APARECIDA, SP, SÃO PAULO, SP, BELO HORIZONTE, MG, RIO DE JANEIRO, RJ, BRASÍLIA, DF, E RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - O presidente Jair Bolsonaro (PL), em campanha pela reeleição, causou alvoroço ao participar de missa pelo Dia de Nossa Senhora Aparecida, nesta quarta-feira (12), no santuário dedicado à santa. A passagem por Aparecida (SP) foi marcada por recados desfavoráveis de representantes da Igreja Católica e aplausos e vaias de eleitores.
O rival dele no segundo turno, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), manteve a decisão anunciada de evitar a mistura entre eleição e religião e, também nesta quarta, fez atos no Rio de Janeiro e em Salvador.
Um dia antes da visita de Bolsonaro a Aparecida, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), principal entidade da igreja no país, lamentou em nota "a intensificação da exploração da fé e da religião como caminho para angariar votos no segundo turno". Sem citar nomes, a CNBB disse que "momentos especificamente religiosos não podem ser usados por candidatos".
O arcebispo de Aparecida, dom Orlando Brandes, afirmou na manhã desta quarta, antes da chegada de Bolsonaro na basílica, que "é preciso vencer os dragões do ódio e da mentira". Na fala, durante a homilia de uma das missas, Brandes mencionou ainda os desafios do desemprego, da fome e da incredulidade.
A frase foi dirigida a uma multidão de católicos que lotou o templo. Parte dos romeiros acompanhou a celebração do lado de fora. A festa em homenagem à padroeira do Brasil voltou, depois de dois anos de pandemia, a receber o público sem restrições de circulação ou capacidade.
Depois, questionado em entrevista coletiva sobre a presença na festividade religiosa do mandatário e de Tarcísio de Freitas (Republicanos), candidato do bolsonarismo ao Governo de São Paulo, em uma das missas no santuário nesta quarta, o arcebispo expressou certo incômodo.
"Não podemos julgar, mas precisamos ter uma identidade religiosa. Ou somos evangélicos ou somos católicos. Precisamos ser fiéis à nossa identidade católica, mas, seja qual for a intenção, vai ser bem recebido, porque é o nosso presidente", afirmou o sacerdote à imprensa.
Bolsonaro esteve na manhã desta quarta em Belo Horizonte para a inauguração de um templo da igreja evangélica Mundial do Poder de Deus, do apóstolo Valdemiro Santiago. Junto ao governador reeleito Romeu Zema (Novo), que o apoia, o mandatário acompanhou uma sessão de cura e ouviu Valdemiro pedir jejum de 12 horas até o dia da eleição, pela "nação, pelo presidente e pela primeira-dama".
O ambiente e as falas na capital mineira foram favoráveis à reeleição e aos discursos de campanha do político, mas a Folha de S.Paulo ouviu de uma fiel a reclamação de que, se soubesse que haveria campanha eleitoral no templo, não teria ido até lá. A frequentadora não conseguiu entrar no local.
O presidente, que se diz católico, mas transita entre evangélicos e detém o apoio de líderes do segmento, fez um discurso em que exaltou o Brasil como um país majoritariamente cristão e disse respeitar todas as religiões.
À tarde, sob vaias e aplausos, Bolsonaro chegou ao Santuário Nacional de Aparecida (a 180 km de SP) acompanhado de Tarcísio e de outros aliados, como o senador eleito Marcos Pontes (PL-SP), o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e a deputada federal Bia Kicis (PL-DF).
Com o tumulto, o padre Eduardo Ribeiro, que conduzia a cerimônia, pediu silêncio para iniciar a missa. "Silêncio na basílica. Prepare o seu coração, viemos aqui para rezar", afirmou. Parte do público também soltou gritos de "mito" na direção do presidente.
A missa transcorreu de forma serena, sem a presença de Bolsonaro no altar ?nas celebrações do ano passado, o presidente foi encarregado de fazer a primeira leitura. Na homilia, o pároco Eduardo Catalfo pediu paz para a nação e enalteceu Nossa Senhora Aparecida como mulher negra e a representação do povo brasileiro.
Do lado de fora do templo, um jovem que vestia camiseta vermelha foi alvo de uma multidão enfurecida que gritava "mito" enquanto a comitiva do presidente estava em uma tenda de peregrinos. O homem, inicialmente, ficou encurralado em um círculo e, depois, quando tentou fugir, foi perseguido aos gritos de "Lula, ladrão, seu lugar é na prisão" e "a nossa bandeira jamais será vermelha".
A hostilidade dos bolsonaristas só acabou quando o homem de vermelho sumiu entre os corredores da igreja, sem ser agredido fisicamente.
A comitiva presidencial não viu a cena. "E pensar que aqui é a casa de Deus", falou uma mulher assustada, com uma camiseta de romaria de São José dos Campos (SP).
Após a missa, o presidente foi convidado para rezar um rosário na basílica antiga, a primeira construída em devoção à santa. A atividade foi organizada pelo Centro Dom Bosco, organização de católicos conservadores que não tem ligação com o santuário nacional, cujo administrador é dom Orlando Brandes.
"Não é uma iniciativa nem do santuário nem da arquidiocese, mas as pessoas são livres", disse o arcebispo.
Bolsonaro não compareceu à basílica antiga, mas o anúncio de sua possível ida atraiu centenas de apoiadores ao local e houve princípio de confusão, com xingamentos e intimidações. Apoiadores do presidente partiram para cima de uma equipe de jornalistas da TV Vanguarda, afiliada da Rede Globo.
Segundo a repórter Daniela Lopes, que trabalha na TV, houve ofensas verbais e tentativa de agressão, mas um segurança que acompanhava interveio. Ela também disse à reportagem que a confusão começou após um homem, com uma camiseta com a frase "fora, Bolsonaro", se aproximar do cinegrafista.
Depois que Bolsonaro deixou a igreja antiga, o padre Camilo Júnior disse durante uma pregação que o dia deveria ser dedicado à santa católica, e não a eleições. "Parabéns a você que está aqui dentro e está rezando, porque hoje não é dia de pedir voto, hoje é dia de pedir bênção", afirmou, sob aplausos.
É a terceira vez em que Bolsonaro, na condição de presidente, visita o Santuário Nacional de Aparecida. A primeira foi em 2019. Em 2021, dom Orlando fez alertas sobre o armamento da população, o discurso de ódio e a propagação de fake news ?as falas foram entendidas como recados ao governante.
Também no ano passado, com a pandemia de Covid-19 em um momento mais crítico, o arcebispo defendeu a ciência e discursou sobre a importância da vacinação contra o coronavírus, indo na contramão do comportamento de Bolsonaro durante a crise mundial de saúde.
A volta do mandatário ao templo católico é mais um passo na maratona dele em busca de votos dos religiosos. Desde o dia 4, Bolsonaro participou de dois cultos da igreja evangélica Assembleia de Deus e usou o Círio de Nazaré, uma das maiores celebrações religiosas mais populares do país, para fazer campanha.
Em uma unidade da Assembleia de Deus na capital paulista, o presidente e a primeira-dama Michelle Bolsonaro subiram ao púlpito e falaram aos fiéis. Ela, que é evangélica, não esteve em Belo Horizonte nem em Aparecida nesta quarta.
No Pará, o presidente sofreu críticas da igreja e ficou isolado durante a festividade. A Arquidiocese de Belém afirmou que não convidou o mandatário e que não desejava nem permitia "qualquer utilização de caráter político ou partidário" do evento religioso. O Planalto disse à Folha de S.Paulo que ele participou do Círio como chefe de Estado.
As atividades de Lula no feriado foram desvinculadas da celebração religiosa. O petista, que também mira os públicos evangélico (que majoritariamente apoia Bolsonaro) e católico, participou pela manhã de uma caminhada no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, onde prometeu avanços na economia para a população mais pobre.
Antes do ato, o ex-presidente ergueu uma imagem de Nossa Senhora Aparecida que lhe foi entregue por uma moradora. Durante o percurso, feito sobre um carro de som, estendeu uma bandeira do Brasil.
O petista também esteve em uma caminhada em Salvador.
Na semana passada, Lula disse que não gosta de fazer nenhum gesto "que possa parecer" que esteja "utilizando a religião para fazer política". "Gosto de professar a minha fé e demonstrar a minha religião na minha intimidade. Não gosto de ficar fazendo Carnaval", afirmou.
Lula foi convidado pelo governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), para participar do Círio de Nazaré, mas declinou.
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