Depois de um domingo (2) que concentrou a espera pelos resultados das eleições de 2022, segue a corrida para o segundo turno da disputa presidencial, enquanto foram determinados os quadros mineiros de deputados estaduais, federais, senadores e o governador que representarão Minas Gerais pelos próximos anos. A Acessa.com conversou com o cientista político e professor do Departamento de Ciências Sociais da UFJF, Diogo Tourino de Sousa, sobre alguns dos principais aspectos das eleições em Juiz de Fora.
ACESSA.COM: Qual aspecto chama mais a atenção no primeiro turno das eleições de 2022?
DIOGO TOURINO: Tem uma coisa que é bom a gente marcar, porque enfim, é o mais legal que aconteceu. Eu estava tão preocupado com isso. Havia uma expectativa geral de um dia violento, com pessoas, possivelmente, se agredindo. Esse era um medo geral. Felizmente, o saldo geral positivo é que não testemunhamos episódios de violência. Houve alguns casos isolados, como o do sujeito ensandecido destruindo uma urna em Goiás, mas isso foi muito aquém do que a gente esperava. Esse, para mim, é o dado mais positivo. Eu tenho uma filha pequena, de 8 anos, tenho ido com ela na rua, ver a movimentação e é muito satisfatório ver o modo inocente com o qual ela vê as eleições e pensa sua dimensão de festa, com a possibilidade de colar um adesivo, pegar um apito, balançar uma bandeira, de expressar a sua opinião, sem medo de ser agredido, sem medo de ser ofendido. A gente precisa fazer uma força para recuperar isso, a ideia de que a democracia coloca projetos de Brasil em confronto, mas não faz de nós, necessariamente, inimigos que querem destruir uns aos outros. Esse é o dado pelo qual temos que lutar, independente do resultado que essa eleição traga.
ACESSA.COM: Juiz de Fora teve 11 dos seus 19 vereadores disputando vagas de deputados nessa eleição. Nenhum deles foi eleito. Qual é a análise que podemos fazer sobre essas candidaturas?
DIOGO TOURINO Eu acho que essas candidaturas não são a mesma coisa. Há vereadores e vereadoras que se candidatam a deputado estadual ou federal com evidente chances e intenções de se elegerem sim, mas existe uma coisa que é muito comum, que são personagens que querem se manter visíveis. Utilizam candidaturas em calendários intermediários de eleição, para manter seu nome em evidência, em visibilidade. Às vezes, a gente vê uma figura que é vereador histórico no município, que está há muito tempo na Câmara, que quando chega uma eleição estadual ou federal, se candidata para conseguir essa visibilidade. Mas não é uma candidatura que, de saída, a gente enxergue com força, com motivação, claras intenções de que vai ser uma candidatura vitoriosa. Isso não é uma estratégia condenável, é importante que se diga isso, mas é uma estratégia usual.
ACESSA.COM: Sobre o quadro de candidatos de Juiz de Fora eleitos, quais aspectos se destacam?
DIOGO TOURINO: Primeiro, o dado do aumento da representação feminina. É um dado muito interessante, que precisa ser registrado, porque o aumento da representatividade feminina é importante, para tornar mais plural o congresso, para levar outras vozes e interesses, que até então, não têm espaço na agenda pública. Outro ponto: é interessante, o dado da renovação com quadros. Candidatos que já ocupavam cadeira, com alguma proeminência, como Júlio Delgado (PV), chamam a atenção pelo fato de que não se reelegeram. Mas no caso de Júlio, particularmente, não acho que ocorreu um grande deslize que leve ele, digamos, a ser reprovado. Acredito que foi uma renovação muito mais em função do aparecimento de novas lideranças. Delegada Ione Barbosa (Avante) e Ana Pimentel (PT) são bons exemplos disso. A Ana, por exemplo, vai para sua primeira disputa para um cargo, ou seja, há um trabalho pretérito na Secretaria Municipal de Saúde de Juiz de fora, inclusive, tornou ela em evidência, por conta do enfrentamento da pandemia, foram meses difíceis. Para o seu primeiro cargo, ela já teve uma votação muito interessante. Conseguiu manter o legado eleitoral da prefeita Margarida Salomão, uma vez que ela ocupou esse mesmo número e foi muito apoiada. Do ponto de vista da cidade, mantemos quantitativamente o mesmo número de representantes, e seguimos, de alguma forma com expressividade, tanto da Assembleia Legislativa de Minas, quanto da Câmara Federal.
ACESSA.COM: Essa mudança nos quadros, expressa uma expectativa de renovação no eleitorado?
DIOGO TOURINO: Eu penso que não foi renovação. O eleitorado brasileiro, via de regra, é conservador. Temos sempre pouca renovação no cenário do legislativo. A eleição de 2018 foi atípica, porque tivemos muita renovação. É menos um desejo de renovação e mais o surgimento de novos quadros que começam, inclusive, nesse cenário de comunicação diferente. A despeito de máquinas partidárias, estabeleceram uma comunicação direta do eleitorado, são todos dados muito novos e eu penso que Juiz de Fora não está descolado do país como um todo. O caso do Nikolas Ferreira (PL) que teve uma eleição assustadora. Nikolas é um jovem bolsonarista, que tem tudo a ver com essa nova configuração como um todo.
ACESSA.COM: Lula (PT) e Zema (Novo) lideraram a votação em Minas e em Juiz de Fora. Como é possível entender que dois programas tão distintos tenham sido os mais votados?
DIOGO TOURINO: Essa esquisitice aos olhos dos eleitores é muito normal, vem da ideia de que disputas nacionais, não necessariamente, guardam alguma coerência nos estados e municípios. Quando nós vemos os municípios, fica mais esquisito ainda. Isso é muito usual. De fato, o candidato Zema foi do azarão ao favorito. Isso, talvez, se deva ao fato de que ele se normalizou. Ou seja, se “normalizou” pela política. Quando há alguns anos atrás assume com esse status de CEO do serviço público, linguagem do mundo privado de que contrata, de que demite, de que vai arrumar uma empresa de RG para selecionar o secretariado, isso se dissolveu muito rápido. Logo ele entendeu que a máquina pública envolve acordos, concessões, conversas, e ele foi sendo normalizado pela política. Acho que o discurso dele foi mudando e, não por acaso, ele sai de um isolado Partido Novo, para uma eleição em que teve uma gama de partidos muito maior do lado dele. Para a reeleição é possível destacar a capacidade que ele teve de, nesse estado complexo que é Minas Gerais, onde a gente tem uma distinção muito grande na região metropolitana, que é um colégio eleitoral grande, eu entendo, mas um estado com uma enormidade de municípios assustadora. Ele foi capaz de estabelecer essa costura, acho assim, ele fez a campanha dele e pouco falou de Bolsonaro no primeiro turno. Isso ficou muito evidente. O fato de Carlos Viana (PL) ser o candidato oficial do Bolsonaro, inclusive, pelo mesmo partido, facilitou a vida dele. E o Estado, enfim, sucesso do Lula vinha sendo indicado em todas as pesquisas. A grande surpresa foi o Lula não ter tido grande sucesso no estado de São Paulo. As pesquisas apontavam uma coisa e erraram lá. Acho que elas não erraram nacionalmente. Elas erraram em São Paulo. Agora os institutos vão passar algumas horas tentando se explicar.
ACESSA.COM: Qual é o papel das abstenções nesse pleito?
DIOGO TOURINO: A abstenção é um dado constante. Se a gente faz um inventário da nova república, temos em torno de um quinto, ou seja, sempre gerou em torno de 20%. Ora um pouco menos, ora um pouco mais. Tivemos 26% ficou ligeiramente maior, ultrapassou um quarto dos votos. Em geral, temos um número constante de abstenções. Eu não consigo dizer com tranquilidade, que a abstenção é, por si só, um desânimo com a política. Tem várias coisas envolvidas, por exemplo, pessoas que atingem uma idade em que o voto é facultativo, elas podem não ir votar, mas seu título ainda não é cancelado. Só essa diferença entre o sujeito tornar o seu voto facultativo, podendo não ir votar, até que a justiça consiga regularizar esse cadastro, cria um volume. Ainda mais se considerar que a população brasileira têm envelhecido. Mas isso é apenas uma hipótese, porque não fiz levantamento de dados a respeito. Outro fator importante para essa eleição é o uso do aplicativo e-título, que as pessoas podem justificar o voto de casa. Ou seja, pode justificar de casa, houve um instrumento tecnológico que facilitou a ausência. São todos dados que, talvez, concorram. O que eu não consigo dizer é que a abstenção indica um desânimo com a eleição. Eu acho que não. Se olharmos o aumento no número de pessoas que votaram no exterior, é de 50%. Passamos o dia ontem vendo as filas em Paris, Munique, Lisboa, o número de brancos e nulos caiu bastante, o que indica eleições polarizadas em que as pessoas, forçosamente, escolhem um lado e se posicionam. Acho que são todos dados para dizer assim, não é desânimo. De fato, há uma constante, ora é maior, ora é menor. E que ele pode ser indicado por vários motivos.
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