SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Nikolas Ferreira (MG), o bolsonarista de 26 anos que se tornou campeão de votos nas eleições para a Câmara dos Deputados, tem tudo para fazer barulho em Brasília, mas a cara da nova bancada do PL será mais parecida com a de Lincoln Portela (MG), 69.
Pastor evangélico que fez sucesso no rádio e na televisão antes de entrar na política, Portela exerce atualmente seu sexto mandato e completará quase três décadas de atividade parlamentar se ficar na Câmara até o fim do sétimo, que se iniciará em fevereiro.
O veterano, que há quatro anos foi o único eleito pela sigla em Minas Gerais, colheu desta vez 42 mil votos, o pior resultado de sua trajetória. Com a ajuda de Nikolas, que obteve quase 1,5 milhão de votos, o PL mineiro conquistou 11 cadeiras, incluindo a de Portela.
Com 99 deputados eleitos em 22 estados e no Distrito Federal, o partido de Jair Bolsonaro terá a maior bancada na futura composição da Câmara. Sua representação triplicou de tamanho, se o resultado for comparado com o alcançado nas eleições anteriores.
Mas a maioria dos parlamentares eleitos pela legenda neste ano é formada por políticos profissionais como Portela, que fizeram suas carreiras no PL e em outras legendas alinhadas com o centrão, longe do bolsonarismo, antes da chegada do presidente à sigla.
É um perfil completamente diferente do que distinguiu o grupo ruidoso que chegou à Câmara com Bolsonaro após as eleições de 2018. Mais da metade da bancada eleita pelo seu partido na época, o PSL, era composta por novatos que faziam ali sua estreia na política.
Dos 99 deputados eleitos pelo PL agora, 63 já estavam no ramo quando Bolsonaro chegou ao Palácio do Planalto. O presidente rompeu com o PSL antes de completar o primeiro ano no cargo, fracassou ao tentar criar outro partido e se filiou ao PL no ano passado.
A contrário do que ocorreu há quatro anos, os novatos agora são minoria. Somente 19 dos deputados eleitos pelo PL estavam com Bolsonaro no PSL na campanha de 2018. Outros 17 estavam longe da política partidária e só neste ano disputaram sua primeira eleição.
Embora bolsonaristas como Nikolas tenham contribuído para o crescimento do partido com seu desempenho, arrastando para Brasília veteranos que não se elegeriam sem os votos da legenda, o controle da bancada continuará nas mãos dos profissionais do centrão.
Não há dúvida de que o PL será um dos pilares de sustentação do próximo governo se Bolsonaro for reeleito, mas o perfil da bancada sugere que não será difícil para a sigla mudar de lado se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vencer o segundo turno da eleição presidencial.
"Tudo indica que a bolsonarização do partido não foi completa", diz a cientista política Lara Mesquita, da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas. "Boa parte da bancada não terá dificuldade em aderir a um governo Lula se o PT voltar ao poder."
Foi o que se viu nas encarnações anteriores do PL. O partido indicou o vice que acompanhou Lula em seus dois mandatos, o empresário mineiro e senador José Alencar (1931-2011), e depois apoiou a presidente Dilma Rousseff (PT) até as vésperas do impeachment.
O ex-vereador Antonio Carlos Rodrigues, um dos eleitos pelo PL em São Paulo agora, foi suplente da ex-prefeita Marta Suplicy no Senado e ministro dos Transportes até o fim do governo Dilma. O partido controlou a pasta nos 13 anos em que os petistas governaram o país.
Entre os eleitos para a Câmara desta vez, há até ex-integrantes de siglas de esquerda, como o PSB e o PDT, que se mudaram recentemente para o PL. Wellington Roberto (PB), que foi reeleito agora pela quinta vez, votou contra o impeachment de Dilma em 2016.
"O PL sempre foi dominado por políticos pragmáticos", diz o consultor Antônio Augusto de Queiroz, ex-diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). "Eles vivem de favores do governo e negociarão sua sobrevivência política em qualquer situação."
Haverá certamente tensões entre os veteranos e a ala do partido mais alinhada com Bolsonaro se Lula derrotá-lo no dia 30, mas a composição da nova bancada indica que os bolsonaristas dificilmente terão como bloquear um acordo se os petistas acenarem ao PL.
Com 68 deputados eleitos, o PT terá a segunda maior bancada da nova Câmara. Assim como Bolsonaro, porém, Lula terá que buscar o apoio de outros partidos para ter maioria no plenário se for eleito, o que o obrigará a negociar com forças que não o apoiam hoje.
O presidente do PL, o ex-deputado Valdemar Costa Neto, manda no partido desde a época em que Lula subiu a rampa do Palácio do Planalto pela primeira vez. Valdemar ficou preso por quase um ano por causa de seu envolvimento com o esquema do mensalão, descoberto em 2005.
Nas eleições deste ano, o dirigente favoreceu os veteranos que estavam em busca da reeleição na Câmara ao distribuir os recursos disponíveis nos fundos públicos de campanha controlados pelo PL, em detrimento dos novatos mais alinhados com o bolsonarismo.
As prestações de contas parciais disponíveis no site do Tribunal Superior Eleitoral indicam que, em média, deputados sem vínculo anterior com o bolsonarismo que foram reeleitos pelo PL receberam mais do que o dobro dos fundos destinados aos novatos.
Além disso, os deputados do PL puderam alocar mais de R$ 660 milhões reservados no Orçamento deste ano para as chamadas emendas de relator, que destinam verbas a obras e outras benesses em bases eleitorais de políticos alinhados com o governo, de forma pouco transparente.
Bolsonaristas como o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, eleito deputado por São Paulo, e o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, eleito pelo Rio de Janeiro, tiveram votações expressivas, mas não contaram com recursos equivalentes para suas campanhas.
"Parece claro que a estratégia da cúpula do PL foi usar os bolsonaristas para garantir as cadeiras dos veteranos e aumentar a bancada, mantendo o controle do partido", afirma o cientista político Bruno Bolognesi, da Universidade Federal do Paraná.
Somente 15 dos 52 deputados eleitos pelo PSL junto com Bolsonaro em 2018 continuaram a seu lado e se reelegeram pelo PL agora. A maioria dos que chegaram à Câmara com o presidente há quatro anos se mudou para outras legendas ou fracassou nas urnas desta vez.
Alguns romperam com Bolsonaro e foram para a oposição, como Alexandre Frota e Joice Hasselman, derrotados em São Paulo. Dos 28 deputados eleitos pelo PSL que se afastaram do governo e concorreram por outros partidos, somente 7 conseguiram se reeleger.
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