BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O STF (Supremo Tribunal Federal) condenou nesta quinta-feira (14) os primeiros três réus julgados pelos ataques do 8 de janeiro.
Por maioria de votos, os ministros os enquadraram nos crimes de associação criminosa, golpe de Estado, abolição do Estado democrático de Direito, dano qualificado ao patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
Também houve aplicação de multa de R$ 30 milhões para todos por danos morais coletivos a serem pagos de forma solidária pelos condenados. Os crimes foram imputados pela PGR (Procuradoria-Geral da República) e aceitos pelo ministro relator, Alexandre de Moraes.
Aécio Lúcio Costa Pereira, 51, foi condenado a 17 anos de prisão, sendo que 15 anos e 6 meses devem ser cumpridos em regime fechado e 1 ano e 6 meses em regime aberto. Ele é ex-funcionário da Sabesp (companhia de saneamento de São Paulo) e foi preso em flagrante dentro do Congresso pela Polícia do Senado.
Da mesma forma, foi condenado Matheus Lima de Carvalho Lázaro, 24, de Apucarana (PR), que também esteve no Congresso Nacional.
Já Thiago de Assis Mathar, 43, foi condenado a 14 anos de prisão, sendo que 12 anos e seis meses em reclusão. De São José do Rio Preto, ele foi acusado pela procuradoria de furar o bloqueio policial e entrar no Palácio do Planalto.
O revisor dos processos, ministro Kassio Nunes Marques, divergiu do ministro relator, Alexandre de Moraes e votou pela condenação de todos os réus a uma pena de 2 anos e 6 meses, em regime aberto, descontado os meses que já ficaram presos.
Já Cristiano Zanin votou pela condenação a 15 anos de prisão dos réus que tiveram a maior condenação e 11 anos para o menor.
Em seu voto, Zanin disse que, durante os atos, houve um "contágio mental que transformou os aderentes em massa de manobra", em que "os componentes da turba passam a exercer enorme influência aos outros, provocando efeito manada".
"No caso em análise estamos a falar de crimes praticados objetivando a destituição de um governo legitimamente eleito e ainda aniquilar o estado democrático de direito, além de outras práticas criminosas", disse.
André Mendonça defendeu a condenação do primeiro réu a 7 anos e 11 meses do primeiro réu pelos crimes de associação criminosa e abolição violenta do Estado democrático de Direito e 4 anos e dois meses para Mathar, apenas por tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito. Ele não votou no terceiro julgamento, pois teve que deixar a sessão.
Mendonça descartou a condenação dos primeiros réus pelo crime de golpe de estado, o que gerou discussão entre os ministros. Ele argumentou que, para configurar golpe de estado, é preciso restringir o exercício dos Poderes constituídos, o que não houve neste caso.
"Teria que ser instituída uma norma ordem jurídica e institucional, definir o que seria feito com o congresso e o STF, com a liberdade da imprensa e das pessoas, uma série de planejamento de condutas que não vi nesses manifestantes. Para qualquer ação de golpe dependeria uma ação de outras forças, basicamente dos militares", disse.
Zanin interveio no voto do colega e disse que a tentativa já seria suficiente para a classificação do crime. Gilmar Mendes também discordou.
"Jamais houve passeio no parque, não se tratava disso, ministro Kassio. Nem de um incidente. A cadeira que o senhor está sentado, ministro, estava na rua no dia da invasão", afirmou Gilmar, ao que o ministro Kassio Nunes Marques falou que essa expressão não tinha sido usada por ele.
Mendonça afirmou que "há muitas perguntas sem resposta" e que "não consegue entender, e também carece de respostas, como o Palácio do Planalto foi invadido como foi". "Vossa Excelência sabe o rigor de vigilância e cuidado que deve haver lá", afirmou, dirigindo-se a Moraes.
Moraes se irritou com a fala e disse que "as investigações demonstram claramente os motivos dessa facilidade" e que "cinco coronéis comandantes da Polícia Militar estão presos exatamente porque, desde o final das eleições, se comunicavam por WhatsApp, dizendo que iriam preparar uma forma de, havendo manifestação, a PM não reagir".
"Sabemos nós dois que o ministro da Justiça não pode utilizar a Força Nacional se não houver autorização do Governo do Distrito Federal porque isso viola o princípio federativo", disse o relator.
Mendonça afirmou que a tese de Moraes não se aplicaria em relação aos prédios federais. Nesse momento, Moraes exaltou-se: "É um absurdo, com todo respeito à vossa excelência, querer dizer que a culpa foi do ministro da Justiça".
Mendonça então afirmou que não estava dizendo isso "muito embora ele e o Brasil quisessem ver esses vídeos do Ministério da Justiça [da invasão]", e Moraes seguiu:
"Vossa excelência vem no plenário do STF, que foi destruído, para dizer que houve uma conspiração do governo contra o governo, tenha dó", disse o relator.
Em seguida, Mendonça afirmou que "não era advogado de ninguém". "Não coloque palavras na minha boca, tenha dó vossa excelência."
Edson Fachin seguiu integralmente o voto de Moraes, assim como Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Rosa Weber.
Já o ministro Luís Roberto Barroso votou pelos crimes de associação criminosa armada, dano qualificado pela violência contra ao patrimônio público, deterioração do patrimônio tombado e golpe de estado.
Ele descartou o crime de abolição violenta do Estado democrático de Direito, por considerar que as condutas praticadas já estariam inclusas no crime de golpe de estado.
Barroso disse que não se deve minimizar o crime de golpe de estado, considerando a história do Brasil, de rupturas e tentativas de se acabar com a legalidade constitucional.
"O tipo penal (golpe) é tentativa de deposição por meio de violência, já que, se tiver sucesso, passa a ser a nova ordem jurídica. Por isso, é um golpe de estado. Se tivesse dado certo, nós não estaríamos aqui", disse.
Ele acrescentou que a democracia brasileira "correu um risco real no dia 8 de janeiro" e que as suas articulações "transcorreram subterraneamente, em detalhes que vamos conhecer posteriormente".
Em seu voto, a presidente do tribunal repetiu a frase de Moraes de que o que houve no dia 8 "não foi uma aventura, um passeio no parque", e sim, "um domingo de devastação, o dia da infâmia".
"Quem viu, sabe do horror que estou a falar, o que nós encontramos aqui, um prédio inundado, o chão coberto de estilhaços, vestígios de fogo, inclusive no gabinete da presidência, lustre no chão, um vandalismo generalizado, um cenário de horror. Nem os elevadores resistiram à violência", disse.
Durante o segundo julgamento, Moraes e Barroso criticaram o advogado do réu, Hery Kattwinkel, quando este disse que "antidemocrático é quando um ministro do STF diz que eleição não se ganha, se toma".
A informação falsa é atribuída a Barroso pelas redes bolsonaristas, que desmentiu o caso mais uma vez, dizendo que editaram sua fala e retiraram de contexto.
"A mentira e as narrativas falsas dominaram o país. Essa é mais uma fraude que se pratica online. Praticam mentiras, se alimentam, e propagam isso", disse. "Essa é uma mentira que circula repetidamente. Foi até bom o advogado ter mencionado isso para esclarecer. Não se vive de narrativas e informações falsas", acrescentou.
Após a fala de Barroso, Moraes também criticou o advogado.
"É patético e medíocre que um advogado suba à tribuna do STF com um discurso de ódio para postar depois nas redes sociais, que veio aqui agredir o STF, talvez pretendendo ser vereador de seu município no ano que vem", afirmou.
Moraes também disse que recebe com tristeza que o advogado constituído pelo réu, que aguarda que o defenda tecnicamente, não tenha analisado nada do processo, como as acusações de associação criminosa e dano material que lhe são apontadas.
"Isto porque (o advogado) preparou um discursinho para postar nas redes sociais. Isso é muito triste. Alunos que vieram assistir a sessão hoje tiveram uma aula do que não deve ser feito na Suprema Corte do país, o que um advogado não deve fazer para prejudicar o seu constituinte. Ele se esqueceu do processo, quis fazer uma média com os patriotas. É muito triste", disse.
Ele também afirmou que o advogado confundiu o livro "O Príncipe", de Maquiavel, com "O Pequeno Príncipe", ao falar que "os fins justificam os meios" ao livro "O Pequeno Príncipe".
Durante o processo, Mathar alegou que ingressou no Planalto para se abrigar do conflito violento nas imediações do prédio. Disse que ajudou a enrolar cortinas que estavam arrancadas e jogadas no chão, além de estender algumas para que as pessoas que estavam passando mal pudessem deitar.
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