BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O governador afastado de Alagoas, Paulo Dantas (MDB), é apontado pela Polícia Federal como líder de uma suposta organização criminosa que se valia de funcionários fantasmas para desviar dinheiro público da Assembleia Legislativa do estado e de prefeituras alagoanas.

Dantas, aliado do senador Renan Calheiros (MDB-AL) e apoiador da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em Alagoas, foi afastado do cargo nesta terça-feira (11) por decisão da ministra Laurita Vaz, do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Em nota, o governador afastado chamou a ação de "grotesca" e a classificou como uma "encenação". Disse ainda que uma "ala da Polícia Federal" tenta "dar um golpe" em sua candidatura à reeleição.

Dantas também foi alvo de busca e apreensão na segunda fase da operação Edema, que mira o possível cometimento dos crimes de peculato, organização criminosa e lavagem de dinheiro a partir do período em que ele foi deputado estadual.

Segundo a PF, Dantas é o "principal beneficiário e autor intelectual" do esquema e que "parcela considerável dos desvios foi utilizada para pagamentos de despesas pessoais, honorários advocatícios, transferências a familiares e aquisição de bens em seu nome".

Mesmo após assumir o executivo estadual, em maio deste ano, o governador, dizem os investigadores, "manteve o controle sobre os desvios de verbas investigados, com origem no orçamento da Assembleia Legislativa de Alagoas, beneficiando-se de pagamentos em proveito pessoal da mesma forma que ocorreu desde 2019".

Dantas foi eleito governador de Alagoas numa escolha indireta feita pela Assembleia Legislativa. O ex-governador Renan Filho (MDB) havia se afastado do cargo para poder disputar o Senado. A vice-governadoria não estava ocupada.

Ele é candidato à reeleição e terminou o primeiro turno com 46,64% dos votos. Seu adversário, Rodrigo Cunha (União Brasil), recebeu 26,79%.

A investigação que resultou no afastamento de Dantas do governo teve início em 2021, quando a PF recebeu informações sobre a "movimentação e ocultação de vultosos valores, obtidos por meio de saques periódicos, em espécie, realizados em agências da Caixa Econômica Federal localizadas na cidade de Maceió (AL), nos anos de 2019 e 2021".

Na primeira fase da operação Edema, autorizada pela 17ª Vara Criminal de Alagoas, a PF encontrou os primeiros indícios de participação de Dantas e enviou o caso para o STJ.

Essa primeira fase foi deflagrada após a PF monitorar uma agência da Caixa e flagrar pessoas sacando grande quantidade de valores em espécie.

Um desses alvos monitorados, um policial militar aposentado, foi abordado quando sacava R$ 32 mil por meio de cartões da Caixa em nome de servidores públicos.

Ouvido no inquérito, o PM confirmou que os valores tinham origem em cartões de funcionários fantasmas da Assembleia e que eles tinham conhecimento do esquema.

"Tais servidores têm conhecimento disto e recebem de R$ 200,00 a R$ 300,00 para consentirem com a fraude. Que tais servidores não movimentam estas contas para recebimento de salários. Que diariamente o declarante realiza saques no valor total de R$ 32.000,00", disse o PM à Polícia Federal.

Ainda segundo ele, após os saques, o dinheiro era entregue a um cunhado de Paulo Dantas de nome Antônio Cintra.

"Mesmo com a saída de Paulo Dantas da Assembleia, tais servidores fantasmas continuam na função, provavelmente vinculados a outro parlamentar", completou.

O policial militar também relatou aos investigadores que, após a abordagem da PF, sofreu ameaças de uma pessoa ligada ao governador. Segundo ele, João Ferreira Júnior teria dito que ele seria assassinado caso não devolvesse os R$ 32 mil apreendidos pela PF.

"A ameaça relatada demonstra a periculosidade da organização criminosa investigada, revelando a utilização de meios intimidatórios para que a engrenagem do esquema criminoso não tenha solução de continuidade, tornando ainda mais imprescindíveis medidas imediatas que permitam a desarticulação do grupo."

Após o surgimento da suspeita sobre Dantas e a ida da apuração para o STJ, a PF continuou com a investigação e descobriu que o esquema ainda estava em funcionamento, mas havia alterado o modo de atuação.

Em vez de realizar os saques na agência da Caixa, os integrantes do grupo passaram a efetuar as retiradas de dinheiro em espécie em lotéricas.

"Constatou-se que o esquema criminoso permanece ativo, mesmo depois das medidas ostensivas cumpridas ainda perante o Juízo de primeiro grau, o que denota aparente desdém dos envolvidos ou, quiçá, superestimada confiança na impunidade", diz trecho da decisão da ministra Laurita Vaz.

A PF monitorou ao longo dos últimos meses ao menos dez laranjas e operadores do esquema sacando valores em espécie com o uso do cartão da Caixa em nome de funcionários fantasmas da Assembleia Legislativa de Alagoas.

"Algumas imagens capturadas são esclarecedoras em relação ao modus operandi do grupo, com a realização de saques pelos próprios servidores fantasmas nos limites de cada tipo de terminal", diz a decisão do STJ.

Os investigadores também receberam relatórios de inteligência financeira do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) que indicaram o retorno de valores sacados para o governador.

Um desses relatórios apontou para uma transação de R$ 50,8 mil que teria sido utilizada para o pagamento de despesas pessoais de Dantas.

A PF também analisou a evolução patrimonial de Paulo Dantas e de sua esposa, Marina Dantas. Com base em dados sobre compras de imóveis pelo casal, a PF conclui que "no período em que os desvios de verbas da assembleia ocorreram", o casal apresentou uma "evolução patrimonial exorbitante".

"Somente para as aquisições dos imóveis mencionados foram desembolsados quase 10 milhões de reais entre 2019 e 2022", diz a PF.

Em nota, Dantas afirma que a operação da PF atende a "interesses político-eleitorais, tentando dar um golpe na minha candidatura à reeleição de governador de Alagoas para favorecer o candidato de Arthur Lira, Rodrigo Cunha".

"Aos que acham que os alagoanos são manipuláveis por uma fake news travestida de oficialidade, a nossa campanha avisa: nosso povo não se rende a enganações e sabe muito bem a origem das mentiras. O recurso judicial será firme, e vamos seguir rumo à vitória", diz trecho da nota.

Nas redes sociais, Dantas também disse que a decisão judicial é "encenação, teatro".

"E àqueles que tentam manchar uma campanha limpa e propositiva, fica o recado: a verdade vai vencer novamente e vamos seguir rumo à vitória", acrescentou, numa rede social.

Aliado do governador afastado, o senador Renan Calheiros disse que a decisão da ministra Laurita Vaz --a quem chamou de "bolsonarista"-- é "descabida e nitidamente política".

"A perseguição ao governador Paulo Dantas remonta a 2017, é da competência estadual. Foi parar no STJ por uma armação de [Arthur] Lira [presidente da Câmara] e lá perambulou por vários gabinetes até cair nas mãos certas da ministra bolsonarista Laurita Vaz, que não tem competência para o caso", escreveu Renan, em mensagem publicada nas redes sociais.


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