SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Depois da desavença entre Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Jair Bolsonaro (PL) por causa da Reforma Tributária, o Palácio dos Bandeirantes e os deputados da base do governador se preparam para embates na volta do recesso da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), quando uma reforma administrativa será colocada em pauta.

Da parte dos bolsonaristas, que representam cerca de metade da bancada do PL, a maior da Casa, com 19 deputados, permanece uma insatisfação com o governador ?apesar dos sinais de paz trocados entre ele e Bolsonaro.

Aliados do ex-presidente ouvidos pela reportagem afirmam que "caiu a máscara" do governador após o episódio ?em que Tarcísio defendeu a aprovação do texto e posou ao lado do ministro Fernando Haddad (PT), enquanto Bolsonaro fez campanha para que o PL não aprovasse a reforma que entende ser do PT.

Segundo esses interlocutores, o desentendimento escancarou problemas de comunicação e falta de traquejo de Tarcísio, além de uma postura equivocada com a direita que o elegeu. A opinião é a de que o governador deve tudo a Bolsonaro, mas prefere agradar a outros aliados, como Gilberto Kassab (PSD), que conseguiu emplacar nomes no governo.

Reservadamente, bolsonaristas mais inflamados opinam que a Assembleia irá travar as pautas de Tarcísio em resposta. Outros descartam uma oposição contundente, até porque Tarcísio tem boa aprovação popular, mas admitem que pode haver alguma dificuldade por parte dessa bancada ideológica.

O deputado bolsonarista Lucas Bove (PL) diz que a reforma é importante e positiva, o que deve angariar apoio da base. Para ele, o apoio dos bolsonaristas depende da concordância com os projetos e não da troca de interesses.

"O governador vai ter base leal nos projetos relevantes e vai ser criticado no que ele fizer de negativo. Mas isso não significa racha ou divergência total", afirma.

A reforma administrativa é uma das prioridades de Tarcísio e deve ser enviada em agosto para a Assembleia. Deputados afirmam que o tema é polêmico porque muda a estrutura dos servidores públicos. O governo quer simplificar o organograma do estado, que de 120 tipos de cargos diferentes terá apenas 18, segundo Tarcísio afirmou em maio.

Mesmo com as declarações públicas de Bolsonaro e de Tarcísio de que a questão foi superada, o governador paulista continua na mira de influenciadores bolsonaristas nas redes sociais.

No último dia 13, em um gesto para o público do ex-presidente, Tarcísio anunciou que vai ampliar o programa de escolas cívico-militares no estado. No mesmo dia, o governo Lula (PT) divulgou que vai extinguir o programa federal, que foi bandeira de Bolsonaro.

No Bandeirantes, a percepção é que Tarcísio segue no alvo da militância radical e há o temor de que isso contamine o clima na Assembleia. Por isso, a orientação é de aproximação com os deputados ?o governo quer estar mais presente, com programas, verbas, parceria e entendimento, de acordo com auxiliares do governador.

Os secretários foram instruídos a estreitarem laços com a Assembleia e devem promover rodadas de reunião com diferentes bancadas.

A rebelião na base do governo atinge, além dos bolsonaristas, partidos do centrão, que exigem a distribuição de cargos e de emendas aos aliados, algo que Tarcísio resiste a fazer. Segundo interlocutores do governador, a pressão tem efeito contrário e reforça a resistência do mandatário em lotear a gestão.

Como mostrou a coluna Painel, a bancada da União Brasil, com exceção do vice-líder de governo, Guto Zacarias, boicotou, no fim de junho, a votação de um projeto que permitia o financiamento do trem intercidades. O partido cobra um suposto acordo em que ficariam com a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional Urbano) em troca do apoio a Tarcísio no segundo turno do ano passado.

Considerando que Tarcísio já acumula uma série de desgastes com sua base na Casa e tem tido dificuldade para aprovar mesmo projetos considerados simples, que têm o aval até da oposição de esquerda, o governo quer reforçar a articulação política na volta do recesso e avalia ceder a pedidos dos deputados.

Segundo auxiliares de Tarcísio, entregar órgãos inteiros, como exige a União Brasil, está fora de cogitação, mas outras demandas da base, consideradas válidas pelo governo, podem ser contempladas.

Em geral, os deputados e líderes partidários pleiteiam emendas extras e entrega de cargos de terceiro escalão, sobretudo nas regiões onde atuam. Além disso, se queixam de pouco contato com o secretariado e pouco prestígio do governador. Como mostrou a Folha de S.Paulo, Tarcísio relega sua atuação política ao segundo plano, o que afeta a base frágil na Alesp.

Na opinião de deputados experientes na Casa, a reforma administrativa pode ser um divisor de águas na relação entre Tarcísio e a Assembleia. Será o momento, dizem, de sinalizar, ou seja, atender os parlamentares para construir uma base sólida.

Nos bastidores, integrantes do governo avaliam ainda que a votação da reforma administrativa será um teste para Kassab, que é secretário de Governo e responsável pela articulação política. A expectativa do palácio é de que ele enquadre bolsonaristas e o centrão para criar um ambiente favorável à aprovação do projeto.

Quem acompanha a tensão entre Tarcísio e a Assembleia, no entanto, afirma que Kassab tem seu poder de negociação esvaziado, já que o governador não entrega o que o secretário promete aos aliados. As travas são colocadas na conta do secretário da Casa Civil, Arthur Lima, homem de confiança de Tarcísio, que vai se filiar ao PP no mês que vem.

Questionados pela reportagem, membros do primeiro escalão do governo divergem dos parlamentares. Afirmam que a tensão entre Legislativo e Executivo é natural e que a legislatura atual é parceira do governador, de forma que a reforma será aprovada sem entraves.


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