BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Nas duas semanas que sucederam sua derrota eleitoral, o presidente Jair Bolsonaro (PL) adotou estilo totalmente diferente em relação aos quase quatro anos à frente do Palácio do Planalto.
O presidente verborrágico que não hesitava em comprar brigas e comentar os principais acontecimentos do noticiário deu lugar a um Bolsonaro recluso e de poucas palavras.
Passados 14 dias da vitória do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o atual mandatário não parabenizou o petista e evitou comentar até mesmo o relatório das Forças Armadas sobre a fiscalização do processo eleitoral.
Ativo na internet e acostumado a dar discursos em eventos e a fazer lives, Bolsonaro promoveu apenas duas declarações públicas depois da derrota. Além disso, foram apenas três publicações nas redes sociais. Ele não realizou nenhuma das suas lives semanais, que ocorriam tradicionalmente às quintas-feiras.
Pouco depois do fim do pleito, alguns aliados defenderam junto ao presidente que ele deveria reconhecer publicamente a derrota nas urnas.
O mandatário resistiu e adotou um silêncio que, segundo aliados, acabou surtido efeito positivo junto à base mais radicalizada que se reuniu em frente a quartéis para pedir uma intervenção militar.
A análise é que uma declaração em defesa do respeito ao resultado das eleições poderia desmobilizar seus apoiadores que participam dos atos antidemocráticos nas proximidades de edifícios militares.
Aliados do presidente entendem que essas manifestações são importantes para enfraquecer o candidato vitorioso, reforçar a polarização e manter Bolsonaro como o principal líder da direita no Brasil --e consequentemente da futura oposição ao PT.
Em sinal de que não discorda dos protestos, no primeiro pronunciamento após o pleito, o presidente disse que as mobilizações são fruto de "indignação" e "sentimento de injustiça".
Pouco depois, divulgou um vídeo para pedir que seus apoiadores desbloqueassem vias obstruídas em diversos estados. Mais uma vez, deixou de comentar o teor antidemocrático das manifestações e disse que era contrário apenas ao bloqueio das estradas.
No período após a derrota, Bolsonaro também manteve uma agenda oficial reduzida de compromissos. Ele se isolou no Palácio da Alvorada. No local, o chefe do Executivo tem recebido poucos aliados mais próximos.
Ele foi em apenas duas oportunidades ao Palácio do Planalto desde a derrota eleitoral.
A primeira foi no dia seguinte à eleição, quando teve encontro com Paulo Guedes (Economia) e outros ministros.
Em 3 de novembro, teve uma passagem relâmpago pelo Planalto: foi cumprimentar o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), que estava no local para a primeira reunião da transição com o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira.
Na ocasião, segundo relatos obtidos pela Folha, pediu a Alckmin que ele "livrasse o Brasil do comunismo".
Aliados dão ainda uma explicação adicional para a reclusão do mandatário. Segundo pessoas próximas, ele se recupera de um quadro de infecção bacteriana nas pernas. O Planalto não comentou o estado de saúde do mandatário.
Bolsonaro foi econômico nas palavras até nas publicações nas redes sociais --campo que chegou a ser dominado por ele e aliados. Em uma rara publicação, o presidente compartilhou apenas uma foto em que aparece no lançamento de sua candidatura à reeleição, no Rio de Janeiro em julho.
A imagem mostra apoiadores vestidos de verde e amarelo e uma bandeira do Brasil ao fundo.
O chefe do Executivo tampouco comentou o relatório das Forças Armadas sobre fiscalização da votação.
Bolsonaro sempre levantou suspeitas sem provas e mentiras contra as urnas eletrônicas. Ele chegou a condicionar a aceitação do resultado eleitoral às conclusões das Forças Armadas sobre a conferência do sistema de votação.
Num discurso logo após o primeiro turno, Bolsonaro disse que só iria se pronunciar se acreditava no resultado do pleito após apresentação de relatório dos militares.
Na reta final do segundo turno, em entrevista a um podcast americano, afirmou que, segundo os militares, era "impossível dar um selo de credibilidade" ao sistema eletrônico de votação.
O relatório foi divulgado na quarta-feira (9).
O fato de a fiscalização dos militares não não encontrar fraude ganhou destaque nos principais meios de comunicação do país. Na manhã de quinta-feira (10), o ministério da Defesa publicou nova nota para dizer que "as Forças Armadas não excluem a possibilidade de fraude ou inconsistências nas urnas eletrônicas".
Mesmo após o novo texto, que manteve aceso o discurso golpista contra urnas ecoado por apoiadores do presidente, Bolsonaro permaneceu.
Apesar do silêncio, o mandatário articulou com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, uma estrutura para tentar se firmar como principal nome da direita no país. Na última semana, o cacique do partido de Bolsonaro anunciou que a sigla será oposição ao governo do PT.
Ele também confirmou que Bolsonaro, a partir do momento que deixar a Presidência, terá um cargo no partido. A previsão é que o chefe do Executivo seja presidente de honra do PL. Valdemar também afirmou que Bolsonaro deve ser candidato a presidente em 2026.
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