O ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse, nesta quinta-feira (20), que o governo apoiará uma possível comissão no Congresso para investigar os atos golpistas de 8 de janeiro, em Brasília. Na ocasião, os prédios do Congresso Nacional, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Palácio do Planalto foram invadidos e depredados por vândalos.

“Vamos enfrentar este debate político que está sendo criado por aqueles que passaram pano para os atentados terroristas do dia 8 de janeiro. Ao mesmo tempo, vamos continuar apoiando as ações da Polícia Federal e do Judiciário na apuração de evidências, provas, para identificar os culpados e condenar aqueles que sejam responsáveis pelos atos”, disse, destacando que o governo apoia a total investigação do envolvimento de agentes públicos nos atos.

Na quarta-feira (19), Padilha se reuniu com os líderes do Governo, senadores Jacques Wagner e Randolfe Rodrigues e o deputado José Guimarães, e orientou que, em diálogo com os demais líderes, indiquem membros da base aliada para participarem da investigação do Parlamento.

Na próxima quarta-feira (26), o Congresso Nacional faz sua primeira sessão do ano, e há a expectativa de ser lido o requerimento para instalação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Atos Antidemocráticos.

A decisão do governo acontece após a divulgação de imagens, nesta quarta-feira, pela imprensa, que mostram o general Gonçalves Dias, então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República, e outros funcionários da pasta, no interior do Palácio do Planalto, interagindo com os vândalos, no dia 8 de janeiro. Ainda nesta quarta-feira, Dias pediu demissão do cargo, aceita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Supremo Tribunal Federal é destruído em ato terrorista no dia 8 de janeiro - Valter Campanato/Agência Brasil

O secretário executivo do Ministério da Justiça, Ricardo Cappelli, será o chefe interino do GSI.

Padilha disse que o vazamento das imagens, que, segundo ele, foram editadas, criam uma nova situação política.

“Na nossa opinião, isso cria uma nova situação política, faz com que aqueles que passaram pano para os atos terroristas do dia 8 de janeiro e que tentam criar uma teoria absurda da conspiração, um verdadeiro terraplanismo da teoria que tentam construir, de que as vítimas daqueles atos terroristas que foi o Congresso Nacional, que foi o Supremo Tribunal Federal, que foi aqui o Palácio do Planalto, foi a democracia, que foi o resultado eleitoral, de que aquelas vítimas têm qualquer responsabilidade sobre a atuação dos terroristas no dia 8 de janeiro”, disse.

Investigações

Manifestantes invadem Congresso, STF e Palácio do Planalto - Marcelo Camargo/Agência Brasil

Na quarta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que, no Brasil, não tem espaço para nazistas e fascistas. “Cada pessoa que participou do golpe vai ser julgada, vai ter direito à presunção de inocência, que eu não tive, mas nós não deixaremos de julgar cada um golpista, porque nesse país não existe espaço para nazista, fascista, e para quem não gosta de democracia”, afirmou.

Em nota, o GSI esclareceu que as imagens mostram a atuação dos agentes de segurança para evacuar o quarto e o terceiro pisos do Palácio do Planalto, concentrando os manifestantes no segundo andar, onde, após a chegada de reforços do pelotão de choque da Polícia Militar do Distrito Federal, os golpistas foram presos. Segundo a pasta, se condutas irregulares forem comprovadas, os respectivos autores serão responsabilizados.

Até então, a criação da CPMI estava gerando divergência entre parlamentares governistas, que argumentam que os crimes estão sob investigação da Polícia Federal e não é necessária uma comissão no Parlamento para esse fim, e oposicionistas, que querem apurar possíveis omissões da ação do governo federal no episódio.

Para o ministro Alexandre Padilha, a comissão vai apontar a tentativa de golpe que foram os atos do dia 8 de janeiro, e será uma pá de cal em quem tenta criar narrativas conspiratórias.

Segundo ele, o enfrentamento político de uma CPMI também não deve atrapalhar as votações de pautas prioritárias do governo no Congresso.

“Estou absolutamente convencido disso, que a possibilidade da instalação da CPMI, além de ser uma pá de cal nessa teoria conspiratória, em nenhum momento irá interferir no calendário, que já vem sendo tocado, de aprovação do conteúdo das 12 medidas provisórias que governo encaminhou neste primeiro semestre”, disse.

“O marco fiscal [e a reforma tributária] também está absolutamente mantido, tanto o presidente da Câmara quanto o presidente do Senado já sinalizaram publicamente que esse calendário será tocado o mais rápido possível”, acrescentou.

GSI

Sobre o envolvimento do ministro Gonçalves Dias nos atos terroristas, Padilha disse que ele tem uma história como homem público, mas que todas as responsabilidades serão investigadas pela Polícia Federal e pelo Judiciário.

As imagens das câmeras de segurança que foram entregues pela Presidência à PF estavam sob sigilo e, segundo Padilha, “o governo quer saber, e a Polícia Federal irá descobrir, se teve alguém que omitiu imagens, que não mostrou imagens para as autoridades quando solicitados”.

“Vídeo vazado com edição não é suficiente para destruir a biografia de uma pessoa, mas tem que ser apurado não só sobre o Gonçalves Dias, ex-ministro do GSI, mas todos aqueles que estavam naqueles vídeos. Inclusive, me estranha muito alguns agentes militares estarem com a imagem borrada no seu rosto para não ser reconhecido e o ex-ministro não ter o mesmo tratamento nesse vazamento”, argumentou.

Ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional Gonçalves Dias - José Cruz/Agência Brasil

Nesta quinta-feira, o ministro do STF Alexandre de Moraes, responsável pelos inquéritos no âmbito do Judiciário, deu 48 horas para a PF ouvir Gonçalves Dias sobre as imagens. Para Alexandre Padilha, a atitude de Moraes está corretíssima. “É só mais uma demonstração do que as instituições estão funcionando, elas que têm responsabilidade e nós queremos apuração até o final”, afirmou.

“Desde o começo temos dito que o ódio, o movimento antidemocrático, a postura antidemocrática do ex-presidente [Jair Bolsonaro], de todo o movimento que foi semeado nos últimos quatro anos contaminou o conjunto de instituições, indivíduos das instituições, e que a apuração completa tem que ser feita”, reafirmou o ministro Padilha.

Julgamento no STF

O STF já formou maioria para abrir ação penal e tornar réus 100 denunciados pelos atos golpistas de 8 de janeiro. Os primeiros julgamentos relativos aos atos antidemocráticos tiveram início à 0h desta terça-feira (18) e estão previstas para durar até as 23h59 da próxima segunda-feira (24), no plenário virtual, modalidade em que os ministros depositam seus votos eletronicamente, sem deliberação presencial.

Até o momento, seis os ministros votaram pelo indiciamento dos acusados, Alexandre de Moraes, relator dos processos, Dias Toffoli, Edson Fachin, Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes. Quatro ministros ainda devem votar: André Mendonça, Nunes Marques, Rosa Weber e Luiz Fux.

Com o início do processo, haverá coleta de provas e depoimentos de testemunhas de defesa e acusação. Depois, o STF Julgará se condena ou absolve os acusados, o que não tem prazo para ocorrer.

As denúncias envolvem crimes previstos no Código Penal como associação criminosa; abolição violenta do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; ameaça; perseguição; incitação ao crime e dano qualificado. A PGR também cita o crime de deterioração de patrimônio tombado.

Uma outra sessão virtual já foi marcada pela ministra Rosa Weber, presidente do STF, para começar em 25 de abril, com mais uma leva de denunciados. A previsão é que todas as denúncias sejam apreciadas dentro de três meses.

Até o momento, a Procuradoria-Geral da República apresentou 1.390 denúncias, todas focadas nos executores e nas pessoas acusadas de incitar os atos. Segundo o STF, está sendo dada prioridade de julgamento a pessoas que continuam presas em decorrência dos atos golpistas. No total, 86 mulheres e 208 homens seguem encarcerados no sistema penitenciário do Distrito Federal.

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