SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O ex-presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Ricardo Lewandowski, novo ministro da Justiça no governo Lula (PT), expediu em seu período como magistrado decisões e votos que foram cruciais para o encerramento definitivo de processos e investigações relacionadas ao petista.
Foi ele, por exemplo, que primeiro despachou contra o uso de provas do acordo de colaboração da empreiteira Odebrecht na Justiça. Posteriormente, por ordem do ministro Dias Toffoli em 2023, toda a utilização do material fornecido pela construtora foi barrada em ações penais.
Lewandowski se notabilizou como um opositor veemente da Operação Lava Jato na corte e foi crítico da nomeação do ex-juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça do governo Jair Bolsonaro (PL) após a eleição de 2018, tendo citando esse fato em votos.
Relembre algumas das medidas de Lewandowski:
Liberação das mensagens da Operação Spoofing
No plantão judiciário do fim de 2020, Lewandowski concedeu acesso à defesa de Lula aos arquivos apreendidos pela Polícia Federal no âmbito da Operação Spoofing, que investigava o hackeamento de autoridades.
Esse material continha as mensagens no aplicativo Telegram entre procuradores da Lava Jato, incluindo diálogos com o então juiz Moro.
Trechos desses diálogos já tinham sido publicados pelo site The Intercept Brasil e outros veículos. As conversas revelavam proximidade e colaboração entre Moro e o então chefe da força-tarefa do Ministério Público, Deltan Dallagnol, o que abalou a credibilidade da operação.
O Ministério Público Federal foi crítico à liberação desse material à defesa de Lula e pediu que a medida fosse revista, o que foi negado.
"Elas [autoridades hackeadas] tiveram a sua intimidade violada e o material relativo a suas conversas pessoais entregue ao presidente [Lula] sem qualquer tipo de controle", disse em julgamento a subprocuradora-geral da República Cláudia Sampaio Marques.
A assinatura de um termo de responsabilidade era o controle principal sobre o que era selecionado pelos advogados do petista junto aos arquivos apreendidos pela PF.
A partir da liberação das mensagens, vieram à tona centenas de páginas de outras conversas dos procuradores, por meio de perícia feita por contratados da defesa de Lula.
Essas novas mensagens acabariam servindo de base para duas medidas posteriores, também de responsabilidade de Lewandowski: a anulação do uso de provas do acordo de colaboração da Odebrecht e a paralisação de ação penal da Operação Zelotes que mirava negócios do filho mais novo de Lula, Luís Cláudio.
Declaração de parcialidade e anulação das medidas de Moro
A mais importante das medidas favoráveis a Lula no Supremo foi a declaração de parcialidade do ex-juiz Moro na condução de casos contra o hoje presidente, sacramentada em julgamento em março de 2021.
A decisão não só contribuiu para devolver os direitos políticos ao petista, permitindo sua candidatura em 2022, como anulou provas que tinham sido coletadas em buscas em 2016. Isso inviabilizou processos a que Lula ainda respondia no Paraná, em São Paulo e no Distrito Federal.
A parcialidade de Moro foi decidida em sessão da Segunda Turma do tribunal por 3 votos a 2 --Lewandowski foi um dos votos favoráveis, ao lado de Gilmar Mendes e Cármen Lúcia. Votaram contra Edson Fachin e Kassio Nunes Marques.
Entre os motivos para Moro ser declarado parcial, estava a ida para o Ministério da Justiça de Bolsonaro.
Lewandowski disse ver motivações políticas, demonstradas, dentre outros fatos, "pela aceitação, ainda antes do término do segundo turno das eleições presidenciais, de convite para ocupar o cargo de Ministro da Justiça".
Para o hoje magistrado aposentado, a atuação de Moro em relação a Lula foi "desenganadamente parcial e, ademais, empreendida com nítido propósito de potencializar as chances ou, mesmo, viabilizar a vitória de candidato de sua preferência nas eleições presidenciais [de 2018], cujo governo passou, logo depois, a integrar na qualidade de ministro de Estado da Justiça".
Moro hoje é senador pela União Brasil-PR.
Invalidação do uso de provas da Odebrecht
O uso em processos judiciais de provas entregues pelos executivos da Odebrecht está hoje barrado por ordem do STF. A origem e o precedente desse impedimento estão em decisão de Lewandowski sobre processo de Lula no âmbito da Lava Jato relacionado à empreiteira.
Em 2021, o então magistrado aceitou pedido da defesa e vetou a utilização do material do acordo de colaboração em ação sobre a compra de um terreno para o Instituto Lula, investigada na operação.
À época, Lewandowski citou dois fatores principais: as mensagens trocadas entre procuradores apontavam que as provas da Odebrecht não tinham sido manuseadas com as devidas precauções e o então juiz Moro, já considerado parcial, havia despachado na aceitação do acordo da empreiteira.
Posteriormente, o entendimento pela invalidação das provas foi referendado por colegas no STF e estendido para outros réus, sob críticas do ministro Edson Fachin e da PGR (Procuradoria-Geral da República).
Até que, em setembro passado, Toffoli determinou uma paralisação ainda mais ampla do uso do material fornecido pela empreiteira, o que repercutiu internacionalmente.
Suspensão de ação contra o filho
Em 2022, Lewandowski suspendeu a última ação penal que ainda estava em andamento contra Lula. A medida permitiu a Lula disputar a campanha eleitoral daquele ano sem ter processos ativos a seu desfavor na Justiça.
O caso não era relacionado à Lava Jato, mas sim à Operação Zelotes, com tramitação no DF.
Nesse processo, Lula e o filho Luís Cláudio eram acusados de participarem de um esquema de tráfico de influência, lavagem de dinheiro e organização criminosa envolvendo a compra de caças suecos pelo governo brasileiro.
Segundo o Ministério Público Federal na denúncia, houve uma simulação de prestação de serviços por uma firma de Luís Cláudio, que recebeu R$ 2,55 milhões de um escritório apontado como sendo de lobistas.
O então magistrado acatou argumentos da defesa, que novamente se baseavam em mensagens trocadas entre os procuradores e apreendidas na Operação Spoofing.
Segundo Lewandowski, os procuradores do DF "agiam de forma concertada com os integrantes da 'Lava Jato' de Curitiba, por meio do aplicativo Telegram, para urdirem, ao que tudo indica, de forma artificiosa, a acusação" contra o hoje presidente.
Encerramento de ações no DF
Após Lula assumir a Presidência, em janeiro do ano passado, Lewandowski determinou o encerramento de três ações criminais contra o presidente que já estavam suspensas.
Segundo ele, nos casos houve o fenômeno da "contaminação ou da contagiosidade" de provas.
Além dos casos da compra de terreno pela Odebrecht e dos caças suecos, também foi afetado um processo originalmente aberto em Curitiba que abordava doações feitas pela empreiteira para o Instituto Lula.
Em fevereiro passado, dois meses antes de se aposentar, Lewandowski escreveu: "Trata-se, em verdade, de imputações calcadas em provas contaminadas, que foram produzidas, custodiadas e utilizadas de forma ilícita e ilegítima, o que evidencia a ausência de justa causa para o seu prosseguimento".
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