BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Bolsonaristas presos na invasão ao Palácio do Planalto, em 8 de janeiro, não sabiam diferenciar qual sede pertencia a qual Poder e, inspirados em afirmações falsas, planejavam esperar sentados nos prédios até que fosse anunciada uma "solução militar" contra a posse de Lula (PT).

Os relatos estão espalhados em dezenas de depoimentos dados à Polícia Civil do Distrito Federal nos dias 8 e 9 de janeiro e entregues à CPI do Congresso que investiga os atos antidemocráticos.

As falas comprovam que o objetivo dos radicais era incitar as Forças Armadas a darem um golpe contra a democracia, diante da vitória de Lula na corrida presidencial contra Jair Bolsonaro (PL).

Apesar de poucos bolsonaristas citarem o nome de Bolsonaro nos depoimentos, os vândalos afirmavam que o incentivo para o golpe seria a desconfiança sobre o resultado proclamado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) --estímulo causado após uma série de ataques ao sistema eleitoral realizada pelo ex-presidente.

Cibele da Piedade Mateos, 60, moradora de São Paulo, foi uma das mulheres detidas no Palácio do Planalto. Ela conta que viajou a Brasília de graça, na véspera dos ataques, em uma excursão cujo organizador ela diz desconhecer.

A mulher nega que tenha depredado qualquer patrimônio dos palácios. Ela disse aos policiais que somente entrou no "prédio da rampa que não sabe o nome" porque militares lançaram gás de pimenta contra os bolsonaristas que estavam nos arredores do prédio.

"O objetivo era apenas ocupar os prédios, sentar e esperar até 'vir uma intervenção militar' para não deixar o Lula governar", disse Cibele, segundo o relato do delegado Jorge Teixeira de Lima.

"[A intenção] era apenas ocupar os prédios, sentar e esperar até [a] 'solução dos militares' para resolver o problema da eleição. Que 'foi para rua' porque não acreditou no processo eleitoral", disse Jucilene do Nascimento, 58.

Moradora de Palhoça (SC), ela chegou ao QG do Exército, em Brasília, em 6 de janeiro, numa excursão que custou cerca de R$ 300. Ela havia levado somente R$ 20 em espécie para "uma emergência". "A alimentação era doada dentro das barracas", explicou.

Rosely Monteiro, 53, deixou o pequeno município de Colíder (MT), de 32 mil habitantes, para participar das manifestações em Brasília inspirada em uma série de afirmações falsas sobre o que a vitória de Lula poderia representar ao país.

"Que veio para Brasília para protestar contra o novo governo, para tentar salvar o Brasil de um governo que quer acabar com a família, pela proteção das gerações futuras, pela manutenção das igrejas, para proteger seus filhos e netos, para impedir as mulheres e crianças de se tornarem escravas sexuais", disse Rosely em relato feito pela Polícia Civil.

Monteiro viajou a Brasília de carona com um desconhecido e chegou na véspera do Réveillon. Ficou acampada em frente ao QG do Exército, com R$ 300, mas não precisou gastar com alimentação porque recebia as refeições de graça.

"Que via várias pessoas quebrando e danificando objetos dentro do Palácio do Planalto e disse para não quebrarem nada, mas não a ouviram", defendeu-se, segundo o relato do delegado Marcelo Mesquita.

Havia ainda entre bolsonaristas presos uma concepção de que a derrubada do governo Lula seria uma vitória espiritual, um sacramento.

Essa era a visão de João de Oliveira Antunes Neto, 19. Ele deixou São Raimundo Nonato (PI) para procurar emprego em Brasília, mas, após servir como pedreiro, foi aconselhado por irmãos da Assembleia de Deus do Guará para participar do movimento golpistas em frente ao QG do Exército.

No dia 8, relatou aos delegados, Neto desceu à Esplanada dos Ministérios achando que a manifestação seria pacífica. O objetivo dele, porém, era derrubar Lula para subir ao céu.

"Que acreditava que o Governo Lula iria cair; que ainda acredita que o Governo Lula irá cair; que acredita que se fizer algo contra Lula irá para o céu; que acredita que vai ascender quando Jesus voltar, pois irá combater o Governo Lula; que acredita que Lula iria fechar as igrejas, pois vira Lula falando tais coisas", relatou à Polícia Civil, segundo a íntegra do depoimento, insuflado por afirmações falsas.

Alguns dos presos confirmaram à Polícia Civil que foram à Praça dos Três Poderes portando armas brancas. É o caso do marceneiro Gabriel Lucas Pereira, 21, morador de Belo Horizonte (MG).

Ele levava um riscador de fórmica, usado para cortar chapas de acrílico, e pedaços grandes de madeira com ponta fina para "caso fossem atacados por petistas, integrantes do MST e outros que pudessem atacá-los".

Pereira contou ainda que o objetivo dos atos seria a decretação de uma operação de Garantia da Lei e da Ordem, para que os militares aplicassem um golpe.

"Que estão aqui para protestar e pedir pela GLO e, com isso, fazer uma limpeza geral nos três Poderes; que gostaria que tirassem Lula, [Geraldo] Alckmin, Alexandre de Moraes, a cúpula do PT e os demais ministros do STF [...]; que não se arrepende de ter participado do movimento, pois está lutando por seu país", relata a Polícia Civil sobre o depoimento de Gabriel Pereira.


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