BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso, pediu vista (mais tempo para análise) nesta sexta-feira (29) na ação que discute a ampliação do alcance do foro especial de autoridades na corte.
A decisão, que leva à suspensão do julgamento, foi tomada após dois votos favoráveis a mudanças nas regras atuais.
O ministro Gilmar Mendes, relator do processo, votou para que a prerrogativa de função seja mantida mesmo depois do fim do mandato parlamentar de políticos por qualquer causa (renúncia, não reeleição ou cassação). Ele defendeu que o investigado deve perder o foro se o crime foi praticado antes de assumir o mandato.
O ministro Cristiano Zanin também votou e acompanhou integralmente o voto de Gilmar.
O julgamento no STF começou nesta sexta em ambiente virtual, para seguir até 8 de abril. Com o pedido de Barroso, deve agora ser debatido no plenário físico, em prazo a ser definido.
Uma ala do tribunal defende mudar as regras estabelecidas há quase seis anos, quando o Supremo restringiu o alcance da própria competência para analisar processos criminais de parlamentares e integrantes do primeiro escalão do governo federal.
Em 2018, na esteira da Lava Jato e do aumento no número de ações penais em curso no Supremo, a corte decidiu que apenas crimes cometidos durante o mandato e relacionados ao exercício do cargo deveriam ficar em sua alçada.
Na ocasião, as novas regras foram aprovadas por uma maioria apertada, com apenas seis votos favoráveis, o mínimo necessário. De lá para cá, houve mudança em 4 dos 11 assentos da corte.
Do ponto de vista jurídico, há ministros que afirmam que a regra atual tem lacunas que precisam ser preenchidas para não gerar insegurança jurídica, o que justifica a rediscussão do tema.
Sob o aspecto político, uma ala defende a ampliação das hipóteses de julgamento de autoridades pela corte como uma forma de fortalecer o Supremo perante os demais Poderes.
Por outro lado, também há a avaliação de que ampliar o número de investigações criminais de integrantes do Legislativo e do Executivo em curso no STF aumentaria a possibilidade de atritos e desgastes para o tribunal.
O julgamento de agora foi iniciado em um contexto em que a Suprema Corte julga diversas pessoas sem cargo que envolva foro especial devido às investigações relacionadas aos atos de 8 de janeiro, quando as sedes dos três Poderes foram invadidas e vandalizadas.
Outro fato público com impacto sobre o tema é a prisão no último domingo (24) do deputado Chiquinho Brazão (RJ) pela morte da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ). Na época do crime, ele era vereador, o que, em tese, poderia afastar a competência do Supremo sobre o assunto.
A análise foi retomada porque Gilmar enviou para o plenário um habeas corpus do senador Zequinha Marinho (Podemos-PA), que responde pela suposta prática de "rachadinha" quando era deputado federal ao tribunal.
O processo tramita atualmente na Justiça Federal de Brasília, em primeira instância. O parlamentar alega nunca ter deixado de ter cargo eletivo e apenas mudou de função ?foi deputado de 2007 a 2014, vice-governador do Pará entre 2015 e 2018 e é senador desde 2019.
No ano passado, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) rejeitou um pedido do senador e manteve a ação na primeira instância por entender que o STF perdeu a atribuição para tocar o caso quando ele tomou posse como vice-governador.
Ao remeter a ação para o plenário, Gilmar ressaltou a importância do tema. "Considerando a dimensão da controvérsia discutida nesta demanda, que pode recalibrar os contornos do foro por prerrogativa de função, entendo que o julgamento do habeas corpus deve ser afetado ao plenário", disse em despacho de 13 de março.
Segundo o ministro, a tese apresentada pela defesa de Marinho "não apenas é relevante, como também pode reconfigurar o alcance de um instituto que é essencial para assegurar o livre exercício de cargos públicos e mandatos eletivos, garantindo autonomia aos seus titulares".
O próprio ministro já havia apontado lacunas na decisão de restringir o foro especial quando votou para retirar da primeira instância uma investigação contra o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), em 2021.
Na época, a Segunda Turma da corte avalizou, por 3 votos a 1, a decisão do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro) de retirar o processo das mãos do juiz de primeiro grau Flávio Itabaiana, que vinha dando decisões duras contra o parlamentar no âmbito da investigação sobre a suposta prática de rachadinha no gabinete de Flávio quando era deputado estadual.
O Ministério Público do Rio de Janeiro recorreu ao Supremo contra a decisão do tribunal fluminense sob o argumento de que teria havido violação à jurisprudência do tribunal superior, uma vez que, como Flávio não estava mais no mandato em que teria cometido os delitos, o caso deveria permanecer em primeira instância.
Gilmar, porém, defendeu que o Supremo só definiu a restrição do foro especial para integrantes do Congresso, e o caso do senador não deveria ser atingido pela decisão da corte porque, na época dos supostos crimes, ele era deputado estadual.
"O STF debruçou-se tão somente sobre o alcance da competência do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar parlamentares federais", disse.
Já naquele julgamento, o ministro aproveitou fez críticas à decisão que limitou o tratamento diferenciado na Justiça a pessoas que ocupam mandato eletivo.
"São justamente pontos cegos desse tipo que corroboram a tese de que a decisão trouxe mais desacertos do que acertos. De todo modo, não é possível extrair do paradigma indicado um direcionamento que se repute violado pela decisão reclamada", afirmou.
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