BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O comandante do Exército, general Tomás Paiva, decidiu esperar os desdobramentos judiciais antes de tomar medidas administrativas contra os militares da ativa citados em relatório da Polícia Federal sobre os celulares do tenente-coronel Mauro Cid.

A avaliação, segundo interlocutores de Tomás ouvidos pela reportagem, é a de que não é possível somente com o relatório analisar a conduta de cada militar. Como resultado, a decisão interna é cooperar com as investigações e agir somente após a repercussão dos casos na Justiça.

Generais afirmam, porém, que os militares investigados deverão ter mais dificuldade para progredir na carreira e chegar ao generalato, já que o caso se tornou um constrangimento para a cúpula militar.

Procurado pela reportagem, o Exército afirma que ainda não foi "oficiado sobre as apurações realizadas nas investigações em andamento".

"Somente após ter conhecimento oficial acerca dos fatos citados será possível fazer uma avaliação da situação e a adoção de eventuais medidas administrativas que se façam necessárias", disse a Força em nota.

A reportagem identificou 11 militares da ativa no relatório da Polícia Federal. São oficiais que trocaram mensagens com Cid, foram citados por outros militares ou se manifestaram em grupo de WhatsApp.

O documento sobre a existência do grupo de WhatsApp foi revelado pela Folha de S.Paulo no sábado (17).

Todos os oficiais foram procurados pela reportagem. O coronel Gian Demario da Silva respondeu que o grupo é antigo e mantém apenas "conversas e opiniões". A defesa de Cid disse que se manifestará somente nos autos. Os demais não se manifestaram.

Veja quem é quem no relatório:

Tenente-coronel Mauro Cid

Ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), estava lotado no Comando de Operações Terrestres. Era responsável pela chefia do Preparo da Força Terrestre. Está preso desde maio, suspeito de adulterar cartões de vacinação do ex-presidente, de sua esposa, Gabriela Cid, e filhas, com o objetivo de viajar aos Estados Unidos.

Os advogados de Cid afirmaram que "por respeito ao Supremo Tribunal Federal, todas as manifestações defensivas serão feitas apenas nos autos do processo".

Tenente-coronel Marcelino Haddad Aquino Carneiro

Formou-se na Aman (Academia Militar das Agulhas Negras) em 2000, mesma turma de Cid, e foi promovido para tenente-coronel em 2020. Ocupa cargo de comando no Centro de Preparação de Oficiais da Reserva no Rio de Janeiro.

Segundo o relatório da PF, Haddad enviou em 16 de novembro de 2022 a um grupo de WhatsApp do qual Cid faz parte três documentos sobre a possibilidade de as Forças Armadas atuarem como uma espécie de poder moderador.

Segundo os investigadores, os documentos podem ter dado embasamento jurídico para uma tentativa de golpe.

Tenente-coronel Fabiano da Silva Carvalho

Foi colega de Cid e Haddad na Aman. Assumiu no início do mês o comando do 17ª Batalhão de Fronteira, em Corumbá (MS).

Ele é apenas citado no relatório da Polícia Federal por ter trocado emails com o advogado Ives Gandra Martins, em 2017, quando escrevia artigo sobre a atuação das Forças Armadas como garantidoras dos Poderes Constitucionais.

Coronel Jean Lawand Junior

Primeiro colocado na turma da Aman de 1996, é supervisor do Programa Estratégico Astros do Escritório de Projetos do Estado-Maior do Exército.

Lawand é o principal interlocutor de Cid nas mensagens destacadas pela Polícia Federal no relatório enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal). Ele insistentemente pede ao então ajudante de ordens para orientar Bolsonaro a dar um golpe contra a democracia: "Convença o 01 a salvar esse país!", escreveu em uma das conversas.

Pelas mensagens trocadas, o Exército decidiu anular a nomeação de Lawand para ocupar cargo na embaixada do Brasil nos Estados Unidos.

Tenente-coronel Jorge Alexandre Oliveira de Medeiros de Souza

Foi promovido ao atual posto em 2021. Antes, trabalhou na 12ª Região Militar, no Amazonas, quando o general e ex-ministro Eduardo Pazuello comandava a unidade.

Ele fazia parte do grupo "Dosssss!!!", composto majoritariamente por militares da ativa. Jorge Alexandre só enviou duas mensagens entre as destacadas pela PF. Uma é o anúncio de que os oficiais-generais escolhidos por Lula para o comando das Forças tomariam posse em dezembro.

Coronel Gian Dermario da Silva

Formado na Aman em 1996, Gian é atualmente comandante do Centro de Instrução de Operações Especiais, onde são formados os Forças Especiais, considerada a ala mais radical do Exército.

Nas mensagens do grupo "Dosssss!!!", ele afirma que esperava para os próximos dias uma "ação por parte do PR e FA" contra a eleição de Lula.

Gian diz ainda que pretendia dar "muita ênfase" no curso de formação dos Forças Especiais para questões ligadas ao "globalismo/progressismo socialista". Para ele, o Exército sabia como derrotar a esquerda, mas "ficamos amarrados no POLITICAMENTE CORRETO".

Procurado pela reportagem, Gian disse que não há nada de mais nas trocas de mensagens. "Esse é grupo muito antigo, de mais de dez anos de conversas e opiniões. Por um acaso o militar está nele. Somente isso", escreveu.

Coronel Anderson Corrêa dos Santos

Assumiu o atual posto em 2020, após ter atuado por mais de um ano no comando do Batalhão de Apoio às Operações Especiais, em Goiânia. Trabalhou no gabinete de intervenção federal do Rio de Janeiro, em 2018.

No grupo de WhatsApp, ele fez poucas intervenções destacadas pela PF. Disse que poderia estar errado, mas "acho que estamos caminhando para uma crise interna muito forte".

"A ruptura institucional já ocorreu a [sic] muito tempo. Tudo que for feito agora, da parte do PR, FA e tudo mais, não vai parar a revolução do povo que cansou de tudo isso".

Coronel Rodrigo Lopes Bragança Silva

Foi promovido a coronel em 2022. É oficial de cavalaria, lotado na Escola Preparatória de Cadetes do Exército.

Nas mensagens trocadas no grupo de WhatsApp, Rodrigo incentiva os colegas a assinar uma carta de oficiais superiores ao comandante do Exército Brasileiro. Trata-se de texto apócrifo, de tom golpista e escrito na esteira dos acampamentos antidemocráticos em frente aos quartéis, conforme a a Folha de S.Paulo revelou.

"E aí, agora todos colocaremos o nome nessa rela aí né?", disse. "Ou seremos leões de Zap", completou.

Tenente-coronel Helio Ferreira Lima

Ferreira Lima trabalhou no GSI (Gabinete de Segurança Institucional) no governo Bolsonaro e retornou ao Exército para comandar a 3ª Companhia de Forças Especiais, em Manaus (AM).

É um dos mais ativos no grupo de WhatsApp. Ele reclama que as Forças Armadas não iriam se comprometer com o governo Lula porque "ficou gostosinho demais sermos só isso".

"Salário garantido, guerreiro com absoluta certeza de não guerrear, uma escapada ou outra ganhando bem por aí ? ficou bom demais para queríamos sair desse conforto", escreveu.

Coronel Marcio Nunes de Resende Junior

Formado na Aman em 1996, Marcio foi comandante do 1º Batalhão Logístico de Selva, em Boa Vista (RR). Hoje está no Estado-Maior do Exército.

No grupo, ele endossa o discurso de que houve fraude eleitoral. "Se a gente não tem coragem de enfrentar o cabeça de ovo e uma fraude eleitoral, vamos enfrentar quem???".

Marcio ainda disse que "se o Bolsonaro acionar o 142, não haverá general que segure as tropas. Ou participa ou pede pra sair!!!".

Coronel Felipe Guimarães Rodrigues

Formado na Aman em 1997, Felipe foi comandante do 63º Batalhão de Infantaria em Florianópolis (SC). Hoje, atua como assessor parlamentar do Exército no Senado.

No grupo, manda somente uma mensagem. "Outros bravateiros?não conseguiram deter uma fraude eleitoral clara dentro do território deles !!!", disse, sem deixar claro se a referência era ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) ou aos militares que participaram da fiscalização do processo eleitoral.


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