigação para apurar supostos crimes contra o Estado Democrático de Direito conduzida pelo STF, o empresário Meyer Nigri, mesmo sem ter tido acesso aos autos do inquérito, como era seu direito, concordou em ser ouvido nesta manhã para colaborar com as investigações. Respondeu a todas as perguntas formuladas pela autoridade e rechaçou qualquer envolvimento com associação criminosa ou práticas que visam à abdicação do Estado Democrático ou preconizam golpe de Estado. Ao contrário, reafirmou sua firme crença na democracia e seu respeito incondicional aos poderes constituídos da República."
José Isaac Peres, da rede de shopping Multiplan: "Ele esclarece que sempre teve compromisso com a democracia, com a liberdade e com o desenvolvimento do país."
José Koury, dono do grupo Barra World, disse ao UOL entender "que o ministro Alexandre de Moraes tomou a decisão que lhe pareceu correta, após receber denúncias e tomar conhecimento das matérias publicadas na imprensa." Entretanto, Koury alega que "os prints exibidos pela mídia foram usados completamente fora do contexto em que foram postados."
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