SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O Brasil precisa se ouvir e se ver para se conhecer. Com essa premissa, a Folha, em parceria com a Fundação Ford, começa a publicar uma série de reportagens que vão contar histórias de remanescentes de quilombos, comunidades que estão no centro da formação cultural e social do país.

Ao longo de um ano, as reportagens serão publicadas semanalmente no projeto especial Quilombos do Brasil. Os textos pretendem retratar temas variados nos campos da política, na disputa por território, nos impactos na economia e na cultura, além de mostrar as influências religiosas e gastronômicas.

"O apoio a esse projeto é o reconhecimento da importância da luta histórica pelos direitos das populações remanescentes de escravos e da sua contribuição para o desenvolvimento sustentável do Brasil", explica o historiador Atila Roque, diretor da Fundação Ford, no Brasil, cuja sede fica no Rio de Janeiro.

Surgidos no período colonial, os quilombos são um símbolo de resistência da população negra contra os horrores da escravidão. As comunidades emergiram com a fuga de pessoas escravizadas. Os primeiros registros de quilombos remontam à década de 1570. Mesmo após a abolição, no fim do século 19, descendentes dos quilombolas deram sequência à formação dos agrupamentos em diferentes partes do país.

"O objetivo dessa parceria é lançar luz sobre a população quilombola, que ainda enfrenta preconceito e falta de reconhecimento", diz Roberto de Oliveira, editor de Projetos Especiais & Parcerias da Folha. "É uma faceta do povo brasileiro ainda desconhecida pelos próprios brasileiros."

Oliveira afirma que "as comunidades remanescentes, urbanas e rurais, carecem de políticas públicas para reduzir a desigualdade social gerada por séculos de escravidão". Portanto, segue ele, será um desafio para a Folha retratar esse grupo tão diverso. A cobertura será norteada pelos princípios editoriais do jornal, com apartidarismo, espírito crítico e pluralidade.

Hoje, calcula-se que existam ao menos 6.000 comunidades quilombolas, em 25 estados. A maioria delas, porém, ainda não tem seu direito garantido à terra, como defende o artigo 68 da Constituição. Apenas 5% das comunidades quilombolas brasileiras possuem o título de propriedade das áreas que ocupam. Diante desse cenário, há constantes casos de especulação imobiliária, além de ameaças e tentativas de despejo, segundo lideranças.

De acordo com Atila Roque, as reivindicações quilombolas devem ter mais destaque agora, quando políticas de enfrentamento às mudanças climáticas voltam a ganhar a prioridade nas ações governamentais aqui e lá fora. "Olhar para os direitos quilombolas e para seus modos coletivos de vida produz o encontro necessário entre justiça ambiental, racial e climática", diz.

O historiador avalia que é importante ampliar a visibilidade e aprender com o conhecimento acumulado das comunidades quilombolas. Afirma ainda que a sociedade civil e o Estado também devem assumir responsabilidade na promoção de um desenvolvimento capaz de superar as marcas da desigualdade e do racismo estrutural.

Boa parte dos territórios quilombolas possui papel ambiental importante nessa equação, justamente porque muitos deles estão em áreas com florestas, rios e mananciais --inclusive na Amazônia-- e também pela maneira como os próprios quilombolas se relacionam com a natureza.

Com estreia nesta terça-feira (21), Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial, Quilombos do Brasil irá tratar de comunidades de todas as regiões do país. As reportagens serão publicadas nas plataformas do jornal, tanto no impresso quanto no digital, assim como em conteúdos das redes sociais e também em vídeos produzidos pela TV Folha.

A série se soma a um conjunto de ações desenvolvidas pela Folha que visa o combate à desinformação e ao racismo. Entre as iniciativas estão o programa de treinamento em jornalismo voltado para profissionais negros (será a terceira turma neste ano), a criação da editoria de Diversidade e a formação de um comitê de Inclusão e Equidade.


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