BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) - Além da fama de ser o termômetro do que ocorre na eleição presidencial como um todo, Minas Gerais tem convivido com outro mistério nos últimos anos. O seu governador, Romeu Zema (Novo), é destinatário de um caminhão de votos ao mesmo tempo em que coleciona um notório histórico negativo como cabo eleitoral.

Ele tenta agora sepultar esse passado com o engajamento de corpo e alma na campanha de Jair Bolsonaro (PL).

Dono de um conglomerado empresarial e alçado à política na onda bolsonarista, Zema se elegeu governador com 71,8% dos votos válidos em 2018, no segundo turno. Agora, se reelegeu no primeiro turno com 56,2%.

Em 2018, o Novo teve um desempenho razoável em Minas, considerando que ainda dava os primeiros passos: além do governador, elegeu três deputados estaduais e dois federais.

O senador da chapa de Zema, Rodrigo Paiva, ficou em quinto e não se elegeu naquele pleito.

Dois anos depois, na disputa municipal de 2020, o partido de Zema decidiu lançar candidatos a prefeito em apenas três cidades importantes e simbólicas do único estado governado pelo partido: Belo Horizonte, a capital, Contagem, a terceira maior do estado, e Araxá, terra natal de Zema.

Em nenhuma delas o partido chegou perto de vencer.

Na Araxá de Zema, seu candidato, Emilio Neumann, ficou em terceiro, com apenas 9,1% dos votos válidos. Em Contagem, Márcio Bernardino foi o quinto (4,6% dos votos).

Na capital, Rodrigo Paiva também ficou em quinto (3,6%). Este ano, ele tentou se eleger deputado federal, mas voltou a passar longe: recebeu apenas 7.697 votos.

A má fase de Zema como cabo eleitoral se repetiu no primeiro turno das eleições deste ano.

O Novo não conseguiu emplacar em Minas nenhum deputado federal. Para estadual, elegeu dois, contra três em 2018. O candidato do governador ao Senado, Marcelo Aro (PP), ficou em terceiro.

Apesar de contar com nove partidos, a coligação de Zema elegeu menos deputados para a Assembleia Legislativa de Minas (22) do que a chapa do adversário Alexandre Kalil (PSD). Embora derrotado no primeiro turno e contando com apenas cinco partidos, Kalil viu 27 deputados estaduais da sua aliança serem eleitos.

O candidato do partido à Presidência da República, Luiz Felipe D'Ávila, teve 0,47% dos votos no país. Em Minas, o desempenho foi um pouco menos inexpressivo (0,82%), mas o candidato só conseguiu superar 1% dos votos válidos em Santa Catarina e no conjunto das seções eleitorais do exterior.

Assim que o resultado do primeiro turno foi anunciado, Zema foi a Brasília selar o apoio a Bolsonaro, o que foi tratado pela campanha do atual presidente como um dos trunfos dessa segunda etapa.

A tarefa encomendada ao governador mineiro é a de reverter a vantagem de 563 mil votos obtida por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no primeiro turno em Minas, quando o petista marcou 48,3% contra 43,6% de Bolsonaro.

Desde então, o governador organizou e participou de eventos ao lado de Bolsonaro ou bolsonaristas --como em Divinópolis, na segunda (24), reduto do senador eleito Cleitinho (PSC)--, ligou para prefeitos em busca de apoio, gravou vídeos para serem compartilhados nas cidades e atuou junto a entidades empresariais.

"Eleição é sempre imprevisível, tudo pode mudar na véspera, no último dia, mas nós estamos aqui em Minas assistindo a um crescimento do eleitor pró-Bolsonaro e sabemos que isso pode continuar nos próximos dias, pode se intensificar, pode dar uma paralisada e pode até recuar", disse o governador à reportagem na segunda-feira (24).

"Mas estamos otimistas. Sabemos que a grande maioria dos prefeitos de Minas, 80% ou mais, sofreram muito na época do PT e de [Fernando] Pimentel [ex-governador do PT no estado], que é cria do Lula, e sabem como o PT é capaz de fazer estragos."

O governador diz que os resultados pífios do Novo em 2022 se devem ao caráter de polarização da disputa. "Uma eleição majoritária, como a minha, é muito diferente de uma eleição proporcional como a de um deputado estadual ou federal. O que aconteceu em Minas aconteceu no Brasil todo. Os partidos mais aos extremos, tanto à direita quanto à esquerda, cresceram. Partidos que não estão tanto aos extremos deram uma enxugada."

De acordo com pesquisa do Datafolha divulgada nesta quinta-feira (27), Lula segue à frente em Minas, com 48% das intenções de voto contra 43% de Bolsonaro.

Após o ingresso de Zema na campanha bolsonarista, a sua longa lista de adversários no estado também organizou um plano de contenção e aposta que ele não conseguirá entregar ao presidente a promessa de virada.

A linha de frente é formada pelo deputado federal Reginaldo Lopes, pelo senador Alexandre Silveira (PSD)--derrotado na tentativa de reeleição-- e por Kalil.

"Ele [Zema] já se já se empenhou muito na campanha dele. Muita gente do Lula, por não saber que ele era um Bolsonaro, votou nele. Talvez se ele tivesse falado o que ele está falando agora, ele não teria tanto voto do pessoal do Lula", diz Kalil, que tem participado de atos e se reunido diariamente com aliados de Belo Horizonte e da região metropolitana.

Kalil afirma se dedicar integralmente à capital e ao entorno, que teria deixado de lado no primeiro turno diante da necessidade de cabalar votos no interior do estado.

O senador Alexandre Silveira vai na mesma linha: "O Zema teve 40% dos seus votos casados com os do presidente Lula. Ele ter a petulância e a arrogância de achar que é dono do voto desse eleitor, isso não vai acontecer."

Deputados federais do PT também dizem avaliar que a fama de pé-frio de Zema como cabo eleitoral vai continuar.

"O Zema é aquele político sem sal e sem tempero, não consegue transferir nada", afirma Paulo Guedes, deputado do PT com reduto eleitoral no norte do estado, região que proporcionalmente deu a maior vitória a Lula. "A última vez que alguém achou que era imperador de Minas perdeu aqui", reforça Odair Cunha, em referência à derrota de Aécio Neves (PSDB) para Dilma Rousseff (PT) no estado, em 2014.

"Efeito zero [o apoio de Zema], com todo o carinho ao governador. Antes do voto ser do Zema, ele foi Lula. O Zema sabe disso, se não ele teria apoiado o Bolsonaro já no primeiro turno", diz Reginaldo Lopes.

O deputado André Janones (Avante), que comanda informalmente a estratégia digital de Lula e é de Minas, diz que o governador cometeu um erro de avaliação sobre o eleitorado do estado.

"É dos dois lados. Eu também não consegui virar votos contra o Zema no primeiro turno. O mineiro pensa por si só. Ele confundiu ter voto com ter fãs. Ele achou que tinha um monte de fãs que se ele falasse: 'votem todo mundo aqui' todo mundo ia votar aqui."

Eleito vice-governador na chapa de Zema, Mateus Simões (Novo) diz considerar satisfatória a eleição de deputados federais e estaduais pela coligação de nove partidos. Ele ironiza as projeções feitas por adversários de que Zema não conseguirá "virar" Minas para o lado de Bolsonaro.

"Vamos esperar para ver o resultado. Isso é reclamação de gente que está com medo. O pessoal tá com medo, tá vendo o governador se movimentar, e fica com essa reclamação bobinha. 'Ah, o governador não vai conseguir ajudar'. Então, ótimo, o PT pode ficar tranquilo, não tem motivo para o ex-presidente Lula visitar Minas Gerais."

Minas virou alvo das duas campanhas por ter o segundo maior eleitorado do país, só atrás de São Paulo, e também pelo retrospecto. Desde a redemocratização, todos os eleitos também triunfaram nas urnas mineiras.

O desempenho de Zema como cabo eleitoral

2018

2 deputados federais

3 deputados estaduais

Nenhum senador

2020

Nenhum prefeito

2022

Nenhum deputado federal

2 deputados estaduais

Nenhum senador

Candidato a presidente do Novo, Luiz Felipe D'Ávila teve 0,82% dos votos válidos em Minas

Coligação de Zema, com 9 partidos, elegeu 22 deputados estaduais; a de Alexandre Kalil (PSD), com 5 partidos, elegeu 27


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