Sangue no "zoio", faca no dente
Após dezenas de mensagens incentivadoras e de solicitações para que desdobrasse o assunto "63ª Corrida da Fogueira", dedico esta página ao saldo do evento. Fazia tempo que não corria por minhas veias a adrenalina da competição esportiva. Tanto tempo, que até já havia me esquecido o quão boa é tal sensação. Como dizem alguns populares que encontro pelo caminho, nas paragens do meu trabalho, para encarar uma prova desta natureza, tem que ter "sangue no zoio e faca no dente". Poderia até colocar, a título de bom português, o "sangue nos olhos", mas acho que não seria tão impactante. Até porque a ênfase do desporto, imposto pela superação de limites, atropela plurais e prejudica grafias. Ou seja, é determinação pura.
Foi assim que me senti, imerso no clima da competição da tarde chuvosa do último sábado. Equipes uniformizadas, atletas renomados, cronômetro eletrônico e mais de 800 participantes concediam o tom que precisava para a largada. E além disso, havia a torcida, incentivando a cada um dos atletas a deixar o seu melhor nas ruas do Bom Pastor e da avenida Rio Branco. Tanta empolgação mexeu com o meu espírito. Logo eu, que não costumo entrar na onda dessas coisas... O resultado é que saí em disparada, em um ritmo frenético, bem mais alto do que estou acostumado a correr. Quando cheguei à maior avenida em linha reta da América Latina (não sei se é verdade ou folclore), já estava sem fôlego. Mas, como vi que havia ambulâncias no local e que corria ladeando ao HPS e à Santa Casa de Misericórdia, resolvi continuar. E o fôlego foi sendo recobrado com hidratação, passos cadenciados e controle da respiração. Tudo como um bom atleta deve fazer.
Surpreendi-me com o trecho da volta, quando teria que subir a avenida Rio Branco. Não fui ultrapassado por qualquer adversário, tendo apenas, como maior obstáculo, as ondulações do asfalto. Essas ainda não entraram no escopo da Nova Juiz de Fora. Fica a dica... Ondulações à parte, cheguei à reta final do Bom Pastor emparelhado com um outro participante que, meio esbaforido, sugeriu que chegássemos empatados. Sem forças, acenei positivamente com a cabeça. No entanto, na linha de chegada, arranquei aquela última energia que me restava e fiquei à frente do oponente. Ele deveria saber: É "sangue no zóio", é faca no dente. Tanto esforço, é verdade, valia apenas o 58º lugar. Não importa. A canção tema de Sylvester Stallone, na saga de filmes "Rocky", não saía da minha cabeça... E cada um disputa o que pode, não é mesmo?!
Vale destacar a organização do evento que, mesmo em uma tarde chuvosa, conseguiu realizar a mais tradicional prova do calendário saudável de Juiz de Fora, sem grandes transtornos. Além disso, os pontos de hidratação, as frutas, os isotônicos e os picolés fornecidos durante o trajeto e a chegada, funcionaram como importante oásis para semi-atletas, como no meu caso. Poderia ter descido algumas cervejas ao final, mas, tudo bem...
O tempo de 22 minutos e 54 segundos me deixou bastante satisfeito e deve servir de mote para que eu concorra, novamente, no ano que vem. Acredito que até lá, as dores nas pernas e joelhos, oriundas desta disputa, já tenham encerrado. Prometo reforçar o treinamento e melhorar a alimentação e o descanso. No entanto, não se surpreenda se me ver em mesas de boteco e noites regadas e desregradas a álcool e a outras guloseimas. Até que se prove o contrário, só se vive uma vez. E eu quero "tudo ao mesmo tempo agora", como enunciava uma capa de disco dos Titãs, de 1991.
Como bom ocidental, Juliano Nery diz que não gosta de disputa, mas não entra pra perder nem no par ou impar.
Juliano Nery é jornalista, professor universitário e escritor. Graduado em Comunicação Social e Mestre na linha de pesquisa Sujeitos Sociais, é orgulhoso por ser pai do Gabriel e costuma colocar amor em tudo o que faz.
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