BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) - De tanto insistir na necessidade de internacionalização do filme brasileiro, a CineBH --mostra internacional de cinema em Belo Horizonte-- chega à sua 16ª edição, dos dias 20 a 25 de setembro, e a primeira amplamente presencial desde 2019, no centro das discussões sobre o destino do audiovisual em todo o mundo.

É o momento de encruzilhada de várias linhas, desde a dificuldade em promover a retomada das salas por um público mais amplo até os problemas decorrentes da absoluta ausência de regulação do streaming no Brasil.

Converse com qualquer roteirista --ou produtor-- e ele reclamará das imposições de uma Netflix, por exemplo, para enquadrar seu trabalho no que entendem como modelo de filmes ou séries válido para todo mundo.

Ninguém, no entanto, erguerá a voz contra Netflix. Durante os vários anos de hostilidade do governo brasileiro à cultura --e ao cinema em particular-- foi essa multinacional que, bem ou mal, criou empregos e sustentou, literalmente, boa parte da produção do país.

Agora, quando a cultura conta os dias para trocar de governo, a própria Netflix enfrenta dificuldades. Depois do crescimento exponencial durante os anos de pandemia, com todo mundo fechado em casa, enfrenta a concorrência de vários outros produtores tradicionais (Disney, Globoplay etc.), sem contar a devoradora Prime Video --sedutor entreposto da Amazon através do qual vários produtores descarregam seus produtos--, YouTube, Claro, UOL e tantos outros responsáveis pela queda de valor de suas ações.

O tempo das maratonas de séries diante da TV parece ter acabado à medida que uma vida razoavelmente normal se restabelece. Entrar na plataforma Netflix já não significa encontrar trabalhos de David Lynch, Martin Scorsese ou seriados interessantes. À parte grandes achados e a possibilidade de encontrar, quase ao acaso, alguma joia de país cuja produção mal sabemos que existe, admitamos que hoje entrar na Netflix parece abrir as portas de um museu de horrores.

Poderia não ser tão grave caso de algum modo se restabelecesse a fluência do público nas salas de cinema. Pode ser medo de ficar duas horas numa sala fechada? É possível. Mas como explicar que shows de música ou jogos de futebol estejam não raro lotados e sejam eventos que, embora em locais abertos, constituam isso que as autoridades médicas chamavam "aglomeração" até alguns meses atrás, ao contrário da bem-comportada distribuição das poltronas nas salas de espetáculos.

Há que se pensar, portanto, o que determina a recusa do público em reocupar as salas, que pode ir desde o preço dos ingressos em época de crise econômica grave até a dificuldade de encontrar informações sobre os filmes em cartaz desde que a internet tomou o lugar dos jornais como veículo principal desse tipo de informação.

O fato é que o grande sucesso brasileiro deste ano, "Medida Provisória", não chegou a 10% do público dos grandes sucessos com Paulo Gustavo na década passada --e a morte de Paulo Gustavo, durante a pandemia, não é exatamente um fator positivo no que toca ao reencontro dos espectadores com o mais seguro valor de nossa comédia cinematográfica.

Assim, uma das perguntas que atravessará essa 16ª CineBH é se haverá ou não condições de os filmes feitos no continente latino-americano deixar de depender tanto como hoje da aprovação dos países desenvolvidos.

Sabemos da importância dos grandes festivais internacionais e, mais ainda, do Oscar para a circulação dos filmes do continente. No entanto, há poucos anos os argentinos criaram uma tradição de cinema que agradou bastante ao público brasileiro mais escolarizado e familiarizado com filmes autorais.

Aqui e ali, filmes uruguaios, chilenos ou mexicanos se destacam. No entanto, no geral, o Brasil não parece tão integrado a esse mundo --apesar de algumas coproduções bem-sucedidas. Como vencer esse tipo de obstáculo de modo a criar uma produção menos dependente dos fundos europeus?

Eis algo que estará na pauta de debates da programação, bem como nos encontros do 13º Brasil Cinemundi, que acontece simultaneamente e trará 41 convidados de 13 países --europeus e latino-americanos-- e tratará do intercâmbio de projetos entre os vários países envolvidos.

Como festival de cinema que é, o CineBH terá ainda uma vasta programação de filmes, 120 no total, entre ficções e documentários, pré-estreias e reprises, até o dia 25. É justo que os organizadores esperem, de alguns entre eles, que ajudem a reviver a paixão pelas salas de espetáculos.

Mais apaixonantes, desde já, parecem destinadas a ser as discussões que acontecerão durante o festival, que reserva espaço, no mais, para abrir uma campanha em defesa do filme "Marte Um", produzido pela mineira Filmes de Plástico e dirigido por Gabriel Martins, como representante brasileiro ao Oscar.


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