BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A PGR (Procuradoria-Geral da República) se manifestou a favor da derrubada de uma decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que põe em risco, segundo investigadores, casos que vão das ações sobre o 8 de janeiro aos da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).
Em agosto, a Sexta Turma do tribunal entendeu que a polícia não pode solicitar dados diretamente ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), também chamado de UIF (Unidade de Inteligência Financeira), sem autorização da Justiça.
Essa decisão, que trata de uma cervejaria investigada no Pará, foi questionada pelo Ministério Público do estado ao STF (Supremo Tribunal Federal), em ação que é relatada pelo ministro Cristiano Zanin. Ainda não há uma decisão dele sobre o caso.
Ao se manifestar nesta quinta-feira (9) no processo, a PGR disse que "não há fundamento razoável" para se considerar ilícitos relatórios do Coaf solicitados a pedido de autoridades que fazem investigação penal.
"A UIF não realiza atos de investigação nem acessa às informações bancárias das pessoas investigadas", diz a manifestação, assinada pela subprocuradora-geral Cláudia Sampaio Marques.
"Os Relatórios de Inteligência Financeira, sejam os emitidos por iniciativa da própria UIF, sejam os emitidos a pedido da autoridade competente, retratam as informações que já estão no banco de dados da unidade de inteligência financeira, previamente repassados pelas instituições financeiras e bancárias", acrescenta.
No posicionamento, a PGR afirma que outros ministros da corte já entenderam que é legal a possibilidade de compartilhamento, sob solicitação das autoridades, dos relatórios de inteligência, desde que essas informações já tenham sido previamente informadas ao Coaf pelas instituições financeiras.
"Como unidade de inteligência financeira, a UIF não tem acesso a movimentações bancárias, sendo mera destinatária de informações que são repassadas pelos setores obrigados", afirma a manifestação.
"Dizendo de outra forma, a UIF não tem acesso a conta bancária das pessoas, não vê os extratos bancários, não tem o detalhamento das contas e das movimentações bancárias e não realiza diligências perante instituições financeiras para a obtenção de informações específicas desta ou daquela pessoa, salvo para algum detalhamento de atividade atípica de lhe seja previamente repassada."
"A sua atuação é limitada a receber informações que são repassadas pelos entes e setores obrigados por lei. Daí a impossibilidade de que possa agir com o objetivo de realizar investigações disfarçadas."
Como mostrou a Folha de S.Paulo, a decisão do STJ tem potencial, segundo investigadores, para anular investigações de crimes financeiros, lavagem de dinheiro e corrupção, inclusive relacionados ao tráfico de drogas, jogo do bicho e milícias.
A possibilidade de que essa decisão não seja suspensa já causa preocupação generalizada tanto entre integrantes das polícias como dos Ministérios Públicos, que temem anulação em série de casos em andamento.
Delegados da área de combate à lavagem de dinheiro da Polícia Federal fizeram um périplo com ministros do STF nas últimas semanas, para apresentar seus argumentos.
O Ministério Público de São Paulo, também pelo receio do impacto nas investigações, solicitou o ingresso na ação como amicus curiae (entidade interessada), para que possa peticionar e fornecer subsídios ao processo. O MP-SP pede ao ministro Zanin a suspensão da decisão.
"Não se pode ignorar que o Superior Tribunal de Justiça goza de credibilidade inerente à sua missão constitucional e legal de uniformizar a aplicação e a interpretação do direito em todo o território nacional", diz uma peça assinada por Mario Sarrubbo, procurador-geral de Justiça de SP.
Segundo Sarrubbo, é urgente a necessidade de suspender a decisão do STJ, sob risco de prescrição do caso em julgamento.
Os advogados Gustavo Mascarenhas e Vinicius Gomes de Vasconcellos, responsáveis pelo habeas corpus que originou a decisão no STJ, afirmaram à Folha que no caso concreto a PF solicitou as informações apenas dez dias após instaurar o inquérito e sobre um período de seis anos e cinco meses.
Para eles, a medida não "encontra guarida em qualquer fundamento" e não se enquadra no previsto pela decisão do STF de 2019, "visto que os próprios ministros do STF realizaram tal distinção no caso e em outros julgados posteriores".
Sobre a posição do STJ, contra o pedido direto da PF ao Coaf, os advogados afirmam tratar-se do "controle das regras" do processo penal. "Entendemos ter andado bem a Sexta Turma do STJ ao impor controle à autoridade policial, evitando a pescaria indevida de informações."
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