BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O governo de transição decidiu esperar o retorno do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de viagem ao exterior para definir a composição do grupo técnico responsável pela área da Defesa --setor fortemente associado ao bolsonarismo e que tem resistência ao PT.
Coordenador dos grupos técnicos da transição, o ex-ministro Aloizio Mercadante (PT) reconheceu nesta quinta-feira (17) haver um "problema institucional" relacionado com as Forças Armadas.
Apesar disso, ele negou que haja atraso e dificuldades para definir a composição do colegiado responsável por organizar a transição em temas da Defesa.
Mercadante disse que a definição dos nomes acontecerá após o retorno de Lula, na próxima semana. O presidente eleito participou de reunião global sobre clima da ONU, a COP27, no Egito, e terá ainda agenda em Portugal.
Os grupos de trabalho de Defesa e Inteligência são os únicos que não tiveram decisão sobre os seus coordenadores e demais membros.
O governo de transição já anunciou 30 colegiados técnicos e mais de 300 pessoas.
"Do GT [grupo técnico] de Defesa, eu acho que vamos ter uma excelente composição, mas vamos só bater o martelo com o presidente [Lula]. Como o presidente viajou e teve uma responsabilidade, uma agenda muito pesada, com muita coisa acontecendo e uma repercussão extraordinária da fala dele, vamos aguardar. Não faz diferença nenhuma", afirmou Mercadante em entrevista a jornalistas, no Centro Cultural Banco do Brasil em Brasília, sede da transição.
"É uma instituição [Forças Armadas] secular, organizada, diagnóstica, não tem maiores preocupações em relação a essa agenda. Pode ter algumas questões pontuais. Tem um problema institucional, o lugar das Forças Armadas, a relação com a Constituição, mas isso não é propriamente um tema do grupo de trabalho. Eu acho que não tem nenhuma dificuldade e nós faremos uma boa solução", afirmou o ex-ministro.
"Eu acho que o tema basicamente é esse, é um problema mesmo da composição, ter uma composição adequada e poder ter resultados naquilo que a gente espera para a área da Defesa".
O presidente Jair Bolsonaro (PL) explorou durante todo seu governo da proximidade com as Forças Armadas, por ser capitão da reserva, e transformou sua relação com os militares em ativo político. Durante a campanha eleitoral, ele era chamado de "capitão do povo" (mesmo título do seu jingle).
Ele foi criticado ao longo de seu mandato por politizar as Forças Armadas e arrastá-las para crises institucionais. Trocou três vezes o cargo de ministro da Defesa e os comandantes de Forças.
Segundo a reportagem apurou, a equipe do novo governo decidiu aguardar do retorno do presidente eleito para bater o martelo a pedido do vice eleito e coordenador-geral da transição, Geraldo Alckmin (PSB).
A avaliação é que os temas são sensíveis, e não há nem mesmo definição sobre como será o grupo. Interlocutores estudam três possibilidades: uma composição formada inteiramente por civis, por integrantes da reserva ou misto.
Para haver a participação de membros da ativa no grupo, é necessário que se faça uma requisição formal às Forças Armadas.
Mesmo diante da indefinição sobre nomes, aliados de Lula já foram demandados a dialogar com integrantes das Forças Armadas. Entre eles estão os ex-ministros Nelson Jobim, Celso Amorim, Jaques Wagner e a deputada Perpétua Almeida (PC do B-AC), que foi secretária da pasta em gestão petista.
Mesmo que esses nomes atuem em contatos informais, é possível que nem todos integrem o grupo de transição. Jobim, por exemplo, tem demonstrado a interlocutores o interesse de permanecer nos bastidores.
O general Gonçalves Dias, que acompanha Lula desde os tempos de presidência, também é importante conselheiro do petista para os temas da Defesa e é citado como um dos nomes para compor um dos grupos, provavelmente o de Inteligência.
Aliados de Lula ouviram em conversas com militares nomes que seriam bem-recebidos pelas Forças para chefiar a Defesa, entre eles Aldo Rebelo, Nelson Jobim e Aloizio Mercadante. Este último vem de uma família de militares e tem dialogado com integrantes das Forças.
Alckmin também é elencado como um bom interlocutor dos fardados, que dizem que seria um prestígio ter o vice-presidente como ministro. O próprio vice eleito, porém, já indicou a Lula não querer assumir nenhuma pasta no governo, preferindo atuar como um copiloto. A expectativa é que o petista viaje muito ao exterior durante o mandato e para isso Alckmin precisaria ser acionado para substituí-lo no cargo.
Nos encontros com petistas, militares criticaram uma outra opção considerada por aliados de Lula: nomear o ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal), para chefiar a pasta. A avaliação é que houve conflitos entre Judiciário e Forças Armadas no governo Bolsonaro, e nomear um integrante da corte para o ministério seria visto como uma forma de tutelá-los.
Esses interlocutores petistas ouviram resistências sobre a possibilidade de escolha de Celso Amorim, que chefiou a Defesa no governo Dilma Rousseff.
A expectativa é que o presidente eleito só tome uma decisão no início de dezembro. Nesse cenário, há desejo por parte dos atores que o aconselham para essa área que ocorra uma definição conjunta do ministro e também dos comandantes das três Forças.
Nesta quinta, o governo Bolsonaro indicou integrantes da sua gestão para ajudar os grupos temáticos na transição. Na Defesa, foram escalados os generais Mario Luiz Jathahy Fonseca e Sergio José Pereira.
Os dois são próximos ao vice na chapa de Bolsonaro, Walter Braga Netto, e integraram sua equipe durante a intervenção no Rio de Janeiro.
Pereira atuou também na Casa Civil de Braga Netto, e hoje é secretário-geral da Defesa. Fonseca é seu assessor no ministério.
Segundo aliados de Braga Netto, as escolhas foram do próprio titular da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira.
Após a derrota de Bolsonaro, os quartéis do Exército se tornaram local de peregrinação e de manifestações de militantes bolsonaristas, com pedidos de intervenção federal.
O presidente usou as Forças Armadas em sua estratégia para questionar a segurança e a eficiência das urnas eletrônicas. Os militares foram convidados pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para integrar a comissão de transparência eleitoral e também atuaram como fiscais das eleições --uma participação constantemente explorada por Bolsonaro na sua estratégia de desacreditar o sistema eleitoral do Brasil.
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