BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A PEC da Anistia, que concede o maior perdão da história a partidos políticos e flexibiliza as cotas eleitorais de negros e mulheres, uniu nesta quarta-feira (20) o PT de Lula e o PL de Bolsonaro na comissão especial da Câmara que debate o tema, mas teve sua votação adiada mais uma vez.
O relator, Antonio Carlos Rodrigues (PL-SP), pediu prazo de uma sessão para analisar as propostas de mudanças sugeridas, entre elas a elevação do percentual de repasse das verbas eleitorais a negros de 20% para 30%.
Discursaram a favor da proposta nesta quarta Bia Kicis (PL-DF), Filipe Barros (PL-PR), Eder Mauro (PL-PA), Soraya Santos (PL-RJ), Jilmar Tatto (PT-SP) e Gleisi Hoffmann (PR).
Em sua fala, Gleisi fez um forte ataque à Justiça Eleitoral, também alvo dos bolsonaristas, como justificativa ao perdão às irregularidades partidárias.
Segundo ela, as decisões "trazem a visão subjetiva da equipe técnica do tribunal, que sistematicamente entra na vida dos partidos políticos, querendo dar orientação, interpretando a vontade de dirigentes, a vontade de candidatos."
Gleisi afirmou que a Justiça tem aplicado multas inexequíveis aos partidos --"não tem como pagar, nós não temos dinheiro"-- e que a existência de um tribunal direcionado às questões eleitorais é uma exceção no mundo, situação que classificou como "um absurdo".
A petista questionou também o custo de manutenção da Justiça Eleitoral, afirmando que ela custa três vezes o valor direcionado às campanhas. "Tem alguma coisa errada nisso", completou.
Falaram contra a PEC na sessão desta quarta apenas deputados do PSOL, Chico Alencar (RJ), Fernanda Melchiona (RS) Sâmia Bonfim (SP) e Talíria Petrone (RJ), que classificaram a proposta de uma "PEC racista".
O PSOL ainda apresentou um voto em separado criticando a medida e afirmando que o texto é inconstitucional.
Nele, os dois deputados afirmam que a proposta pode "tornar letra morta a previsão constitucional que prevê a igualdade material como direito de todos, bem como de tornar o Brasil um pária internacional por desrespeitar tratados que disciplinam a busca pela igualdade de gênero e racial".
A PEC da Anistia faz parte do pacote de mudanças eleitorais que é impulsionado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e que também inclui a minirreforma eleitoral, que enxuga a inelegibilidade de políticos, diminui a transparência e afrouxa a Lei da Ficha Limpa.
Para ter efeito já nas eleições municipais de 2024, as propostas precisam ser promulgadas ou sancionadas até a primeira semana de outubro.
A PEC da Anistia tem o apoio da ampla maioria da Câmara, da esquerda à direita, e concede o maior perdão da história a partidos políticos, em especial pelo descumprimento das cotas afirmativas de gênero e de raça na disputa de 2022.
O texto proíbe qualquer punição a ilegalidades eleitorais cometidas até a promulgação da PEC, incluindo o desrespeito ao repasse mínimo de verbas a mulheres e negros nas eleições.
Se aprovada, a proposta consolida a total impunidade ao descumprimento generalizado dessas cotas, que entraram em vigor vagarosamente ao longo do tempo com o objetivo de estimular a participação de mulheres e negros na política.
Em abril de 2022, o Congresso já havia aprovado e promulgado uma PEC anistiando as legendas pelo não cumprimento das cotas nas eleições anteriores.
Durante sua tramitação, a PEC da Anistia condensou dispositivos que versam sobre as cotas afirmativas, mas que tramitavam em outras propostas.
O último deles foi adicionado ao texto nesta terça-feira (19). Ele prevê uma reserva de 15% das cadeiras das Câmaras e Assembleias Legislativas de todo o país para mulheres em 2024, e 20% a partir de 2026.
Esse percentual é abaixo do que a população elegeu para a Câmara dos Deputados em 2022, 17,7% de mulheres.
Além disso, a proposta determina que o partido pode formar sua chapa "apenas com candidatos do mesmo sexo, desde que respeitado o limite máximo de 70% das vagas", bastando, para isso, deixar as 30% de vagas restantes, que deveriam ser destinadas às mulheres, sem preencher.
Com isso, o projeto pode praticamente extinguir a cota de candidatas, que hoje deve ser de 30%, apesar de o relatório ressaltar que não há alteração na cota de verbas mínimas de campanha a serem repassadas para as mulheres, também de 30%.
Esse dispositivo originalmente estava na PEC das Mulheres, que não vingou na Câmara, e foi desidratado para entrar na proposta da Anistia. Inicialmente, a progressão deveria levar a reserva de cadeiras também até os 30%, mas por fim o piso ficou em 20%.
A PEC da Anistia também corta de mais de 50% da verba de campanha a ser destinada a candidatos negros.
Em sua justificativa, Rodrigues afirma que o corte do dinheiro destinado a pretos e pardos tem o objetivo de tornar mais "simples" a regra, tendo em vista que, em sua visão, a determinação do STF (Supremo Tribunal Federal) de distribuição proporcional ao número de candidatos negros é "complexa".
Por decisão do STF, os partidos precisariam ter distribuído a bilionária verba de campanha já em 2022 de forma proporcional ao número de candidatos brancos e negros (pretos e pardos).
Ou seja, naquela disputa os negros deveriam ter recebido 50% da verba eleitoral de R$ 5 bilhões. O texto da PEC da Anistia reduz esse patamar a 20%.
Outro texto incorporado da minirreforma foi o dispositivo que dificulta a punição às chapas que descumprirem a cota de gênero.
A proposta determina que as siglas que burlarem as regras da cota de gênero também serão perdoadas caso a decisão judicial de punição resulte, na prática, em cassação do mandato de mulheres.
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