SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Se o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) decidir pela inelegibilidade de Jair Bolsonaro (PL), como apostam políticos e juristas, todos os olhos se voltarão para Tarcísio de Freitas (Republicanos), 47, o ex-ministro que se elegeu governador de São Paulo graças ao apoio do ex-presidente.

Como o Palácio dos Bandeirantes é visto como catapulta para o do Planalto, Tarcísio vem se esquivando de um projeto nacional em 2026 desde antes de sentar-se na cadeira e, no que depender de seus auxiliares, não deve centrar esforços para se viabilizar à Presidência mesmo se a pressão aumentar.

No círculo próximo a Bolsonaro, Tarcísio é considerado o principal sucessor, que herdaria os votos e a liderança do ex-presidente no campo da direita. É também o que indicam pesquisas com eleitores. Apesar de o governador ter se movimentado para o centro, ele mantém a confiança de Bolsonaro, o que possibilitaria a passagem do bastão.

Mas, se os bolsonaristas têm em Tarcísio uma tábua de salvação do seu futuro político, os planos de outro padrinho do governador, Gilberto Kassab (PSD), são diferentes. O secretário de Governo e outros auxiliares de Tarcísio defendem que ele permaneça oito anos no cargo, o que levaria o ex-ministro a disputar a Presidência somente em 2030 --mas ainda jovem, com 55 anos, e sem Lula no páreo direto.

Apesar de seu trânsito em Brasília, Kassab não se dedica a costurar uma candidatura nacional para Tarcísio. Pelo contrário, tem pilotado um plano de reeleição, já que a vitória é considerada garantida.

O próprio Tarcísio indica que seu caminho é a recondução, o que lhe permitiria entregar projetos de longa implantação no estado.

Esse discurso é repetido de forma coordenada por seus aliados, que até sugerem outros presidenciáveis para substituir Bolsonaro, como os governadores Romeu Zema (Novo-MG) e Ratinho Júnior (PSD-PR), além da senadora Tereza Cristina (PP-MS).

Em maio, em entrevista à CNN Brasil, Tarcísio descartou ser candidato a presidente, dizendo estar focado em fazer uma boa gestão. Ele mencionou como presidenciáveis Zema, Ratinho, Raquel Lyra (PSDB-PE) e Eduardo Leite (PSDB-RS) -mas omitiu Bolsonaro.

Além da inelegibilidade de Bolsonaro, uma candidatura presidencial de Tarcísio em 2026 no campo bolsonarista ainda dependeria de muitos fatores, como a aprovação de seu governo, a construção de uma aliança partidária e a posição de eventuais adversários no pleito.

Mas as condições atuais apontam para um governador emparedado no futuro entre o clamor da direita e seu projeto político próprio de reeleição.

A maior parte dos deputados e secretários ouvidos pela reportagem diz acreditar que, se uma avenida de oportunidade estiver aberta para Tarcísio em 2026, ele não terá como resistir a concorrer ao Planalto. Afirmam que o governador é um bom nome e deve "pensar grande".

Nesse caso, ele atenderia a um pedido de Bolsonaro nesse sentido, assim como fez em 2022, quando topou disputar o governo. Uma minoria, no entanto, torce para que ele resista ao apelo e vê Bolsonaro sem poder de influência caso esteja inelegível.

A mais de três anos da campanha de 2026, contudo, o discurso de Tarcísio serve a todos os planos. Nessa altura, mesmo quem deseja ser presidente esconde a pretensão, o que evita uma exposição política antecipada e posterga os embates com adversários.

Além disso, uma vitrine com realizações e um governo bem avaliado atendem tanto à campanha de reeleição como a uma candidatura presidencial.

Interlocutores de Tarcísio minimizam a pressão e afirmam que ele está apenas no sexto mês de gestão. Argumentam que conciliar os papéis de chefe do Executivo estadual e presidenciável demandaria um gasto de energia que o desviaria de questões como cracolândia, saúde e educação.

O vice-governador Felicio Ramuth (PSD) diz que a eventual inelegibilidade do ex-presidente não muda o foco de Tarcísio e que só o tempo dirá se ele terá uma oportunidade presidencial em 2026.

"Tarcísio segue na missão do projeto de estado, oferecendo no presente melhor prestação de serviços e apontando para o futuro com um grande legado. Nunca o vi dedicar nem sequer um minuto da agenda para um projeto político ou eleitoral", afirma.

A própria estratégia de Bolsonaro, como mostrou a Folha de S.Paulo, vai ao encontro da tática banho-maria de Tarcísio.

Para evitar perder relevância política e eleitoral, o ex-presidente deve evitar construir um sucessor desde já caso se torne inelegível. Sua defesa buscará todos os recursos judiciais possíveis para reverter a eventual decisão do TSE até 2026.

O estilo de Tarcísio, menos político do que gestor, também esfria as pretensões eleitorais. O governador se dedica a concessões e obras, como fazia no Ministério da Infraestrutura, e deixa a atuação política em segundo plano, o que lhe traz desgaste na Assembleia Legislativa.

Nos corredores do Bandeirantes, dois ex-governadores são mencionados como exemplo de que, na política, pular etapas da carreira para tentar ser presidente pode dar errado -José Serra (PSDB) e João Doria (ex-PSDB). Ambos deixaram a prefeitura antes do fim do mandato e foram eleitos para o governo, mas não para o Planalto (Doria nem chegou a concorrer).

Políticos do time de Kassab dizem que os problemas de São Paulo exigem soluções de longo prazo e que há um planejamento de oito anos traçado. Seria uma pena, afirmam, que uma candidatura presidencial atropelasse a maturação de sua imagem como administrador.

Para eles, é muito importante que Tarcísio tenha uma marca enquanto político --a de realizador. Por isso, esse tempo para efetivar suas entregas é necessário. Uma vez reconhecido pela população dessa forma, Tarcísio dependeria menos de Bolsonaro para chegar ao Planalto depois.

Integrantes do governo consideram Tarcísio um nome de centro-direita, ou seja, com uma amplitude maior de eleitores do que Bolsonaro, que é mais radical. Nesse sentido, o descolamento entre padrinho e afilhado é visto como um ativo eleitoral.

Já os bolsonaristas pensam o contrário e criticam Tarcísio por não defender a pauta conservadora e não atender aliados.

Deputados afirmam que têm sido condescendentes até agora, mas que o grande desafio do governador é manter a base que o elegeu --ou ele pode não ser mais considerado herdeiro de Bolsonaro.

O embate entre a extrema direita e Tarcísio acumula uma série de episódios desde a eleição, começando pela manutenção das câmeras nas fardas de policiais até o recente financiamento público destinado às paradas LGBT+.

Segundo aliados de Bolsonaro, por enquanto, a alta popularidade de Tarcísio lhe dá margem para independência, mas ele não poderia esticar a corda a ponto de arrebentá-la --para ser candidato a presidente, teria que escolher um lado de atuação.


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