SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em 2019, quando o sociólogo Celso Rocha de Barros começou a pesquisar a história do Partido dos Trabalhadores, Jair Bolsonaro tinha acabado de assumir o poder, o principal líder do PT estava preso e ninguém imaginava que os petistas conseguiriam voltar logo ao centro do palco.

O resultado do seu trabalho chega às livrarias três anos e meio depois, a duas semanas do segundo turno da eleição presidencial mais tensa da história recente do país, com Luiz Inácio Lula da Silva na frente das pesquisas e seguido de perto por Bolsonaro, que concorre à reeleição pelo PL.

Barros conta que foi aconselhado por amigos a adiar o livro, para que a recepção não fosse contaminada pela conjuntura, mas preferiu insistir. "É uma aposta de que ainda é possível conversar sobre o PT racionalmente", explica o autor, que é colunista da Folha de S.Paulo.

"PT, uma história", que chega às lojas nesta sexta (14), revê a trajetória do partido desde as origens, analisa acertos e erros de seus governos e defende a tese de que terá papel crucial a desempenhar na democracia brasileira se Lula derrotar Bolsonaro.

Barros revisitou a vasta bibliografia disponível sobre o assunto, examinou documentos, fuçou arquivos de jornais e fez mais de 65 entrevistas com dirigentes, militantes e ex-participantes de governos petistas -incluindo 9 que falaram com a condição de que seus nomes fossem omitidos.

Lula não quis dar entrevista, nem Dilma Rousseff, sua sucessora. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que conheceu Lula nos anos 1970, participou de reuniões em que a fundação do partido foi discutida e o derrotou nas urnas duas vezes, concedeu um longo depoimento.

Além de explicar como o PT se consolidou como força dominante da esquerda brasileira, o livro reflete sobre o processo de redemocratização do país e as conquistas da Nova República, o período inaugurado com o fim da ditadura militar (1964-1985) e a aprovação da Constituição de 1988.

Militante do partido por dez anos, até o final da década de 1990, Barros dedica bastante atenção aos movimentos sociais que emergiram no fim do regime autoritário e participaram da fundação do PT em 1980, aliados a pequenos grupos de esquerda e aos sindicalistas liderados por Lula.

Não esconde as tensões que sempre houve entre eles e dá voz às diversas correntes internas. Ganham destaque lideranças que participaram da criação do partido e depois se afastaram dele, como a ex-ministra Marina Silva, que se reconciliou com Lula neste ano.

O autor mostra como o PT deixou o ideário marxista rumo a um partido de perfil social-democrata, abandonando o radicalismo do começo para ampliar a base eleitoral, fazer alianças com outros setores da sociedade, conquistar o poder e governar.

"A integração do PT ao sistema foi mais rápida do que a dos partidos europeus que fizeram antes essa transição", diz Barros. "A principal diferença é que no Brasil isso ocorreu numa etapa histórica em que o centro se movia para a direita e não estava disposto a fazer muitas concessões."

O livro ajuda a entender como isso levou ao fracasso das articulações que buscaram aproximar petistas e tucanos em vários momentos. "Eles se tornaram nosso alvo principal, e nós o alvo principal deles", lamenta o ex-ministro Gilberto Carvalho no livro. "Foi uma coisa, assim, trágica."

O processo de moderação do PT atingiu o auge com a chegada de Lula à Presidência da República, quando o partido se aliou a siglas de direita e assumiu compromissos com políticas econômicas responsáveis para vencer desconfianças do meio empresarial e obter apoio no Congresso.

Na visão de Barros, a eleição de Lula em 2002 representou um marco da Nova República. "Se consideramos que a alternância no poder é fundamental em uma democracia, só em 2002 foi possível ter a certeza de que o Brasil tinha um regime democrático", argumenta no livro.

Barros discute os escândalos de corrupção que marcaram as administrações petistas, até hoje apontados como justificativa para o repúdio de parte do eleitorado a Lula e seu partido, e conclui que o PT aceitou as regras do jogo político brasileiro, em vez de reformar o sistema.

Ele critica a maneira como Dilma Rousseff conduziu a economia em seu governo, mas sugere que as condições da época limitavam suas opções. Barros classifica o impeachment como uma fraude, mas discorda da sua caracterização como um golpe, por não ter havido ruptura constitucional.

Na sua avaliação, teria sido melhor que os adversários tivessem deixado Dilma concluir seu mandato e batessem os petistas nas urnas. O PT teria tido condições de se renovar na oposição, e uma direita mais moderada que a bolsonarista teria conseguido outra chance de governar, diz ele.

Barros conclui o livro argumentando que o PT se tornou o único dos grandes partidos da Nova República que reúne condições de liderar uma nova coalizão de governo e reorganizar a democracia brasileira se Bolsonaro perder a eleição e deixar o Palácio do Planalto.

Lula se reaproximou de Fernando Henrique na campanha eleitoral deste ano e escolheu como vice o ex-governador tucano Geraldo Alckmin, o rival que venceu na eleição de 2006. Alckmin deixou o PSDB e se filiou ao PSB para entrar na caravana do PT.

Para Barros, caberá aos petistas exercer um papel parecido com o que o antigo PMDB desempenhou na transição para a democracia, unindo-se ao centro para barrar a direita radical. "Se o PT não ganhar, aí os problemas do país serão muito maiores do que sua derrota", afirma Barros.

PT, UMA HISTÓRIA

Autor: Celso Rocha de Barros

Editora Companhia das Letras R$ 94,90 (488 págs.)

Eventos de lançamento: Na terça-feira (18), em São Paulo, na Livraria da Travessa (Rua dos Pinheiros, 513), às 19h. No dia 24, no Rio de Janeiro, na Livraria da Travessa (Rua Visconde de Pirajá, 572), às 19h.


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