Juliana Machado Juliana Machado 25/03/2014

Chove chuva...

chuvasEstamos testemunhando nos últimos dias, situações um tanto curiosas a respeito do clima e da chuva. Na verdade, testemunhamos esse paradoxo todos os anos. Alguns, como eu, ficam bem revoltados e eu diria até amargurados. Outros nem percebem que a Terra está, sem exageros, escorrendo pelos ralos. O nosso planeta vive uma situação de colapso que é inegável para os cientistas realistas. De fato, nem é preciso ser cientista para verificar tal situação. Basta ligar a TV e assistir os jornais denunciando a falta de água em diversos pontos do nosso país, ao mesmo tempo em que tantos outros sofrem com alagamentos. A repórter afirma: "Não está chovendo onde deve na cidade de São Paulo". Esta frase me soou um pouco cômica. Então temos uma chuva que não sabe bem onde ir, pobrezinha. Está perdida, não entende que deve desabar no local x e não no y. É isso mesmo?

A verdade é que há alguns dias em Juiz de Fora tivemos um aperitivo desta questão. Os bairros tiveram que fazer um rodízio no racionamento de água. Não estava chovendo, nossas reservas estavam baixíssimas e aí sim, quando a situação ficou tensa, participamos – timidamente, vamos confessar – do processo de economia de água. Então São Pedro resolveu colaborar e caiu uma chuvarada em nossa cidade. Todos felizes. Que ingênuos... Eu via a água da chuva escorrendo no asfalto das ruas, sobre o piso das casas, nos quintais encimentados indo parar nos nossos esgotos imundos. Choveu para que? Me peguei sentindo até uma pontinha de desespero, quase como se alguém tivesse aberto uma torneira e deixado a água escorrer à vontade. Aquela água toda podia ser captada em cada residência, em cada rua, em cada bairro e abastecer uma central única, ou eu estou viajando demais? Serviu para lavar os espaços de concreto, molhar os poucos espaços verdes, encher ainda mais os córregos e todo mundo ficar apreensivo esperando aquele rio-esgoto transbordar! Uma maluquice sem tamanho...

chuvasSei que existem sistemas de captação eficiente da água da chuva e empresas especializadas em tal procedimento. Sei que isto é uma realidade em algumas poucas cidades mais desenvolvidas do nosso país. Acontece também na Austrália, Estados Unidos em alguns países da Europa. Mas eu estou pensando em um projeto grande, que ultrapasse essa ação casa-a-casa e que atinja de fato o manejo das cidades como um todo. Ou um programa de incentivo para que haja a reestruturação das residências para a instalação destes equipamentos captadores. A água pluvial captada pode ser utilizada não só em atividades domésticas, mas também pode colaborar para o reabastecimento de reservas subterrâneas.

A lei federal 11.445/2007 delibera sobre a drenagem, transporte, retenção, tratamento e disposição final das águas da chuva nas cidades. Seria interessante que a porção "tratamento e disposição final" destas águas incluísse sua reutilização efetiva pelos cidadãos. Entendo que isto deveria ser articulado junto aos governos municipal e estadual, principalmente. Existe conhecimento aprofundado sobre o assunto, engenheiros e arquitetos que podem contribuir para isto (Vejam o livro "Manejo de águas pluviais urbanas", de coordenação de Antônio Marozzi Righetto).

chuvasNão acho que esta deveria ser uma questão menor, pelo contrário, é uma pauta urgente, urgentíssima, se de fato nos preocupamos com a nossa existência enquanto espécie. A água é um recurso natural finito. Estamos em escassez deste recurso. 60% do nosso peso é composto por água. Precisamos dela para o funcionamento adequado das nossas células, para reações químicas vitais, para transportar alimentos e gases respiratórios, para compor nosso sangue, nossa urina, nosso suor, nossa lágrima, para regular nossa temperatura, fazer funcionar nossos sistemas respiratório, digestivo e nervoso, para sobrevivermos enfim. É possível que consigamos sobreviver sem alimento por algumas semanas. Mas sem água não vivemos mais que cinco dias... Sentiram o drama?


Juliana Machado é Bióloga, mestre em Ciências Biológicas - Comportamento e Biologia Animal - UFJF/MG. Doutoranda em Bioética, ética aplicada e saúde coletiva - UFRJ/UFF/UERJ e Fiocruz.

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