CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) - A juíza Gabriela Hardt, que assumiu os processos da Operação Lava Jato com o afastamento temporário do colega Eduardo Appio, é quem dará continuidade a um requerimento da defesa do delator Alberto Youssef no qual se pede acesso integral às investigações sobre o caso do aparelho de escuta ambiental encontrado em 2014 na cela do doleiro na Polícia Federal, em Curitiba.
Na manhã desta terça-feira (23), ela já movimentou o processo, solicitando manifestação do Ministério Público Federal.
De acordo com a petição da defesa de Youssef, protocolada na 13ª Vara Federal de Curitiba em 18 de abril, o objetivo é obter prova "para avaliação da voluntariedade e espontaneidade da colaboração com eventuais reflexos na validade do acordo de colaboração" do doleiro.
"A vítima do grampo ilegal mesmo após 9 anos de ter noticiado os fatos ao Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba, em flagrante violação aos mais comezinhos princípios constitucionais, ainda não obteve acesso ao conteúdo do grampo ilegal e a conclusão das sindicâncias", escrevem os advogados de Youssef.
O doleiro foi o principal alvo da etapa inicial da Lava Jato, em 2014, e meses depois firmou um dos primeiros acordos de colaboração da operação, no qual acusou políticos e empreiteiras. Eventual quebra do acordo pode ter desdobramentos para toda a investigação.
"Youssef é o principal personagem deste enredo todo, é a caixa-preta de toda a Operação Lava Jato, não tenho a menor dúvida", afirmou Appio em entrevista à GloboNews na segunda (22), horas antes de ser afastado.
Na mesma entrevista, ele disse, falando em tese, que havendo ilegalidade no compromisso assinado, "isso afeta naturalmente todas as delações, todos os acordos e as provas produzidas".
"É a chamada teoria dos frutos da árvore envenenada. Se o tronco da árvore está envenenado, os frutos por ela produzidos vão estar envenenados", afirmou, na ocasião.
O juiz foi tirado de suas funções na noite de segunda-feira por ordem da corte especial administrativa do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região). O tribunal apura se o magistrado ligou para o filho do ex-relator da Lava Jato na corte fingindo ser outra pessoa, em abril.
Appio, antes do afastamento, já havia acolhido o pedido da defesa do Youssef, e parte das investigações da Polícia Federal sobre a escuta ilegal já está com os advogados do doleiro. Mas a defesa ainda aguarda material, como os próprios áudios captados da cela.
Na sequência, o juiz Appio retirou o sigilo do procedimento e também comunicou a Superintendência da Polícia Federal do Paraná para eventual abertura de inquérito policial "para a rigorosa e necessária apuração dos fatos denunciados por Alberto Youssef (através de seus advogados)".
"Os elementos encontrados na referida sindicância administrativa da Corregedoria da PF permitem afirmar que existem indícios concretos e documentados acerca do cometimento de graves delitos, em tese, na referida carceragem", escreveu Appio.
Crítico dos métodos das antigas autoridades da operação, como o hoje senador Sergio Moro (União Brasil-PR), Appio assumiu a titularidade da Vara Federal em fevereiro.
Poucas semanas depois, em março, o juiz determinou duas vezes a prisão do doleiro, mas os dois mandados acabaram derrubados ao final pelo juiz Marcelo Malucelli, do TRF-4, então relator da Lava Jato na segunda instância, e Youssef não ficou mais do que 24 horas preso.
Na primeira ordem, Appio afirmou que havia procedimento da Receita Federal ainda aberto, acerca de possíveis crimes tributários atribuídos ao doleiro.
Na segunda vez, o magistrado citou indícios de sonegação de imóveis por parte do delator. Na ocasião, ele mencionou relato de policiais federais que foram prender o doleiro no litoral catarinense. Os agentes haviam informado que, no endereço indicado para cumprir a ordem de prisão, crianças disseram que o doleiro era "dono de todos aqueles prédios", mas não morava lá.
A petição apresentada a Appio por Youssef recebeu em 22 de maio pedido do delegado da PF Mário Renato Castanheira Fanton, na qual protocolou uma notícia-crime sobre um "suposto esquema articulado e ilegal de produção de provas ilegais em toda operação Lava Jato até os dias de hoje".
Fanton já havia apontado irregularidades no passado e foi considerado um desafeto de autoridades que atuavam na Lava Jato.
Pouco antes das 9h30 desta terça-feira, Gabriela Hardt já movimentou o processo, ao determinar a inclusão do MPF, "intimando-o para ciência dos autos e manifestação" sobre a notícia-crime apresentada por Fanton.
A juíza é substituta na Vara Federal responsável pela Lava Jato. Ela chegou a conduzir os casos temporariamente entre 2018 e 2019, após Moro abandonar a magistratura, e se mostrou alinhada com as teses do hoje senador.
Hardt, por exemplo, expediu a sentença que condenou Lula à prisão na ação penal do sítio de Atibaia (SP), em medida que posteriormente foi anulada pelo Supremo Tribunal Federal.
Sua permanência agora à frente dos casos da operação também é temporária.
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