MANAUS, AM (FOLHAPRESS) - Líderes do povo xavante dizem que José Acácio Serere Xavante, preso por participação em atos antidemocráticos em Brasília, não representa os indígenas da etnia nem as reivindicações que defendem.
Segundo esses líderes, Serere foi financiado por fazendeiros e empresários de Mato Grosso e tratado equivocadamente como cacique por bolsonaristas, em evidente má-fé no uso da imagem dos xavantes.
A reportagem não conseguiu contato com representantes de Serere.
O indígena foi preso temporariamente por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), a pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República).
A prisão desencadeou atos de vandalismo por parte de bolsonaristas em Brasília, com carros e ônibus incendiados e depredação de patrimônio público, na noite de segunda (12). Nesta terça, o Supremo manteve a prisão temporária de dez dias imposta a Serere, após audiência de custódia. Ele permanece detido no Complexo Penitenciário da Papuda, no Distrito Federal.
O indígena vinha se colocando como um líder nos atos antidemocráticos na capital do país, com ataques ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e a Moraes e ofensiva contra o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ele é apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL), derrotado nas urnas em 30 de outubro.
A tentativa de invasão ao prédio da Polícia Federal, no mesmo dia da diplomação de Lula no TSE, ocorreu na sequência da prisão de Serere pela PF. Entre os praticantes do vandalismo estão acampados da área do QG do Exército, segundo forças policiais do Distrito Federal.
"Nossa indignação é com os financiadores da participação de Serere nesses atos", afirma Lúcio Xavante, presidente interino da Coordenação Geral Indígena Xavante. "Os financiadores são fazendeiros e empresários, que colocam o indígena na frente para representar essa insatisfação com o resultado das urnas."
Em Mato Grosso, há mais de 23 mil indígenas xavantes, segundo a coordenação. Eles estão em nove terras indígenas, em áreas próximas a 14 cidades do estado.
Serere é da terra indígena Parabubure, onde vivem 3.800 indígenas. O município mais próximo é Campinápolis, no leste do estado, a 550 km da capital Cuiabá.
O indígena não é cacique no território, segundo líderes ouvidos pela reportagem. Ele é de uma família de caciques, como Celestino, tratado como uma das lideranças mais importantes em defesa dos interesses do povo xavante.
Em 2020, o indígena foi candidato a prefeito de Campinápolis pelo Patriota. O nome usado na urna foi Pastor Serere Xavante --ele foi derrotado.
Serere já atuou na coordenação do movimento xavante, mas se distanciou da organização a partir do momento em que intensificou sua atuação no bolsonarismo, segundo Lúcio Xavante. Esse distanciamento coincidiu com a candidatura de Serere à prefeitura, diz Lúcio.
"Essa participação dele nesses atos não tem nada a ver com nossa luta, que é bem diferente de invasão de terras indígenas, de ameaças ao nosso território e da agenda anti-indígena no Congresso para beneficiar latifundiários", afirma.
Entre os xavantes, os bolsonaristas são uma minoria, diz Lúcio. É o que diz também Rafael Weree, xavante que coordena o movimento indígena no PDT.
Rafael estima que, dos mais de 23 mil xavantes, cerca de 1.000 apoiam Bolsonaro. "99% dos xavantes querem a paz e respeitam o resultado da eleição", afirma.
Para Rafael, Serere "sabia o que estava fazendo". "Ele não é criança, não é adolescente. Então, eu espero que agora essas pessoas do agronegócio, que financiam essas manifestações, o ajudem de alguma maneira."
O extremismo de Serere recebeu constante oposição do povo xavante, e ele foi aconselhado a moderar, conforme Rafael.
"Ele é um irmão xavante nosso, a gente fica preocupado, mas ele que se colocou no extremismo na política, ao contrário da própria orientação dos xavantes. E nossa orientação sempre foi respeitar a Justiça e o resultado do sistema eleitoral brasileiro."
O apoio de uma minoria a Bolsonaro se deve ao arrendamento de terras a fazendeiros e um desejo por "dinheiro fácil", afirma Lúcio Xavante. Esses bolsonaristas estariam concentrados em duas terras indígenas, a Parabubure, de Serere, e a Sangradouro.
"Esse episódio vai fazer com que os brasileiros pensem que os xavantes apoiam Bolsonaro e esses atos que estão ocorrendo. E nós não apoiamos", diz.
A posição vem sendo externada por outros líderes xavantes em vídeos divulgados em redes sociais e pelo WhatsApp desde o momento da prisão de Serere.
Os xavantes têm o hábito de se dividir por grupos etários, em oito grupos, com afinidades e interação dentro de cada camada, explica Lúcio. Ele e Serere são do mesmo grupo.
"Estamos envergonhados. Ele quebrou o princípio da verdade que é uma característica do nosso grupo", diz. "Ele tinha conhecimento sobre o que fazia e sobre ser preso. Mas entendo que ele foi usado por quem é fanático e vive de ódio."
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