BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Um dia depois de conduzir a troca de comando do Exército, o ministro da Defesa, José Múcio, afirmou neste domingo (22) à Folha de S.Paulo que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não abre mão da punição dos responsáveis pela invasão e depredação das sedes dos Três Poderes, ocorrida há duas semanas, no dia 8.
Segundo Múcio, não há como impedir as investigações. "Lula não vai perdoar ataques golpistas. Investigações vão até o fim."
Ao falar dos motivos que levaram à demissão do ex-comandante do Exército, Júlio César de Arruda, Múcio afirmou ter havido quebra de confiança.
"Acabou o clima de confiança e resolvemos mudar o comando", justifica. Foi escolhido para o posto do atual comandante militar do Sudeste (responsável por São Paulo), general Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva.
O general não estaria conseguindo derrubar resistências internas às investigações sobre participação de militares e parentes nos atos antidemocráticos que culminaram com o ataque ao Congresso, Palácio do Planalto e STF (Supremo Tribunal Federal).
Aliados de Lula afirmam que os ataques às sedes dos Três Poderes ofereceram-lhe a oportunidade -- talvez única-- de reforçar a autoridade sobre as Forças Armadas em meio a um clima de desconfiança e hostilidade mútuas.
O presidente, relatam, não gostaria de viajar à Argentina, neste domingo (22), sem que tivesse efetivado a troca do comando do Exército.
Para esses interlocutores, a omissão de militares diante das depredações de 8 de janeiro e as investigações contra o ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), o tenente-coronel Mauro Cid, constrangem os bolsonaristas dentro dos quartéis, criando o ambiente propício para que Lula tente debelar a oposição no generalato.
A relutância do então comandante do Exército em reverter a nomeação do ex-ajudante de ordens Bolsonaro para o comando de um batalhão, mesmo sob investigação, permitiu que Lula revisse a escolha do próprio general.
Em dezembro de 2022, o tenente-coronel Mauro Cesar Barbosa Cid -ajudante de ordens de Bolsonaro- foi designado para o comando de um Batalhão em Goiânia.
Mas, como revelado pela Folha de S.Paulo em setembro, a Polícia Federal encontrou no telefone dele mensagens que levantaram suspeitas sobre transações financeiras feitas no gabinete da Presidência.
Na sexta-feira (20), quando o portal Metrópoles também noticiou detalhes da investigação, Lula pediu que Cid fosse exonerado. Segundo fontes do Palácio, Arruda se recusou a seguir a orientação --sendo essa a gota d'água para sua demissão.
Na manhã de sábado (21), por volta das 6h40m, Lula telefonou para Múcio solicitando que não fosse concretizada a nomeação de Cid para o comando de um batalhão vizinho a Brasília.
Após ouvir reiteradas queixas de Lula, Múcio disse, segundo relatos, que colocaria um ponto final no problema. O ministro da Defesa telefonou, então, para Arruda para informá-lo da exoneração. Ainda segundo esses relatos, o general avisou que convocaria o Estado-Maior, o que ocorreu horas depois.
A convocação do generalato foi recebida por assessores palacianos como uma tentativa de Arruda de buscar apoio entre seus pares, o que não aconteceu.
Na opinião do ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Wellington Dias, a permanência de Arruda poderia representar um "recado confuso" para a tropa e para a sociedade civil.
Ainda segundo o ministro, existiria o risco de o problema persistir caso Lula não tomasse uma medida agora. O ministro afirma que Lula fez a opção por Arruda "confiando no que se espera das Forças Armadas" e não pode ter essa dessintonia. "O presidente não pode perder a autoridade, não vai perder a prerrogativa conquistada pelo voto", disse o ministro.
E justificou: "Se já não é fácil quando está todo mundo na mesma direção, apaixonado, imagine quando tem um puxando para um lado e um para o outro".
Na noite deste sábado, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), afirmou nas redes que Lula atuou com firmeza para garantir a Constituição e as prerrogativas de comandante das Forças Armadas. "O comportamento do ex-comandante do Exército caracterizou insubordinação inadmissível perante ameaças à democracia e de partidarização da Força", publicou.
O presidente do PSB, Carlos Siqueira, disse que a substituição foi necessária e acertada. Para Siqueira, a escolha do novo comandante, general Tomás Miguel Paiva, igualmente correta, "recaiu sobre um excelente quadro do nosso Exército, que tem a compreensão claríssima do papel de Estado das nossas Forças Armadas".
Siqueira reconhece a possibilidade de impacto na relação com as Forças Armadas. "Mas não havia outra opção uma vez que a exigência da disciplina é indispensável no exercício do comando das Forças e da vida militar. Nunca é demais lembrar que o Presidente da República é o Comandante em Chefe das Forças Armadas", ressalta.
Segundo o presidente do PSB, "a disciplina é a pedra angular do bom funcionamento das Forças".
O presidente do União Brasil, Luciano Bivar, diz que, em começo de governos, ajustes são absolutamente normais, "uma vez que o presidente da República, por preceitos constitucionais, é o comandante em chefe das Forças Armadas, e sobre ele recai a responsabilidade de qualquer de seus auxiliares", indo do Ministério da Pesca até o ministro da Defesa".
Bivar lembra que essas mudanças são feitas em consonância com o titular da pasta. Para aliados de Lula, essa substituição dá ao ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, a chance de se reabilitar dentro do governo, após ter o desempenho criticado, especialmente em resposta às ameaças golpistas que se concretizaram no domingo (8).
Múcio foi escalado por Lula para anunciar oficialmente a troca de comando do Exército. O chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Marcos Edson Gonçalves Dias, ficou alheio à decisão.
Hoje subordinada ao GSI, a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) poderá ser abarcada pela Casa Civil, em um sinal de enfraquecimento de G. Dias (como é chamado), após a invasão do Palácio do Planalto.
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