SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e a relação com o agronegócio viraram motivo de tensão nas relações entre a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) e o governo Lula (PT).
Enquanto deputados federais devem usar o MST para atacar o governo, Tarcísio e sua equipe também iniciaram artilharia sobre o assunto em pronunciamentos e entrevistas, inclusive com críticas ao governo Lula pela relação com o movimento.
A investida do governo paulista contra o MST ocorreu como aceno ao agronegócio, em momento de mal-estar com o governo federal após a presença de Jair Bolsonaro (PL) na principal feira do setor, a Agrishow, e relato de "desconvite" pelo ministro da Agricultura, Carlos Fávaro.
A base de Tarcísio na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) segue na mesma linha, com proposição de leis e CPI contra o movimento.
Nesta semana, em entrevista à GloboNews, o governador disse considerar mais grave a viagem do líder do MST João Pedro Stedile à China na comitiva de Lula do que a presença de Bolsonaro na Agrishow.
As críticas ao MST não são apenas um aceno à extrema-direita como também receita fácil para agradar o agronegócio, avesso à esquerda e antipetista.
No meio político, os gestos de Tarcísio são vistos como uma tentativa de marcar território entre bolsonaristas, em momento em que o nome dele é visto como possível herdeiro de Bolsonaro, cuja inelegibilidade é dada como quase certa.
Durante a feira do agronegócio, em mesura a esse grupo do empresariado do interior, Tarcísio mandou recado para aos movimentos de trabalhadores rurais ao dizer que é intransigente "com à violação ao direito de propriedade".
"Não vamos transigir. Nós seremos duros para garantir o direito de propriedade. E aqueles que tentaram transigir no estado de São Paulo estão presos nesse momento. E quem tentar vai ter o mesmo destino, a cadeia", disse o governador no evento em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, região onde o bolsonarismo derrotou o petismo nas últimas eleições.
Bolsonaristas têm relacionado o governo federal às recentes invasões de terra do MST, que ocorreram durante o chamado abril vermelho. No mês passado, o movimento realizou diversos protestos e invadiu uma área que pertence à Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), além de sedes do Incra.
Segundo relatos feitos à reportagem, acampamentos de movimentos de trabalhadores rurais têm passado por monitoramento 24 horas por parte da polícia em São Paulo.
"A posição do governo Tarcísio na nossa opinião é a mesma da oposição federal. Ou seja, é criar assunto para movimentar a pauta [da base eleitoral] deles", diz diz Márcio Santos, membro da direção nacional do MST em São Paulo.
"O pano de fundo é a disputa de narrativa, de dois projetos antagônicos, de um lado a pauta do latifúndio, que hoje é travestido de agronegócio, e a pauta da reforma agrária e da agricultura familiar", completa.
O movimento vê a bandeira de regularização fundiária encampada pelo governo estadual como iniciativa para regularizar a grilagem e rebate a crítica de Tarcísio à ida de Stedile à China, vista como justificada pela busca por replicar no Brasil a experiência daquele país no combate à fome por meio da agricultura.
Além do monitoramento da polícia sobre o movimento, com ações preventivas que já evitaram novas ocupações, a base de Tarcísio na Alesp também promete fechar o cerco.
"Hoje, o governo faz [monitoramento] através da inteligência das secretarias. Isso é fato que houve tentativas de invasão e as forças de segurança atuaram rapidamente e barraram", diz o deputado estadual Danilo Balas (PL), autor de um requerimento de CPI estadual sobre o tema.
"Pela Assembleia Legislativa, como nós temos poder de investigação, podemos ir a campo, compartilhar dados com outras secretarias e assim evoluir nessa questão de investigação".
Ele também propôs uma lei com objetivo de penalizar integrantes do movimento. Pela proposta, eles ficariam impedidos de receber benefícios e auxílios de programas do governo estadual, além de serem vetados em concursos e cargos públicos.
Como CPIs são instaladas por ordem de protocolo e a do MST é a décima oitava, o assunto não deve eclodir antes da metade da gestão Tarcísio. Mas Balas confia na base folgada de Tarcísio na Alesp para tentar aprovação requerimento de urgência para o projeto de lei, evitando que o projeto tenha que passar individualmente por todas as comissões.
"Eu acredito 100% que tenha apoio do governador", diz Balas, citando fala de Tarcísio de que invasores seriam presos. "Isso é a imposição do estado contra crimes perpetrados em governos anteriores e agora ele [Tarcísio] tem uma linha-dura em não admitir".
Tanto bolsonaristas quanto petistas acreditam que a tensão em torno do MST e interlocução com o agro não afetará questões maiores envolvendo o governo estadual e o federal. No entanto, entre os aliados de Lula, há admissão de que a insistência no tema cria um mal-estar.
Deputado estadual petista próximo do MST, Simão Pedro diz que há tentativa por parte dos bolsonaristas de criminalizar a luta por direitos civilizatórios como acesso a terra e moradia, demonstrando insensibilidade com a população pobre. No caso de Tarcísio, ele avalia que o MST é um assunto pinçado para ajudar a sinalizar para sua base.
"O Tarcísio, com esse tipo de atitude, de discurso, ele tenta segurar com ele essa base radical bolsonarista como uma das colunas de sustentação política e com isso se mostrar confiável para o setor da extrema-direita, do grande agronegócio exportador, que tem se mostrado anti-Lula e resistido nessa posição", diz.
Enquanto Tarcísio exibe entrosamento com o agronegócio, os aliados de Lula vivem divisão.
A presidente do PT e deputada federal Gleisi Hoffmann saiu em defesa do MST e afirmou que parte do agronegócio brasileiro partidariza o setor com "prepotência e radicalismo". Por outro lado, setores do governo buscam tentar uma reaproximação com o agro e avaliam que as ações do MST prejudicam a gestão Lula.
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