BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente Lula (PT) se reuniu no Palácio do Planalto com parlamentares não petistas --que não sejam os chefes da Câmara e Senado ou o líder do governo no Congresso-- em apenas duas ocasiões em seus primeiros quatro meses e meio de gestão.
Diante das dificuldades do governo em formar uma base sólida e na esteira de derrotas no Legislativo, o chefe do Executivo tem sido cobrado a participar mais de perto da articulação política.
Mas Lula tem preferido encontrar parlamentares apenas em viagens nacionais e internacionais e cerimônias.
Além disso, há um entendimento do mandatário de que a articulação deve ficar focada no ministro Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais) e nos líderes do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), na Câmara, José Guimarães (PT-CE), e no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).
Eles aparecem em quase uma dezena de agendas, mas estiveram reunidos no Palácio da Alvorada outras vezes --sem os registros oficiais, não é possível quantificar.
A primeira agenda específica de Lula com parlamentar não petista foi em 27 de fevereiro, quando, além do governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), ele esteve com o senador Jader Barbalho (MDB-PA).
No dia seguinte, em 28 de fevereiro, Lula se reuniu com líderes e vice-líderes do seu governo, no primeiro mês do Legislativo, em que foram apresentadas as diretrizes e prioridades de seu terceiro governo. Ainda assim, dos 13 parlamentares presentes, 6 eram petistas.
Além dos ministros Padilha, Rui Costa (Casa Civil) e dos líderes, também estiveram lá os deputados Bohn Gass (PT-RS), Carlos Zarattini (PT-SP), Lindbergh Farias (PT-RJ), Reginaldo Lopes (PT-MG), Dorinaldo Malafaia (PDT-AP), Lídice da Mata (PSB-BA), Daniel Almeida (PC do B-BA), Roseana Sarney (MDB-MA), Otto Alencar Filho (PSD-BA) e Laura Carneiro (PSD-RJ).
No total dos quatro meses e meio, houve 21 agendas no Planalto com parlamentares, de acordo com levantamento feito com base no projeto Agenda Transparente do Fiquem Sabendo.
Os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), estiveram pelo menos seis e três vezes, respectivamente, no Palácio do Planalto com Lula. Mas também já foram recebidos fora da agenda pelo chefe do Executivo, como em um jantar na casa do ministro Paulo Pimenta (Secom), que contou com a presença de Lula, Padilha, Guimarães e Lira.
A postura do mandatário neste seu terceiro mandato destoa dos dois primeiros, quando reuniões, jantares e até jogos de futebol eram comuns com parlamentares. Lula ganhou fama por seu papel de conciliador na política e foi chamado de "Pelé" nesse setor pelo ministro Padilha recentemente.
Em discurso em evento no Ceará na sexta-feira (13), Lula defendeu falar com 513 deputados e 81 senadores --número total de parlamentares em cada Casa-- e disse que precisa conversar com cada deputado em cada votação diferente.
"Não é o Congresso que precisa do governo. Do jeito que está a Constituição brasileira, é o governo que precisa do Congresso. Por isso, a relação tem que ser civilizada, temos que conversar", disse.
"O PT só tem 69 deputados [na verdade, são 68]. Para votar alguma coisa importante, preciso de 257, significa que preciso conversar com pelo menos 200 deputados. Aí tenho que conversar com todo mundo. Não tenho que perguntar que partido ele é, tenho que tentar pedir pra ele votar em nós (...). Tenho que conversar com todo mundo pra gente poder aprovar as coisas", completou.
Procurada, a Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência) ressaltou que o presidente mantém diálogo com parlamentares em "agendas, reuniões e viagens" e destacou o papel de Padilha.
"O presidente Lula também tem mantido diálogo permanente com os parlamentares em diversas agendas, em reuniões, nas viagens nacionais e nas missões internacionais que contaram com a participação de deputados e senadores de diversos partidos", disse.
Na delegação de viagem à China, por exemplo, foram 7 senadores e 19 deputados - inclusive dois do PP, partido de Arthur Lira.
A Secom afirmou ainda que, além de Padilha atuar em "permanente diálogo" com os parlamentares, "todos os ministros estão orientados a manter diálogo com os representantes eleitos do Parlamento, dos governos estaduais e municipais".
Padilha, por sua vez, disse que Lula vai entrar em campo "a hora que precisar", mas destacou os encontros em viagens, com parlamentares e governadores.
"[Lula] vai se colocar à disposição. Nas suas viagens internacionais teve contato intenso com os parlamentares, com governadores, recebeu governadores, mais de uma vez, reunião com governadores de todos os partidos. Na semana passada, teve reunião com dois governadores, são governadores que não participaram [da campanha], não votaram no presidente Lula, mas têm uma relação institucional. E participa também acompanhando a atuação de seus ministros, a nossa atuação permanente", disse.
O governo enfrentou duas recentes derrotas no Congresso: o adiamento da votação do PL das Fake News e a derrubada dos decretos de Lula que traziam mudanças ao Marco do Saneamento.
A segunda, em especial, foi interpretada por auxiliares palacianos como um recado do Congresso de insatisfação com o governo. Há uma queixa permanente de parlamentares com uma suposta demora na liberação de emendas e de cargos.
Como a Folha de S.Paulo mostrou, o governo acelerou a liberação de emendas de deputados e senadores depois do revés no Congresso.
Cerca de R$ 1,15 bilhão da verba da cota individual dos parlamentares foi empenhado na última semana. No restante do ano, o valor empenhado ainda não havia atingido R$ 200 milhões.
Desse montante, o PT foi o partido mais beneficiado. Cerca de R$ 197 milhões da cota de parlamentares do partido do presidente foram empenhados.
A gestão petista ainda planeja começar a desembolsar, nas próximas semanas, recursos referentes às antigas emendas do relator, que totalizam R$ 9,85 bilhões.
Aliados do chefe do Executivo vinham defendendo que ele entrasse mais na articulação política e, inclusive, participasse de reuniões com líderes de partidos da base, que começaram com PSB e PSD.
Após reunião com ministros no Palácio da Alvorada, contudo, o clima mudou. Venceu o entendimento de que a articulação deve continuar da forma como está, em especial porque mudar agora poderia ser visto como desautorização de sua equipe.
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